PARAÍSO 200 ANOS

Há 50 anos foi realizado no Cine Teatro Recreio o III Salão de Música Popular

JOSÉ REZENDE E GUELFO COLOMBO FORAM OS VENCEDORES
Por: Nelson Duarte | Categoria: Cultura | 25-10-2021 10:36 | 600
Foto: Divulgação

José Antônio Rezende compôs a letra, e Guelfo Colombo Neto a melodia de Marciana, música vencedora do III Salão de Música Popular de São Sebastião do Paraíso, realizado no Cine Teatro Recreio em 1971. A parceria entre eles resultou em outras composições vitoriosas em festivais. A criação artística pulsou forte nas décadas de 1960 e 1970 e se traduziu em movimentos que têm lugar reservado na história mundial, como a beatlemania. No Brasil, especialmente a Jovem Guarda e os festivais de música (MPB) que serviram de espelho e inspiração, país afora.

O paraisense José Antônio Rezende é eletricitário aposentado. Trabalhou em Furnas Centrais Elétricas. Cinquenta anos depois de ter sua música “Marciana”, composta em parceria com Guelfo Colombo, classificada em primeiro lugar no III Salão de Música Popular de São Sebastião, ele diz “ter uma lembrança gostosa do tempo dos festivais no Brasil inteiro, época em que compositores usavam músicas para expressar protestos, até em consequência do regime em que vivíamos. E era preciso muito cuidado para que não fosse surpreendido por uma investigação. Eram jovens que tinham o prazer de participar de um movimento cultural, musical”, enfatiza.

“Fiz a música em parceria com o Guelfo, e nossa proposta era estar entre os participantes do festival, deixar na história algum resultado de nossa participação. O grande mérito dos troféus que recebemos se deve a capacidade dele como músico. Até então, eu escrevia algumas ideias que me ocorriam, mas nos chamou a atenção é que de repente despertou na juventude um movimento muito bonito, sem a ansiedade de ser o primeiro colocado, que nunca me passou pela cabeça”, disse.

José Antônio lembra que jovens compositores se espelhavam em Milton Nascimento, Caetano, Chico Buarque, nos irmãos Marcos e Paulo Valle, Gilberto Gil, Edu Lobo, Théo de Barros, Geraldo Vandré que produziam melodias e letras bem trabalhadas. “Tomávamos como e exemplo e procurávamos seguir aquela linha”.

Nossas músicas eram compostas em uma varanda, lugar sombreado, fundo da casa em que eu morava, próximo à Praça São José. Guelfo procurando acordes para serem encaixados nas letras. Para nós foi algo maravilhoso. Sempre participávamos com três músicas nos festivais. No III Salão inscrevemos Pinho incessante, Luta sem glória e Marciana. A que eu esperava ter maior possibilidade de se classificar era Pinho Incessante, no entanto foi desclassificada, recorda-se Rezende.

Conforme conta, Marciana foi um tema alternativo, pois queria uma música que não fosse protesto. Como a corrida espacial entre os Estados Unidos e União Soviética estava em evidência, falava-se muito em seres alienígenas e havia músicas com esse tema. O compositor Sérgio Murilo gravou a música Marcianita, e inspirado nela fiz uma sátira, onde em certo trecho a letra questionava, “Marciana onde é que você se meteu, até hoje você não apareceu”.

O prêmio que queríamos era participar. Cine Teatro Recreio lotado, torcidas se manifestando. Uma música muito bonita que concorreu foi “A voz do negro”, composta por Walkíria Furlan, de Guaxupé, e eu pensava que seria a vencedora. Outro concorrente muito querido e aclamado foi o Haroldo Garcia de Figuei-redo, líder do grupo Os Sapos, lembra. 

Marciana estava entre as cinco finalistas e meu ego foi alimentado quando começamos ouvir gritos pedindo nossa música. Ficávamos aguardando juntos, e à medida que apresentadores foram anunciando as composições vencedoras, a euforia deixava a gente até com falta de ar, de tanta emoção. Marcou muito em minha vida aquele primeiro lugar, principalmente pelo nível muito bom do festival que teve a participação de compositores de Paraíso e região, de Brasília, Franca, Guaxupé ressalta José Rezende. Outro fato marcante conforme relata, foi a alegria de ter sido acompanhado pela banda paraisense Os Brasões.

A contribuição de Doutor Benedito Paulo Oliveira para com a arte e cultura paraisen-se é enfatizada por José Rezende. “Além dos Salões de Música, ele também promoveu exposições de pintores. Paraíso respirava arte. Era muito comum ao caminharmos pelas ruas ouvir som de piano, acordeon, violões, vindo das residências, era terra de nossos sonhos, época que nos deixou grande saudade.

“Tenho gratidão por ter vivido naquela época, Deus foi muito bom para nossa juventude, tínhamos liberdade de ficar com um grupo de amigos conversando sentados num banco da Praça Comendador José Honório, caminhar pela madrugada, participar de serenatas, sem ter medo”.

Aprendemos  ser exigentes em termos de música, ouvimos grandes orquestras, big bands, cantores, houve transições de estilos na música brasileira e internacional, foram décadas férteis, na MPB, com a qualidade de músicos e compositores do Clube da Esquina, da música castelhana, italiana, que tocaram nossos corações e me ensinaram valorizar a arte de executar um instrumento.

Depois de aposentar-se José Rezende retornou para São Sebastião do Paraíso e participou de grupo seresteiro e de banda voltada para um repertório dos anos 60 e 70. Atualmente se dedica à música católica. “Uma inspiração que vem do Alto e me toca espiritualmente. Mas continuo acrescentando acordes dissonantes que aprendi com o Guelfo”, afirma.

Sobre o estilo de composições que lhe renderam alguns troféus em festivais, foi uma fase, como ocorreu com outros compositores, “até porque aprovado no concurso para Furnas, fui embora, e encontrei tipo de música diferente ao qual não me adaptava, uma esfriada também até por falta de parceiro”.