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SARITA BORDINI: tranquilidade que carrega para vida e um amor incondicional pelos animais

Por: João Oliveira | Categoria: Acidente | 29-10-2017 14:10 | 7203
A farmacêutica Sarita Bordini é perita criminal e atual na 4º Delegacia Regional  de Polícia Civil, além do trabalho social que realiza junto a ONG Anjos de Resgate
A farmacêutica Sarita Bordini é perita criminal e atual na 4º Delegacia Regional de Polícia Civil, além do trabalho social que realiza junto a ONG Anjos de Resgate Foto: Reprodução

A perita criminal Sarita Aguilar Santana Bordini é uma mulher dedicada ao trabalho e inclinada à defesa dos animais abandonados. Além de muito carismática, é dedicada em tudo o que faz e sempre encarando as adversidades com um sorrido inconfundível. Formada em Farmácia pela Universidade Federal de Minas Gerais, essa mulher multifacetas, de 36 anos, é mãe, esposa e, além da atuação junto a Polícia Civil, também é apaixonada por trabalhos manuais e já foi professora de Inglês, profissão que deixou após ter engravidado do seu primeiro filho, o pequeno Theo, de dois anos. Sarita passou quase a vida inteira em Belo Horizonte, mas foi em Paraíso, após passar no concurso da Polícia Civil e trabalhar por dois anos no município, que conheceu o amor da sua vida, o delegado Tiago Bordini, e decidiu aqui criar raízes. Filha do senhor Wueliton e Kátia Santana, ela é a mais velha de três irmãos, a Sheyla, de 34 anos – e que há três que mora nos EUA – e do  Wellington, de 31. Em Paraíso ela encontrou a paz e tranquilidade que lhe é característica e não tem planos para ir embora. Ela ainda sonha em trazer os pais para perto e aumentar a sua família.




Jornal do Sudoeste: Você é natural de onde?
Sarita Aguilar Santana Bordini: Eu nasci em São Paulo, mas quando estava com um ano meus pais se mudaram para Belo Horizonte, onde vivi até me casar, aos 32. Meu pai trabalhava na Fiat e quando a empresa abriu filial em Betim, ele foi transferido para lá, onde fomos criados desde então. Eu me mudei para Paraíso em agosto de 2012, mas já conhecia a cidade. Quando eu passei no concurso para perita criminal da Polícia Civil, vim para cá onde trabalhei por dois anos, foi quando conheci meu marido, Tiago Bordini, e começamos a namorar. Porém, fui transferida para Betim, região metropolitana de BH. Quando resolvemos nos casar, eu pedi minha transferência de volta para Paraíso, em 2012, e aqui decidi passar minha vida. No início foi difícil, trocar a cidade grande, deixar meus pais, meus amigos e minha vida costumeira, mas hoje em dia eu já não troco essa tranquilidade daqui por mais nada.




Jornal do Sudoeste: Qual a sua formação e como foi seu ingresso na Polícia Civil?
S.A.S.B.: Eu sou farmacêutica, formada pela UFMG em 2005 e em 2007 eu passei no concurso na Polícia Civil. O cargo de Perito Criminal tem muito farmacêutico e eu já entrei na faculdade ouvindo falar dessa profissão, inclusive tenho muitos colegas de faculdade que também são peritos. Eu já tinha esse desejo quando entrei no curso, de ouvir falar tanto da carreira, quanto dos benefícios; e compensava muito mais do que trabalhar como farmacêutica, mesmo porque era concurso público, que é uma vantagem hoje em dia. Já tem 10 anos que estou na área.




Jornal do Sudoeste: Como você lida com a profissão, não é um trabalho muito tenso?
S.A.S.B.:  A nossa profissão todo mundo tem um pouco de receio porque lidamos muito com crimes que com vítimas fatais, lidamos muito com cadáveres, então a ideia é de um trabalho muito tenso, mas essa é só uma parcela do que fazemos e que a população conhece por conta de seriados televisivos. Somos responsáveis por fazer inúmeros tipos de perícia que as pessoas nem sabem que existe. É um trabalho muito bacana porque lidamos com muita coisa diferente e já peguei alguns casos complicados como suicídio de criança e diversos acidentes de trânsito que são os casos que mais me atingem porque é algo que ninguém espera; querendo ou não às vezes uma coisinha boba destrói uma família inteira e isso mexe muito comigo. Felizmente a gente se acostuma com tudo e se eu fosse me deixar afetar por cada um dos casos que trabalhamos, não ia ter vida.




