Uma história de amor. Uma não, algumas. O amor, a intuição e o inegável dom para a música levaram a paraisense Rachel Backshall para além dos mares. Estabelecida desde muito jovem na Inglaterra, lá Rachel reencontrou outro grande amor, Harvey Backshall. Fruto mais precioso dessa união, a pequena Bridget é a menina dos olhos e segue os passos da zelosa mamãe. Tendo a música por profissão e vocação, a filha dos estimados Alexandre Coelho Souza e Silvia A. Coelho Souza e também irmã de Alexandre, seguiu sua missão em terras britânicas com muitas vivências e aprendizados pelo caminho. Com uma trajetória de muito talento, dedicação e superação, Rachel Somerset, nome artístico da talentosa musicista, é uma jovem para todo paraisense se orgulhar. Conheça parte dessa inspiradora história que Rachel, generosamente, compartilha diretamente da terra da rainha.
Rachel, quando a música entrou na sua vida?
A música está na minha vida desde que me lembro ter consciência de que música existia. Minha tia paterna começou a me dar aulas de piano quando eu era muito jovem. Lembro-me de não conseguir manter o ritmo ou mesmo ler música corretamente. Lembro-me também de pensar que só queria tocar música, em vez de ter que lê-la formalmente. Com o passar dos anos, isso me serviu muito bem, pois posso tocar músicas de ouvido com muita facilidade, o que significa que nunca as esqueço e sou capaz de executar centenas de peças de cor. Meu primeiro instrumento foi um daqueles pequenos teclados a pilha, e lembro-me vividamente, de tentar copiar os sons das músicas que gostava e me sentia absolutamente fascinada quando conseguia achar as notas certas.
E como se deu a escolha pelo violino como instrumento de trabalho?
A escolha do violino foi bem marcante para mim. Quando tinha uns oito anos eu vi uma das bailarinas mais velhas do meu grupo de ballet tirando o violino dela da caixa e me apaixonei naquele momento. Lembro do cheiro marcante do breu do arco daquele violino como se fosse ontem. Daquele momento passaram-se quase dois anos até que eu finalmente consegui guardar dinheiro suficiente para comprar meu próprio instrumento. Foram dois anos de muita expectativa.
Como surgiu a oportunidade de se mudar do país? Sempre acalentou esse desejo?
Não foi uma oportunidade em si. Foi mais um chamado, uma necessidade. Crescendo eu não era uma adolescente comum, e meus velhos e poucos amigos podem atestar isso. Quando falava dos meus planos, ou quando tocava, ou cantava, eu via meus amigos acharem aquilo um pouco estranho. Eu tinha cerca de 16 anos quando decidi que iria embora para a Inglaterra e as coisas começaram a se movimentar a partir daquele momento. Tenho muito a agradecer à minha avó querida, Maria das Mercês Coelho Souza (Dona Maria da Sorveteria Sposito), por ter me ajudado financeiramente na época. Sem ela eu teria que ter esperado muito mais tempo para conseguir fazer a mudança.
Quais suas principais influências na música?
Não seguia muitos violinistas. Cresci escutando Sarah Brightman, Loreena McKennitt, Barbra Streisand, Cher... Adorava assistir aos shows da Sarah Brightman! E amava escutar os instrumentos diferentes que Loreena McKennitt introduzia em suas músicas, e os poemas que ela escolhia para compô-las, de William Shakespeare a São João Da Cruz (um padre espanhol que escreveu lindíssimos textos enquanto aprisionado).
Qual a inspiração para seu nome artístico?
Foi um outro momento bem marcante. Discutia muito com meu marido que nome deveria escolher. Queria um nome que fosse fácil e que me trouxesse sorte e energia boa na carreira. Tinha que ser único, e mágico. Estava completamente sem inspiração e já não sabia qual nome usar, nada soava certo. Então uma tarde, quando estava dentro do metrô, pedi para que meu guia espiritual, que está intrinsicamente envolvido em cada decisão da minha vida, me ajudasse. Disse-lhe que iria fechar os olhos e que assim que o metrô parasse eu abriria os olhos de novo e que a primeira palavra que visse se tornaria meu nome. Neste momento eu começo a rir e peço a ele que tome cuidado. Quando abri os olhos eu li: Welcome To Somerset (Bem vinda à Somerset). Amei o nome que me foi dado imediatamente, e com a benção do meu marido e meus pais, Rachel Somerset se tornou meu nome artístico.
