ELE por ELE

JOSÉ HILTON ROSA

Por: Reynaldo Formaggio | Categoria: Entretenimento | 28-08-2022 10:50 | 3129
José Hilton Rosa
José Hilton Rosa Foto: Acervo pessoal

Assim que formou o município de Guapé, intencionalmente cortando a letra “a” do antigo nome Aguapé, em razão de diminuir o dispêndio quando fosse citar o nome no telégrafo, Passos Maia fez isso com outros lugares pertencentes ao município. Imaginando que as mudanças destes nomes lhes traria o progresso, trocou também o nome do distrito de Araújos para Araúna. Pois foi neste pequeno lugarejo que nasceu José Hilton Rosa, escritor com sensibilidade aguçada e olhar atento. Tudo que acontece ao seu redor pode lhe servir de inspiração. Aos 66 anos José Hilton tem profundas ligações com São Sebastião do Paraíso, cidade onde viveu e que acolheu sua família após o represamento do Lago de Furnas. Participante ativo de feiras e encontros literários, autor de vasta obra, o escritor traça uma retrospectiva de sua carreira e conta o que faria se fosse escolhido o novo ministro da Educação e Cultura.

José Hilton, nos conte sobre suas origens.
Nasci no distrito de Araúna, pertencente ao município mineiro de Guapé. Fui alfabetizado em escola rural e aos sete anos já levava marmitas para meu pai na lavoura. À tarde ia pra escola, onde a professora era minha madrinha. Depois de alfabetizado, ia a cavalo para outra escola que ficava mais distante. E aos 13 anos fui para a cidade estudar. 

Como surgiu o escritor? Exerceu alguma atividade anteriormente?
Aos 13 anos, em 1969, ganhei em primeiro lugar um concurso de redação com o tema “Dia da Ave”. Quem assinou meu certificado foram Yolanda Costa e Silva, a esposa do presidente Costa e Silva; Tarso Dutra, ministro da Educação e Cultura; e Yolanda Assad Aoun, diretora da escola Julia Kubitschek em Passos. Talvez ali tenha sido plantada a sementinha do escritor. Em 1977 vim para Belo Horizonte estudar, fazer cursinho para vestibular. Trabalhei no Banco Crédito Real e fui proprietário de loja de decoração e revestimento. E posteriormente, de forma independente, comecei a publicar meus escritos.

Quais seus autores e livros favoritos?
Autores preferidos: Federico Garcia Lorca, Eduardo Galeano, Gabriel Garcia Márquez, Mario Vargas Llosa, Jorge Luis Borges, Pablo Neruda, Isabel Allen-de, Jessé Souza, Manuel de Barros, Vinicius de Moraes, Augusto dos Anjos, Laurentino Gomes, Frei Betto, Paulo Freire e muitos outros. Livros favoritos: de Psicologia “Só posso tocar você agora”, de Ronald B. Levy. De história “Escravidão” de Laurentino Gomes. E também aprecio autores de biografias como Fernando Morais, Lilia Moritz Schwarcz e Jorge Caldeira, autor de “Mauá - Empresário do Império”. Sobre o autoritarismo brasileiro indico Daniela Arbex, autora de Cova 312 e Holocausto Brasileiro (livro interessantíssimo sobre a colônia psiquiátrica em Barbacena). Tenho muitos livros! Leio desde que fui alfabetizado.

Nos conte sobre os títulos que já publicou. E de onde vem a inspiração para suas obras?
Já publiquei nove títulos de poesia: “Laços de sangue”; “Choro de sangue” (foram escritos quando era adolescente, mas somente no ano 2000 tive condição de publicá-los de maneira independente); “Inversos”; “Versos em alças de fogo”; “Sorrisos e lágrimas”; “Alma exposta”; “O peso da lágrima”; “Sorriso da lua” e “Preces na solidão” (este escrevi no período da quarentena. Vou começar a fazer lançamentos e divulgação). Também os infantis: “Fazenda Salinas”; “A gata esperta e o cão vigilante”; “O gato e o rato”; “O lobo não é mau”. Lancei esse ano “A árvore e o Livro” e está na impressão o último título infantil: “Primavera aprende na escola”. As inspirações vêm dos sentimentos; amorosos, políticos, críticos e crônicos. O cotidiano é o maior fornecedor de inspirações. Onde estou, seja viajando, reunindo com amigos, observando o meio, pode surgir motivo para escrever.

