Paraisenses continuam sentindo os reflexos do sucateamento da Polícia Civil e da falta de pessoal para atender o município e cidades próximas à Paraíso. Faltam delegados, detetives, escrivães, médicos legistas. O assunto foi abordado na Câmara Municipal nesta semana. Vereadores solicitaram o envio de ofício ao chefe da Polícia Civil de Minas Gerais, delegado-Geral Wagner Pinto de Souza expondo o que chamaram de “situação caótica”.
O vereador Marcelo de Morais lembrou que em São Sebastião do Paraíso vem ocorrendo aumento o número de crimes, tais como roubo e furto, e a pouca resolutividade desses casos está atrelada, principalmente, à falta de investigadores e escrivães.
Em média são registrados na Delegacia pelo menos 70 furtos por semana, mas conforme informação obtida pelo Jornal do Sudoeste a polícia precisa filtrar grande parte desses casos já que não existe efetivo para dar conta da alta demanda que chega à Depol. Atualmente, o reduzido quadro de servidores, relacionados a pedidos de remoção e não substituição dessas vagas vem prejudicando os trabalhos da PC, que se vê em estado de abandono pelo poder público e de mãos atadas para atender aos paraisenses.
O delegado de Polícia, Vinícius Zamó, voltou a falar sobre situação e lamentou o estado em que se encontra a PC de todo o Estado. Em Paraíso, para ele, o ideal seria que cada delegado ficasse lotado em uma delegacia fixa e com equipe própria para dar uma resposta efetiva à população que procura à delegacia. Atualmente, são seis delegados lotados em São Sebastião do Paraíso; cinco escrivães e 14 investigadores, dos quais seis trabalham no operacional e os demais no administrativo. Todavia, deste número de escrivães e investigadores, que de acordo com o delegado não é suficiente para suprir a necessidade da Delegacia Regional, situação se agrava tendo em vista a questão do regime de plantão e férias que reduz ainda mais o quadro de servidores para atender as demandas da PC.
“Nós trabalhamos aos trancos e barrancos e deveríamos ter que entregar um serviço muito, muito melhor do que atualmente prestamos. Pelo atual estado que a PC enfrenta, acredito que fazemos além daquilo que damos conta. Realizamos operações, o delegado Tiago Bordini, por exemplo, que trabalha para resolver casos envolvendo crime organizado e tráfico de drogas – que é o ‘grosso’ de uma delegacia – tem feito um trabalho bonito e dentro dos limites. Nos falta atenção do governo, é uma urgência, urgentíssima. Nossos delegados são muito comprometidos e não temos problemas com a sociedade, e sou muito contente com a minha equipe de trabalho, mas poderíamos melhorar muito”, destaca Zamó.
A reportagem entrevistou policiais, que comentaram a realidade vivida e situação, muitas das vezes desanimadora, em que trabalham. De acordo com um deles, a delegacia já chegou a ter boa estrutura que foi sendo sucateada ao longo dos anos. “Chegamos a ter dois investigares para a Delegacia da Mulher; cinco para Furtos e Roubos; quatro investigadores para o Tráfico; funcionávamos em plantão e isto não prejudicava o funcionamento da delegacia. Hoje, é preciso pegar àqueles que trabalham na rua e colocar para fazer plantão e que depois ficam de folga descobrindo o expediente. As delegacias especializadas não têm investigadores destinados, são poucos investigadores para tudo; a Delegacia da Mulher não tem uma delegada para atender essa vítimas de violência doméstica e sexual”, lamentou o policial.
Diante da situação, comentada também pelo delegado de Polícia, Vinícius Zamó, policiais precisam filtrar o que “é mais urgente”, deixando muitos dos crimes de menor potencial aguardando para ser solucionados. Somente a delegacia de Furtos e Roubos, há uma média de 70 casos por semana e, conforme destacou Zamó, sem estrutura e equipe é praticamente impossível dar atenção a todos estes casos.