Grande parte de suas apresentações ocorrem em momentos muito especiais e marcantes na vida das pessoas. O que isso representa pra você?
Antes de 2019, por mais especiais que os momentos fossem, eu estava simplesmente fazendo o meu trabalho. Estava sempre focada no meu trabalho e no que eu deveria fazer. Porém com as minhas novas experiências de vida desde 2019 eu aprecio cada um destes momentos especiais nas vidas dos meus clientes, como se eu estivesse de novo experenciando meu próprio casamento. Me sinto completamente honrada e agradecida por poder entregar aos meus clientes a trilha sonora de seus dias tão especiais.
À parte esta vertente (dos eventos como casamentos), qual a apresentação mais marcante pra você?
Foi um evento de arrecadação de dinheiro para o exército britânico, que aconteceu dentro das casas do Parlamento Inglês (lá dentro do Big Ben, para quem não consegue imaginar o parlamento). Foi muitíssimo interessante andar lá dentro à noite, sem ninguém nos vigiando, e ver a torre do Big Ben do lado de dentro, onde nenhum turista entra. Este dia foi muito legal! Meu marido conseguiu até explorar os túneis subterrâneos que conectam o Parlamento, Downing Street (a casa do Primeiro Ministro), Westminster Abbey (a Igreja onde os reis são coroados), e outros locais magníficos naquela área. Esses túneis não são de conhecimento público – mas eu posso atestar que eles existem!
A pandemia afetou diretamente os artistas e profissionais ligados a esse setor. Como tem sido pra você pessoal e profissionalmente?
Quando a pandemia começou o governo britânico ofereceu suporte aos profissionais de todas as áreas afetadas pelo Covid, e como musicista profissional, recebi os benefícios do governo que me davam direito à época, o que me manteve em pé. Porém a pandemia me ajudou em muitos outros aspectos. Revi os meus pacotes, e revi também todos os tipos de performances que eu fazia, e hoje em dia foco somente nas que me fazem mais feliz. Adoro casamentos religiosos em igrejas. No momento não aceito pedidos para performances em eventos grandes. Estou preferindo me conectar mais com cada individuo presente, e estou usando esta oportunidade para introduzir a minha filha ao meu ramo de trabalho, e ela já esta presente na grande maioria dos eventos que faço.
Na sua opinião qual a importância da cultura para a sociedade? Percebe muita diferença entre Brasil e Europa?
Eu tive muita sorte de sempre ter sido rodeada por pessoas envolvidas em vários tipos de arte, seja ela a dança, pintura, poesia, música... Pra mim a cultura não importa em que forma ela apareça, é extremamente importante para uma sociedade. É com a cultura que expressamos nossa humanidade, nossos sonhos, desejos, amores... E para a juventude, acesso à cultura, acesso a diferentes maneiras de se expressar, são extremamente importantes! Sem cultura, seja qual for, os jovens sentem-se frustrados e acabam tentando preencher o vazio comum que todos experimentamos na adolescência com outras coisas menos favoráveis à vida. A cultura aqui é muito liberada e comum. O acesso a teatros, música e cinema é extremamente mais fácil.
Você constituiu uma linda família na Inglaterra e logo na sequência passou por uma grande perda. Como tem sido pra você?