São Sebastião do Paraíso tem um lugar especial na sua vida. O que vem à memória ao ouvir o nome de nossa cidade?
Cidade que recebeu meus pais, dando-lhes emprego e condição de sobrevivência após terem suas terras invadidas pelo represamento de Furnas. Participei da vida noturna e artística da cidade, frequentando o cinema, carnaval nos clubes e na rua. Muito cedo vim para BH estudar, isso em 1977. Voltava a Paraíso para visitar e curtir férias com minha mãe. Meus irmãos ainda moram em São Sebastião do Paraíso.  Meus pais e um irmão estão enterrados no cemitério local.

Você trafega por diversos gêneros literários, tem algum preferido?
Os mais explorados são a poesia e a literatura infantil, com historinhas para crianças até 10 anos de idade. Também tenho alguns contos publicados em coletâneas. 

Como participante de diversos eventos literários, como vê este intercâmbio entre escritores?
É muito proveitoso para conhecer estilos e formas de expressão sobre diversos temas. Entre os escritores não há barreiras nem críticas negativas sobre um trabalho ou outro. Nessa nossa contemporaneidade as editoras deixaram de contribuir para divulgar e acreditar nas obras de novos escritores. Raramente a mídia faz destaque de algum nome. É muito difícil o escritor contemporâneo sobreviver das vendas de seus livros. Principalmente porque o brasileiro lê muito pouco e não tem condição financeira de comprar livros. O tempo para ir e ficar numa biblioteca é um dificultador. Outro ponto que retirou muito o interesse pela leitura foi o celular com internet. Redes sociais tomam muito tempo dos jovens de hoje.

Com as transformações das mídias, acha que o livro físico está com os dias contados?
Não acho que o livro físico vai acabar. Muitos leitores não se adaptam a leituras em telas de computadores e celulares. As informações e conteúdos em livros são mais confiáveis. É verdade que muitas livrarias estão fechando, mas é devido às novas tecnologias de impressão e monopólios de distribuição, como a Amazon que só imprime aquilo que vende. Mas o charme de uma livraria não vai ser superado. Pelo menos nos grandes centros. Exemplo de charme é o El Ateneo, em Buenos Aires, lugar de destaque em valorização da literatura em papel. Existem livrarias na cidade abertas 24 horas!

Se você fosse escolhido o novo Ministro da Cultura, qual seria sua primeira atitude?
Rapaz! Seria cobrar mais verba e apoio para a Educação e Cultura. Em primeiro lugar valorização da Educação. Porque é através dela que vem a cultura e suas variantes de arte. Valorização dos professores e investimento nesses profissionais com mais formação e informação. Além da pesquisa, escolas em período integral nas periferias das cidades, dando condição e alimentação para os alunos pobres, retirando-os da rua para ensiná-los alguma profissão.

Na sua visão como a literatura pode contribuir para a sociedade?
Muita contribuição. Principalmente com suprimento às bibliotecas públicas e nas escolas, de pensadores e escritores de mérito reconhecido e não compras superfaturadas em troca de apoio político. Incentivar nas escolas os alunos a lerem pelo menos um livro por semana. Cada escola abrir uma matéria de Literatura ao pé da letra. Ler! Ou seja, uma hora por dia para praticar a leitura na biblioteca. O aluno recebe indicação do professor ou bibliotecária, para separar um título e ler. Todos os dias um ou dois capítulos do livro e no final da semana cada aluno apresenta o livro que leu para os colegas na frente da classe. O que entendeu e o que quis expressar o autor. Se o aluno levar para casa não surte o resultado esperado. Principalmente nesse mundo da internet no celular. Concluindo: é pela leitura que desenvolvo meus raciocínios para fazer uma boa redação e escrever algo. O Google não é o melhor professor. Sem essa de copiar e colar!