Jornal do Sudoeste: Na sua percepção, Paraíso é uma cidade violenta?
S.A.S.B.: Para quem trabalhou em uma cidade muito violenta, e trabalhei em Betim que está entre as três cidades mais violentas do estado, Paraíso é o paraíso. Claro que as pessoas ficam um pouco chocadas com o aumento da criminalidade porque estão comparando com a cidade de há 10 anos, mas se você compara com uma cidade como Betim, Juiz de Fora, Contagem e até mesmo Passos, que são cidades extremamente violentas, aqui é o paraíso. O que choca em um crime passional, por exemplo, é a proximidade, quando você vê isso na televisão é algo que não te atinge, mas quando acontece com um vizinho ou conhecido, você vê que aquilo é uma realidade.




Jornal do Sudoeste: Ser farmacêutica era algo que você sempre almejou?
S.A.S.B.: Na verdade, não. Na época da escola eu pensava em fazer Engenharia Química, mas conversando com uma professora que era química, comentei com ela que queria fazer esse curso e à época não sabia que existia o curso de Farmácia. Então ela me orientou a procurar por ele porque era mais o meu perfil, pois a Engenharia a base era muita matemática e física, além da química, e como não era muito fã dessa outras disciplinas, Farmácia seria algo que me atenderia melhor. Eu sou apaixonada pelo curso, e não trabalho com ele porque as oportunidades não são tão boas quanto prestar um concurso. Não me arrependo nenhum pouco. Já cheguei a estudar Direito também, estudei dois anos, mas parei porque não era o meu perfil, é um curso muito burocrático e sou uma pessoa muito prática. Era boa aluna de Direito e quando fui desistir teve professor que tentou me convencer a não fazer isso, mas eu estava em outra fase da minha vida. Porém, sou feliz com meu curso e com o meu trabalho.




Jornal do Sudoeste: Você gosta muito da sua profissão? Como é a atuação do perito?
S.A.S.B.: Eu gosto muito do meu serviço, tem essa parte ruim de lidar com o crime, mas fazemos muitas coisas que ninguém sabe como perícia em droga, arma de fogo, ambiental, em vídeo, e várias outras áreas. Sobre a atuação, os peritos criminais são àqueles que vão até o local do crime para procurar evidências que possam ajudar a polícia a entender o que aconteceu e quem poderia vir a ser culpado no crime. Mas existem outros casos que são mais simples, por exemplo, apreensão de arma de fogo: se a arma estiver funcionando é um crime, se não estiver funcionando é um crime totalmente diferente e quem identifica isso são os peritos. Há outros trabalhos que fazemos que vão ajudar o delegado de polícia a decidir se existe ou não um crime naquele caso. Todas as funções da Polícia têm um papel importante e a perícia é uma delas.




Jornal do Sudoeste: É a mesma coisa que nos seriados de TV ou é uma realidade totalmente diferente?
S.A.S.B.: É um trabalho de muito glamour, porque todo mundo vê na televisão, assiste “CSI Las Vegas”... Tudo aquilo que vemos na TV, eu costumo dizer isso muito em palestra sobre perícia, é muito glamourizado. Todas aquelas ferramentas realmente existem e muitas tecnologias que são apresentadas na televisão nós possuímos, a diferença é que na TV tudo é feito para dar certo, o que não acontece na vida real; nem sempre conseguimos encontrar indícios bons o suficiente até mesmo para serem analisados. Além disso, na TV os crimes são muitos passionais, e esses crimes, motivados pela emoção, sempre deixam rastros. Porém, no Brasil, a maioria dos crimes é relacionada ao tráfico de drogas e não deixam evidências para que possamos trabalhar.