Conheci o meu marido com 22 anos de idade. Quando o perdi 10 anos depois, eu tinha somente 32, e tínhamos uma recém-nascida. A minha história com o Harvey já havia começado há muitos séculos (isso é difícil de se expressar livremente tanto na Inglaterra quanto no Brasil – porque vida após a morte não é assunto que todas as culturas aceitam abertamente, especialmente entre muitas denominações cristãs). Não preciso fingir ou esconder a verdade que me foi mostrada e mostrada tantas vezes. O meu marido me guiou durante o primeiro ano após sua partida. Me aconselhando com questões financeiras, mudança de casa, mudança de cidade, e até mesmo me dando um presente de Natal em 2021, 18 meses depois de sua morte. A história seria muito longa para fins desta publicação. Eu só perdi o Harvey fisicamente. Não o perdi em essência... Então por mais difícil que a minha situação seja às vezes, só eu e minha filha, sem a força física do pai dela para nos proteger e ajudar, nós nunca estamos sozinhas, e tenho a permissão de Deus para acessar a dimensão em que ele hoje mora durante as minhas orações, meditações, ou simplesmente espontaneamente. Quando conheci o Harvey ele me mandou uma mensagem por telepatia, para testar o que ele vinha tentando testar durante a vida toda dele – eu recebi a mensagem, clara e perfeita. Ele ficou chocado naquele momento... Me disse que acreditava sim que aquilo tudo era possível, mas que não tinha conhecido ninguém em 36 anos de vida, que fosse capaz de receber ou até mesmo entender o que ele estava tentando fazer. Esse momento nos uniu muito, porque daquele momento em diante tivemos várias visões do passado (eu as via com mais clareza), e também do futuro, incluindo a separação física que nos afetaria – porém não sabíamos como ou quando iria acontecer, mas sentíamos que seria muito antes do que gostaríamos.
O que a motivou a seguir na Inglaterra?
Minha vida pessoal e profissional são bem estabelecidas na Inglaterra desde os meus 19 anos. Minha filha e eu temos dupla cidadania – brasileira e inglesa – então me considero para sempre residente dos dois países. Temos uma residência em Paraíso, e com a permissão de Deus, passaremos vários meses no Brasil todos os anos para a minha filha ver os priminhos e familiares brasileiros, e se integrar na língua e cultura do Brasil.
Pensa em retornar um dia para o Brasil?
Não tenho intenção de voltar a morar no Brasil permanentemente. Porém se a Bridget se apaixonar por um brasileiro um dia e quiser se mudar, eu não terei muito escolha, terei que me mudar com ela (risos). Adoro visitar o Brasil, e sentir o calor, ver a família. Mas a minha vida é maravilhosa na Inglaterra. Sou muitíssimo feliz aqui com minha filha e minha família inglesa. Porém, gostaria muito de poder manter meus pais no bolso, e tê-los sempre pertinho, principalmente hoje que eles têm uma netinha tão linda!
O que diria para uma criança ou jovem que sonha em seguir a carreira de músico?
Muitos me perguntam isso e eu sempre respondo com o mesmo entusiasmo. Continuem firmes e fortes. Façam o que amam, e tudo dá certo. Gostaria muito que minha filha seguisse uma carreira musical ou alguma outra carreira artística. Quando uma criança ou um jovem tem um sonho, devemos sempre os fortalecer e oferecer suporte moral, ou financeiro se a situação nos permitir. Não importa o que desejam fazer, se houver paixão por aquilo que faz, e muita vontade e fé, o universo abrirá as suas portas. Tenho muito a agradecer aos meus patrocinadores na juventude (vocês sabem quem são) – sem a ajuda deles talvez não teria tido a ousadia de seguir em frente com uma carreira na música. Então diria mais às pessoas ao redor de crianças e jovens que queiram seguir uma carreira musical ou artística – ajudemos moralmente e financeiramente se possível. Invistam nos sonhos deles e deixe a vida guiá-los.
Rachel, qual seu maior sonho?
Eu tinha um sonho muito intenso na minha vida – o de encontrar a minha alma gêmea – alguém que me entenderia por inteira. Hoje, cada dia é especial para mim, cada minuto. Hoje vejo cada dia, experencio cada momento, como um milagre divino. Os meus dias com o Harvey foram cheios de emoções, aventuras, milagres. Agora são novas aventuras, novas emoções, mas tudo parte de um universo constante e unido, como se tudo acontecesse ao mesmo tempo. Como se meu passado, meu presente e meu futuro estivessem acontecendo AGORA. Se tivesse que realmente escolher algo, diria que meu sonho atual é experenciar um palco com a presença da minha filha como musicista ao meu lado e de conseguir escrever um livro contendo momentos marcantes e divinos que aconteceram comigo, com a Bridget e com o Harvey, para trazer esperança e paz a outras pessoas que passam ou passaram pela dor da perda física de um ente querido. Para finalizar gostaria de deixar uma frase inspiradora de Albert Einstein: “Só há duas maneiras de viver a vida: a primeira é vivê-la como se milagres não existissem. A segunda é vivê-la como se tudo fosse um milagre”.