CAFÉ & PIMENTA

“Dedinho de Prosa, Café & Pimenta”

Por: Redação | Categoria: Cultura | 16-06-2021 10:11 | 1023
Foto: Reprodução

“Dedinho de Prosa, Café & Pimenta” é uma série de dez artigos que vai contar um pouquinho sobre a pesquisa realizada no processo de criação do livro “Pimentas no Paraíso - Raízes”.

Tema de hoje: “Ocupação do Território” - Luiz Pimenta Neves Jr.
Donana (DA): Opa! Vamos entrano, como vai? Aceita um cafezinho? Tem tempo pra um dedinho de prosa hoje?
Luiz Pimenta (LP): Opa! Claro, claro, aceito sim! Um cafezinho gostoso é que de melhor nessa região tem para nos oferecer, sabia?

DA: Eu ouvi falar das plantações de café nas fazendas da região, mas nunca escutei a história toda, quer me contar?
LP: A origem de São Sebastião do Paraíso faz parte da grande movimentação de interiorização do homem branco no território brasileiro, depois que ele se estabeleceu no litoral - as Entradas e Bandeiras. Desde a descoberta até o início da interiorização, muito tempo se passou, aproximadamente, uns 200 anos.

A bandeira de Fernão Dias e Vila Rica - posteriormente, Ouro Preto - datam da segunda metade do século 17. As Entradas e Bandeiras eram compostas de uma multidão de gente que procurava novas oportunidades de vida e, à medida que adentravam-se, alguns ficavam pelo caminho, fincando suas raízes e ocupando os territórios já desbravados. Foi neste movimento que, ao redor de 1780, a família Antunes Maciel chegou à Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Jacuí, na época, um posto avançado no meio de um imenso território.  Era um núcleo de apoio para as pessoas que chegavam para instituir suas propriedades agrícolas.

DA: Que interessante! Certamente era preciso muita coragem para chegar chegando.
LP: Ocupar novos territórios era equivalente a procurar novas oportunidades de trabalho para que os jovens pudessem iniciar a vida. Os mais velhos ficavam nos povoamentos já consolidados e os mais novos, à medida que ficavam adultos, avançavam à procura de novas paragens para se estabelecer como família.

Assim que estas colunas, constituídas de gente avançavam, novos postos de ocupação eram criados. Perdões e Jacuí são exemplos destes povoamentos de apoio ao final do século 18, no sul de Minas Gerais. Além de Freguesias e Vilas ao longo das trilhas, abertas a facão, diversos pousos para viajantes eram construídos em locais estratégicos para fornecer alimentação e assistência às tropas que se deslocavam.

DA: Os viajantes precisavam descansar e se alimentar...
LP: Foi nesta época que a família Antunes Maciel, residente em Jacuí, decidiu doar ao Bispado de São Paulo um terreno que servisse de posto avançado para os viajantes e, que também pudesse incentivar o início de ocupação da região. Era o processo civilizatório em andamento.

A relação entre igreja e estado era bastante íntima e as duas instituições se confundiam. Os registros de nascimentos, casamentos, mortes, propriedade das terras e heranças eram feitos pelos padres, pertencentes à instituição igreja.

Na época, quanto mais gente disposta a fazer sua vida no interior do país, melhor para os donos dos imensos territórios. O preço de suas terras subiam, proporcionalmente, à ocupação do território.

DA: Claro, pois o que antes era um nada, começa a ser uma pequena vila e aos poucos essa vila vai se estruturando, tô certa?
LP: Foi neste contexto que a família Antunes Maciel, em 1821, resolveu incentivar o povoamento de suas terras, erigindo no terreno doado, uma capelinha em homenagem a São Sebastião, santo de devoção da família, para marcar o local. Posteriormente, o gerenciamento da ocupação do espaço passou a ser executado pelo Alferes Caetano que permitia, ou não, a construção de casas no terreno doado.

A lenda narra que a capelinha foi construída em um lugar paradisíaco, mas o local não foi, imediatamente, povoado. Foram necessários pelo menos uns 20 anos para que um padre, marginal à hierarquia da igreja, resolvesse se estabelecer nas cercanias e  tomasse conta da capelinha. O livro Pimentas no Paraíso, volume 1, conta que o padre foi assassinado e que um irmão, também padre, veio para enterrá-lo e quando foi-se embora, saiu rogando uma praga que por ali, naquela Freguesia, nada iria prosperar e tudo seria engolido pelos buracos que, naquela ocasião, grassavam na região.

DA: O que nunca aconteceu, ou aconteceu?
LP: Não... Só quando a capelinha foi substituída pela construção provisória de uma igreja, feita de adobe e madeira, é que os fazendeiros do entorno começaram a construir casas perto dela e, em sua frente, havia um grande espaço onde se podia promover, aos domingos, uma feira de trocas de mercadorias - escambo - já que, na época, o acesso ao dinheiro era raro por falta de moedas, propriamente ditas. Era através do escambo que as pessoas conseguiam prover suas casas de produtos que não conseguiam gerar por conta própria. Assim, uma pessoa podia trocar carne de porcos que criava, por agasalhos, vestimentas ou sapatos confeccionados por outros. Em São Sebastião do Paraíso o espaço em frente à igreja servia para que os donos das propriedades rurais pudessem trocar, entre si, as mercadorias que cada um precisava. Assim, todo domingo era dia de missa e de se abastecer com víveres, bebidas e vestimentas.

DA: Domingo era um dia atarefado, então...
LP: Ih, se era... Foi muito devagar, que algumas casas começaram a ser construídas, perto da igreja, como forma de abrigo provisório para alojar, por um dia da semana, as famílias que vinham participar das trocas e assistir à missa rezada por um padre, que vinha de Jacuí. Para todos que afluíam à Freguesia, o domingo era dia de festa, diferente dos demais que passavam isolados em suas propriedades.

Já para os viajantes, que por ali passavam, foi construí-do, na Lagoinha, um pouso para que pudessem dormir, cozinhar e armar suas fogueiras, que os aquecia durante a noite. O pouso era um espaço, desprovido de paredes, coberto por telhas sustentadas por troncos de árvores. Chamava-se telheiro.

DA: Um abrigo da chuva, basicamente...
LP: Por volta de 1850, quando uma missão religiosa foi realizada na Freguesia, o cemitério, onde hoje é o Jardim da Fonte, foi sagrado e funcionou como tal até o fim do século 19.

A cidade, nessa época, era constituída de três grandes regiões: o espaço da igreja de adobe, com casas em suas cercanias, o cemitério e o pouso da Lagoinha para os viajantes.

DA: Um trabalho danado erguer uma cidade e quanto tempo demora! O senhor tá liberado, pode ir mas, por favor, volta logo pra me contar um pouco mais sobre a região porque sou muito curiosa.
LP: Volto sim!

Colabore ajudando a difundir as memórias da cidade de São Sebastião do Paraíso que, em 2021, completa 200 anos.  Se quiser, acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=SfsPvyRqZpw