Jornal do Sudoeste: O que mais te marcou na sua vida em Paraíso?
S.A.S.B.: Foi aqui que eu comecei a minha família. Eu nunca tinha saído da casa dos meus pais, morei com eles até antes de casar, aos 31 anos. Então, saí de BH para vir para cá, foi aqui que eu tive meu filho, que já tem dois anos, construí a minha casa, tenho um bom círculo de amigos. Hoje em dia não me vejo fora daqui e estou querendo trazer meus pais para cá também porque eles estão lá sozinhos agora. Eu tenho uma irmã que mora nos EUA, a Sheyla, que tem visto americano e não pretende voltar, e tenho outro irmão, o Wellington, que mora no interior de Minas. Estou tentando convencer meus pais de se mudarem para Paraíso. A qualidade de vida aqui é muito melhor, claro que a mudança é muito difícil e no início eu também não queria ir embora, mas até mesmo pela nossa profissão, a cidade menor é menos arriscada para se viver e até mesmo para criar meu filho, hoje eu não troco isso por nada. 




Jornal do Sudoeste: Por que você decidiu se envolver com a causa animal?
S.A.S.B.: Na verdade eu queria me envolver com uma área social quando me mudei para cá, mas não tinha me decidido ainda se seriam crianças, idosos, animais, enfim, é tanta gente que precisa de ajuda que quando você quer ajudar você pode escolher. Na época conheci a Vânia Mumic, que é fundadora da Associação Anjos de Resgate. Eu pude ver o trabalho dela com os animais e o quanto era penoso, ela trabalhava praticamente sozinha e me interessei pela causa, mesmo porque gosto muito de animais também. Procurei saber o que ela precisava e no início ajudava apenas financeiramente, mas conversando com a Vânia eu vi o quanto esse trabalho estava ficando pesado e resolvi colocar a mão na massa. Procurei por ela, sentei para conversar, identificamos os problemas que a Associação tinha, o que precisava, marcamos uma reunião, conseguimos juntar um grupo muito bacana de pessoas atuantes e que correm atrás, e no início do ano passado conseguimos regularizar toda a Associação e a trabalhar com mais garra,  tanto para que a população passasse a conhecer esse trabalho, quando realizando eventos para arrecadar recursos para manter a ONG.




Jornal do Sudoeste: É um custo muito alto manter a ONG?
S.A.S.B.: Sim. O gasto financeiro é muito alto e nós vivemos de doações e não temos ajuda de prefeitura, do Estado ou da União, então nós temos que correr atrás e fazer pelo menos um evento a cada dois meses, fazemos camisetas para vender, rifas, vendemos marmitas, o que é possível para dar força para essa causa. Hoje, a ONG tem sob sua tutela cerca de 200 animais. É um gasto financeiro de cinco a R$ 6 mil reais por mês, e nós trabalhamos apenas com doação da população e vamos nos virando, tirando um pouquinho daqui e dali. Entretanto, possuímos uma dívida de quase R$ 20 mil, mas graças a Deus temos na cidade pessoas que nos ajudam muito, como o pessoal do Super Dog, que é o nosso grande parceiro, e se não fosse essas pessoas nos ajudarem, não teríamos como fazer esse trabalho.




Jornal do Sudoeste: O abandono de animais é um problema sério em Paraíso?
S.A.S.B.: O abandono de animais é um problema de saúde pública mundial, não é apenas em Paraíso. São pouquíssimas as cidades do mundo que conseguiram resolver essa questão, sempre com fiscalização e multas pesadas para quem abandona e programas de castração, que é o que resolve. Mas isso é teoricamente difícil de conseguir, porque depende do Poder Público, das pessoas e nós enfrentamos muita resistência. Já ouvi inúmeras vezes as pessoas me questionando o porquê com tantas crianças, idosos e deficientes físicos, eu iria ajudar justamente os animais. É muito complicado, o fato de existir crianças precisando de ajuda, não exclui os idosos ou os deficientes ou os animais. Todo mundo precisa e cada um pode ajudar um pouco. Essas pessoas, além da assistência social, conseguem se comunicar e os animais não, eles dependem da gente para fazer algo por eles. Enfim, realmente existe um problema perceptível em nossa cidade, o que é um problema de saúde pública e às vezes fazendo investimento nessa área, economiza-se em outras áreas da saúde. Hoje, o poder público em Paraíso, principalmente os vereadores, começou a prestar mais atenção e tem nos ajudado na medida do possível, vejo perspectivas melhores para futuro.




