Fábio Cadeira*
Recentemente ocorreu uma formal cerimônia de uma das mais altas condecorações dadas pelo governo federal, a Ordem de Rio Branco. Criada em 1963, é dedicada a pessoas que “por qualquer motivo ou benemerência, tenham se tornado merecedores do reconhecimento do Governo Brasileiro, servindo para estimular a prática de ações e feitos dignos de honrosa menção, bem como para distinguir serviços meritórios e virtudes cívicas. Pode ser conferida a pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras”.
Uma das contempladas foi a primeira dama Janja, esposa do Presidente Lula. Este também entregou a mesma condecoração em 2010 para sua ex-esposa Marisa Letícia, assim como Bolsonaro para Michelle Bolsonaro, em 2021.
Já os ex-presidentes Michel Temer e Fernando Henrique Cardoso não usaram seu poder para agraciar as respectivas primeiras-damas Marcela Temer e Ruth Cardoso.
Abstraindo de qualquer questão ideológica, há que se refletir sobre a existência de fatores que justifiquem as primeiras damas receberem distinta homenagem.
Por suposto não deve ser fácil ser esposa de um presidente da república. Os constantes desafios e problemas diários de um chefe da nação, com pressões de todos os lados, decisões que precisam ser tomadas, coordenar complexas articulações e buscas consensos, faz com que as respectivas esposas, ou esposos quando assim o for, tenham um papel de grande relevância de apoio e pró atividade (quando for o caso) no labor e na estabilidade emocional do titular.
Mas daí serem indicadas para uma das mais importantes condecorações do país, tenho dúvidas. Em uma breve pesquisa não encontrei fatos que embasem o recebimento da honraria pelas citadas primeiras damas. Vejam, não está in caso capacidade intelectual, sensibilidade social ou destacada inteligência. Talvez seja algo mais para satisfazer vaidades do que propriamente algo meritório.
Quanto à etimologia, a palavra vaidade é originária dos termos latinos vanitas, vanitatis: cujo significado é “nada mais nada menos, que vacuidade (o que é próprio do vácuo), ou seja: vazio absoluto! No idioma hebraico, língua original dos textos do Antigo Testamento da Bíblia, vaidade é traduzido por “hãvel”, que significa vazio, vapor, um vazio absoluto.
Segundo o portal aleteia, “Todos temos algum nível de vaidade. O problema quando é exagerada. A vaidade excessiva pode ser uma característica de pessoas carentes.
“Vaidade das vaidades, diz o Eclesiastes, vaidade das vaidades! Tudo é vaidade” (Eclesiastes 1, 2).
Acima estão as palavras do sábio rei Salomão, uma afirmação de que ninguém escapa da vaidade, pois tudo é vaidade. O sábio vai mais além: “vi tudo o que se faz debaixo do sol, e eis: tudo vaidade, e vento que passa (Eclesiastes 1, 14)”.
Vale refletir uma declaração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que disse em uma entrevista “se considerar mais inteligente do que vaidoso. FHC se revelou, numa verdadeira contradição, mais vaidoso do que inteligente.
Lembremos ainda do filósofo Sócrates, que alegava ser a pessoa mais sábia do mundo porque sabia que nada sabia, enquanto as demais pessoas não sabiam que nada sabiam. O ponto fulcral é saber até que ponto o filósofo pode admitir que é sábio sem perder a sabedoria em benefício da vaidade.
Vaidade. Algo elementar da existência humana, mas quando em doses excessivas, torna-se algo patético.
Fábio Caldeira - Doutor em Direito pela UFMG e professor da Academia da PMMG
(Hoje em Dia, 01/12/2023).