Além disto, a Polícia Civil não tem sede própria e trabalha em um prédio adaptado e que não oferece nenhuma condição de segurança para os próprios servidores. Considerando casos recentes de incêndios ocasionados por curto-circuito em São Sebastião do Paraíso, a situação é de risco iminente.
“Se não fosse o município nos ceder o uso deste espaço, é possível que situação estivesse muito pior. Uma equipe ideal seria um delegado no plantão, com dois investigadores e um escrivão. Para cada delegado no expediente normal seria ideal quatro investigadores e dois escrivães. É uma equipe dos sonhos. Aliás, meu sonho é ter minha própria equipe, subordinada à Delegacia de Homicídios e Trânsito, fora o plantão”, ressalta o delegado. Zamó também comenta a situação ainda envolvendo a questão do IML:
“O mais triste é olhar para a cara do cidadão e não poder fazer nada. A pessoa que chega a casa, por exemplo, encontra o avô que faleceu de morte suspeita e precisa fazer necropsia, tem que mandar o corpo para onde há legista e quem vai pagar por isso é a própria família. A família já está fragilizada, sofrendo com aquilo e ainda tem que lidar com a questão da espera e dos custos excedentes para poder se despedir e sepultar seu ente querido. É muito triste”, lamenta o delegado.
IML
Quando o assunto é a necessidade de se fazer autópsia em vítimas fatais no município, a situação é ainda mais grave. Há bastante tempo, vítimas têm sido transportadas à Formiga, a mais de 200 quilômetros de São Sebastião do Paraíso. No último ano, o proprietário da Organização Social de Luto Funpar, Nelson Bogas Sanches, lamentou o que ele chamou de “situação muito vergonhosa”, porque famílias vinham sofrendo, além da dor da perda, com o transtorno ocasionado na demora da liberação do ente querido pelo IML.
Em entrevista ao Jornal do Sudoeste, em setembro de 2018, Sanches havia destacado que as pessoas que faleciam em Paraíso estavam sendo levadas a Formiga. Ele destacou que a situação era desnecessária, já que há um médico legista reside em Paraíso. Conforme ele, o cidadão vinha atribuindo a culpa da demora pela liberação do corpo à funerária, que apenas realizada o translado. Ele destacou ainda que o serviço de transporte deveria ser oferecido pelo próprio IML, mas era a funerária que acabava realizando esses serviços, repassando o custo à familiares do falecido.
De lá para cá, nada mudou. No final de 2017 o assunto gerou polêmica na Câmara, mas não houve solução prática. À época o tema foi discutido após o corpo de um homem vítima de homicídio ter sido levado a Passos para ser realizada a necropsia. O enterro estava previsto para as 17h30 de quinta-feira, mas só foi sepultado no dia seguinte. A justificativa foi de que o legista teria enfrentado algum tipo de problema e não chegou ao IML com tempo hábil para liberar o corpo.
Em junho do ano passado, novamente, o tema voltou a suscitar debates no Legislativo. Desta vez o caso estava relacionado ao óbito de uma idosa, vitima de agressão pelo marido. A família teve que pagar para que o corpo pudesse ser levado a Formiga, para passar pelo procedimento necessário e depois ser liberado para familiares. Também, o transtorno estava relacionado à falta de legistas no Instituto Médico Legal de Passos.
O serviço de necropsia chegou a ser feito no município paraisense por algum período, fruto de convênio entre município e Estado, mas foi suspenso após 2010 com a mudança de governo. Cobranças também chegaram a ser feitas pelo até então presidente da Câmara na época, Marcelo de Morais, ao chefe do Departamento da Polícia Civil, Bráulio Stivanin Júnior, que à época disse que cobranças insistentes vinham sendo feitas ao Governo do Estado, porém sem sucesso.
“Da forma que está não pode ficar. Observa-se que os serviços, devido a essa falta de estrutura que nossos delegados vivenciam, não têm sido oferecidos da forma que deveriam. Temos que mudar essa realidade e garantir aos nossos delegados o mínimo de estrutura para que eles possam trabalhar e entregar um serviços a nossa população muito melhor do que já fazem”, disse o vereador Marcelo Morais.