Jornal do Sudoeste: Qual a maior dificuldade hoje da Anjos de Resgate?
S.A.S.B.: Atualmente enfrentamos um problema muito sério com o abrigo, que não divulgamos mais o local porque há pessoas que jogam os animais por cima do muro e há animais bravos lá dentro. Precisamos mudar urgentemente porque a área é cedida e a proprietária vendeu e quem comprou quer que nos retiremos de lá. Estamos numa luta muito grande para encontrar um novo local, de preferência definitivo, para não ficar passando por isso a cada cinco anos. E é um trabalho que requer muito amor e muita atenção porque enfrentamos problemas diários: é financeiro, é de saúde animal, é a resistência das pessoas. Já não conseguimos resgatar mais nenhum animal, salvo em casos de extrema necessidade, porque o nosso coração não aguenta.




Jornal do Sudoeste: Ainda falta muita conscientização...
S.A.S.B.: Não somente do paraisense, mas de todas as pessoas para que compreendam que o cachorro não é brinquedo; às vezes  a pessoa se encanta por um filhote e quando chega em casa e o cachorro apronta pela primeira vez, essa pessoa simplesmente abandona o animal. E o cachorro é como uma criança: apronta bastante, e pior, ele não fala. Então, o que falta mesmo é conscientização, de que o animal não é brinquedo e tem sentimentos. Para você o animal é só uma parte da sua vida e para o animal você é a vida dele inteira. Abandonar não é legal mesmo. Nós temos um projeto, inclusive, de fazer campanhas nas escolas. Eu costumo dizer, e é uma frase de Pitágoras: “Ensine as crianças e não precisarás punir os adultos”. Precisamos começar pela base, para que daqui para frente consigamos melhorar um pouco essa realidade.




Jornal do Sudoeste: Além dessa rotina dinâmica, você também é mãe. O que mudou com a chegada do filhão?
S.A.S.B.:  Tudo. Eu trabalhei grávida do Theo até aos oito meses e iria até aos nove, mas à época torci o pé e fiquei impossibilitada de trabalhar por conta disso, nem foi por causa da gravidez, trabalhei quase ao final da gestação. Gravidez não é doença (risos) e mulheres grávidas aguentam fazer quase tudo e quem aguenta ficar grávida, dá conta de muito coisa. Uma criança muda tudo na sua vida, o seu ritmo. Antes de um filho, as suas vontades prevalecem  e depois de um filho, você faz o que dá e na hora que dá, são as vontades dele que prevalecem, principalmente porque uma criança pequena depende exclusivamente de você.




Jornal do Sudoeste: É possível conciliar a carreira de perita com a carreira de ser mãe?
S.A.S.B.: Sim. Por ser escala de plantão, eu consigo acompanhar de perto o desenvolvimento do meu filho e fico muito tempo com ele, exceto os dias que eu estou de plantão. Eu até brinco que o cargo de perito criminal é uma excelente profissão para mulheres que querem ser mãe ou ter uma família, porque os horários são muito flexíveis, principalmente para conciliar a vida profissional, familiar e outras atividades.




Jornal do Sudoeste: E qual o balanço que você faz e seus planos?
S.A.S.B.: Eu vivi muito bem até agora e não tenho do quê reclamar, fiz tudo o que eu queria fazer, me graduei, cuidei dos meus pais e convivi bastante com eles, conheci o amor da minha vida com quem me casei e tenho um filho, tenho cachorro, gato a minha casa e estou querendo mais filhos (riso). Eu faço um trabalho que eu gosto, não apenas aqui na perícia, mas também o trabalho social junto ao Anjos de Resgate, que está melhorando, tenho um grupo de amigos que se tornaram meus irmão e se continuar assim, acho que vou morreu velha e feliz (riso). Sobre meus planos, espero poder contribuir muito para melhorar a ONG e isso são vitórias pessoais, quando você decide lutar por uma causa, cada conquista que você obtém é um orgulho pessoal, não há cobrança, você faz aquilo porque quer fazer, porque ama. O meu grande foco é esse, no meu trabalho é continuar atuando, estudando e melhorando sempre e ver minha família crescer mais um pouco; um filho é pouco, dois é bom e três quem sabe... (risos). Eu sou muito tranquila e quero continuar minha vida assim.