Produzindo um documentário sobre São Sebastião do Paraíso para ser postado em rede social, perguntou-me jovem produtor se eu poderia dizer-lhe algo sobre a Praça Comendador José Honório. Adiantou-me que seria algo sintetizado, e estaria eventualmente sujeito a cortes, tendo em vista o tempo total que ele dispunha para o vídeo.
Contei-lhe que a Praça sempre foi acolhedora, e como tal nela se vivenciou momentos sociais, artísticos, manifestações políticas, religiosas, culturais e folclóricas, notadamente por ter em seu espaço a Igreja Matriz de São Sebastião, cartão postal de Paraíso, que por extensão dignifica as demais denominações religiosas, de vez que nesse universo cristão, todos os caminhos objetivam a sintonia e caminhar rumo ao nosso Criador.
Meu despretensioso relato foi restrito ao que vivenciei da década de 1950 em diante, memória de minha infância, adolescência e maturidade, e me ative a elas, na certeza que aquele espaço público foi pródigo em acontecimentos marcantes.
Disse-lhe sobre a beleza arquitetônica de casas no entorno da praça, como a do Comendador José Honório, com escadas de mármore que sempre ouvi dizer teriam vindo de Carrara, ponta mais ao norte de Toscana na Itália. A majestosa residência cedeu lugar à agência da Caixa Federal.
O antigo coreto na Praça, tradicionalmente palco para bandas de músicas que embalaram gerações de paraisenses e estão em nossas memórias com crianças felizes correndo ao redor, casais circulando na parte central, jovens trocando olhares que se converteram em famílias, também acolheu personalidades do mundo político, artístico e esportivo. A banda, tradição mineira com um histórico centenário em Paraíso, há algum tempo está inativa.
Era costume, fez parte de contrato por algum tempo, antes de abrilhantarem bailes na Sociedade Beneficente Recreativa Operária (Liga), alguns grupos musicais e artistas “darem uma palhinha”, no coreto. Lembro-me das apresentações do violinista Tobias Troisi e seu Conjunto, e de uma orquestra vinda da Guiana Inglesa que utilizava tambores de aço como instrumentos.
Dentre políticos que discursaram no coreto, estiveram o polêmico e excêntrico Jânio Quadros em campanha que o levou à presidência da República em 1961, seu concorrente Ademar de Barros, personalidades da política mineira, e de postulantes à Prefeitura e Câmara de São Sebastião do Paraíso.
Juscelino Kubitscheck, em carro aberto, acompanhado de Tancredo Neves (que recebeu título de Cidadão Honorário Paraisense) foi recebido no Cine São Sebastião, depois em grande comício, palanque montado em frente à Casa Paroquial. Cine São Sebastião que em outras épocas recepcionou companhias de teatro, artistas famosos como Procópio e sua filha Bibi Ferreira, palco onde foram realizadas diversas formaturas.
Na Praça Comendador José Honório, imediações do Hotel Cosini, era onde se reuniam domingo à noite, desportistas para comentar sobre jogos da Associação Atlética Paraisense e Operário Esporte Clube, quase sempre com a presença de jogadores, profissionais e amadores que marcaram época pelo talento de levantarem seguidamente torcedores nas arquibancadas, pela beleza e técnica do futebol arte.
Pela exiguidade do tempo, não tive como dizer dos cafés e bares que tiveram lugar de destaque na história de São Sebastião do Paraíso, como o Café Padrão, do senhor Virgílio Buson e seu filho Tácito, anexo ao prédio do antigo Cine São Sebastião, antes do inaugurado no final da década de 1950. Café coado em grande cafeteira metálica sobre o balcão e onde também se comprava figurinhas que vinham enroladas em balas, para álbuns que ao serem preenchidos por completo, faziam jus a prêmios.
Poderia também ter lhe dito sobre a tabacaria de Senhor Bernardo Monteiro, pequeno cômodo no prédio do Hotel Cosini, que com sua fisionomia séria, até certo ponto sisuda, mas na realidade era pessoa boníssima, bem humorada, brincalhão.
Em seu estabelecimento sempre estavam pessoas queridas, que estão na memória dos paraisenses, como Juca da Pedra, que se dizia ser “Rei do Universo”, e possuidor de pedras preciosas, Isaías que tocava gaita de oito baixos, e após o culto dominical na igreja que frequentava, passava pela tabacaria. Também os irmãos Senhor João que se fosse chamado de “Cacho de Coco”, daria enguiço, e Antônio, que preferia ser dito como “violonista”, em vez de “Antônio da Bandola”, o suficiente para lhe alterar o humor.
