Havia uma disputa acirrada pelo título com os nervos à flor da pele entre Ayrton Senna e Alain Prost no GP do Japão de 1990, e na largada tudo foi resolvido num ato de vingança em que Senna bateu de propósito no rival, encerrando a disputa logo na primeira curva.
Mas havia uma corrida inteira pela frente, e a F1 foi brindada com um pódio histórico. Histórico porque marcou a última dobradinha brasileira na categoria, com o vencedor Nelson Piquet e Roberto Pupo Moreno. Histórico porque foi o primeiro de um piloto japonês, Aguri Suzuki, da modesta Larrousse. E histórico pela própria história de Moreno.
Tudo começa em Brasília no início dos anos 70 com o garoto sonhador que começou no kart praticamente de favor, calçando “Kchutes”, ganhando um chassi aqui, um motor ali, uma peça acolá; que foi Campeão Brasileiro, que por muito pouco não perdeu um pé em acidente com moto, e que se aventurou para a Europa com a cara e a coragem, uma mão na frente e outra atrás, sem falar inglês, e sem dinheiro sequer para pagar consulta de sua filha recém-nascida quando já estava na Inglaterra.
Tem mais: Moreno foi sem ter carteira de piloto por mesquinhagem do presidente da Confederação Brasileira de Automobilismo que negou o documento alegando que Moreno nunca havia disputado provas automobilísticas no Brasil.
A história que levou o Moreno para a Benetton naquele GP do Japão contada por ele é próprio é de encher os olhos, assim como encheu os de muitos que assistiram aquela corrida que completou 30 anos na última quarta-feira (21).
Depois de várias tentativas sem sucesso de classificar a fraca EuroBrun no grid, Moreno se irritou ao ser consolado de forma sínica pelo próprio dono da equipe: “Não fique assim, Roberto, pois cada vez que você não se classifica, nós economizamos uma revisão de motor e vários jogos de pneus...”
Aquilo deixou o piloto indignado, já que seu esforço com um carro ruim estava sendo em vão. E decidiu bater na porta da Brabham que estava à procura de piloto para o ano seguinte. Enquanto aguardava o chá de cadeira para falar com o dono do time que não resultaria em nada, Moreno ligou para dar um alô ao amigo John Barnard, diretor-técnico da Benetton, por estar próximo de seu escritório, em Londres, e sem nenhuma pretensão, disse que estava na Brabham, à procura de emprego! Barnard o convidou para um chá, e nesse instante, Alessandro Naninni, companheiro de Nelson Piquet, na Benetton, sofreu um acidente de helicóptero e teve um braço decepado. E a vaga do italiano caiu no colo de Moreno que foi ao pódio não sem antes quase abandonar a prova por falta de condições físicas. Só não desistiu porque quando estava no limite do tolerável, mentalizou o “Salmo 23” - indicação de um amigo para que lesse até decorar naquele final de semana, e que tivesse fé. E recebeu a graça de o cansaço e as dores musculares não o incomodasse mais até a bandeirada!
O piloto que chegou a F1 sem dinheiro por pura capacidade técnica e talento, agora estava no pódio em estado de graça!
A carreira de Moreno não foi das mais fáceis, mas ele tem orgulho do que fez, não se arrepende de nada e se sente realizado. Como ele mesmo disse, “não fui para a Europa para vencer corridas ou ser campeão, e sim, construir uma carreira como piloto de corridas”.
A história não seria completa sem um pódio de Moreno e ao lado do amigo Nelson Piquet que o incentivou atravessar o Atlântico atrás de seu sonho, nem que fosse apenas para aprender falar inglês.
GP de Portugal
Os portugueses esperaram 24 anos para ter a F1 de volta e isso só foi possível neste final de semana por conta da pandemia que obrigou o cancelamento de várias provas do calendário original. O Circuito de Algarve, em Portimão que vem sendo chamado pelos pilotos de “montanha russa” pelas variações de nível e curvas cegas, é a 74ª pista diferente a sediar um GP de F1 desde 1950.