Sobre Juca da Pedra, que costumeiramente se vestia de terno de brim, camisa amarela e gravata verde, cabe aqui uma anotação. Consta que ele teria ido ao Rio de Janeiro e foi recebido pelo então presidente da República, Getúlio Vargas, o que me foi confirmado por um de seus netos.
Não tive tempo para falar sobre o Bar Paraisense, também um anexo ao Hotel Cosini, bem na esquina com a rua Padre Benatti, onde infalivelmente estavam presentes todas as noites confabulando entre um café e outro, Dr. Joaquim Alves Pinto, o Doutor Quizinho, médico humanitário, cirurgião que se notabilizou além de São Sebastião do Paraíso, Dr. Fábio Mirhib, professor e advogado de invejável cultura e saber jurídico, Saler Abdo, José Cury, Geraldo Cruvinel, técnico em eletrônica e um dos pioneiros na retransmissão de sinais de televisão na região.
Doutor Quinzinho era estudioso e conhecia sobre eletrônica, teoria que combinada à prática de Geraldo Cruvinel, possibilitou a captação de sinais das emissoras TV Record, Excelsior e Tupi em Paraíso. Foi no Bar Paraisense, do Senhor Duca, que muitos parai-senses viram a chegada ao homem à Lua em 1969.
Gostaria também de ter falado sobre o Bar do Centro, que depois do Senhor José Adolfo e Ewaldes Peterson, foi adquirido por Antônio de Pádua, prédio onde atualmente é a Galeria Central. Vitrines com balas e chocolates logo na entrada e ao lado do corredor que ao fundo tinha também um dos poucos televisores em Paraíso. Nele, em preto e branco, pa-raisenses assistiram entre chuviscos na imagem, a Copa do Mundo de Futebol em 1962 no Chile.
Sobre o balcão de mármore, com habilidade que não mais se vê, funcionários depois de retirarem alguns pires de compartimento onde eram higienizados em água fervente, e empilha-los, com um toque artístico, os arremessava ao longo do balcão.
Praça dos desfiles cívicos e militares, fanfarras.
A Praça Comendador José Honório também relembra Hotel Cosini, chalé de Senhor Lima (depois de meu xará Nelson Costa Machado), o Tiro ao Alvo de Armando Amaral, o Restaurante, lanchonete e Hotel Achei, Cine São Sebastião com duas sessões aos domingos, sala de projeções, que bairrismo à parte não encontrei outra igual. No prédio do cinema, no segundo pavimento o Restaurante Cairo, e no terceiro a Câmara Municipal.
O Snooker de Mário Sofiati (depois, de Guerino Marco-mini), Da centenária Sorveteria Sposito, dos Móveis Mechi, Zito Calçados, Casa dos Dois Irmãos, Casa Santos (de Chi-quito Santos), A Elegante (de Geraldo Rodrigues), Real Móveis, Banco Mineiro da Produção, da Casa Paroquial, Banco Hipotécario e Agrícola, Banco Crédito Real, Casa Biava, Casa João Ponte com sua majestosa vitrine expondo joias e relógios, Foto Pimenta, Farmácia do Senhor João Machado, Casa Belo, Ivo Relojoeiro, Doutor José Siero Porto, imóvel onde havia o antigo fórum e o Lar Moderno, que ao fundo residia um senhor que produzia e vendia biju francês.
Praça que na esquina com a rua Padre Benatti era residência do senhor Alfredo Serra, e no sentido oposto a do senhor João Vilela, das engraxatarias e engraxates, barbearia do Senhor Cassiano Souza, alfaiataria de Otaviano Pádua (Tavico que foi delegado municipal), Bar do Salvador onde se tomava deliciosa coalhada batida com açúcar e canela.
Das tradicionais Congadas, Folias de Reis. De majestosos desfiles carnavalescos, de fanfarras, das corridas de São João.
Praça onde se recebeu emotivamente os Pracinhas Paraisenses que combateram na Segunda Guerra Mundial.
Cada estabelecimento e pessoa citada ensejam citações e acontecimentos que fazem parte da rica história do município de São Sebastião do Paraíso. A Praça Comendador José Honório, e seus muitos personagens são história à parte, no contexto paraisense.