“Eu respiro música”

Lá em casa todo mundo era musical, mas só eu que sobrevivo da música. Lá, a influência era a música sertaneja. Depois, mudei para a cidade, nos anos 60, comecei a ouvir rádio. Conheci o Elvis, os Beatles, Frank Sinatra, as orquestras que havia em Paraí
“Gosto muito do dom que Ele me deu. Agradeço por isto, de minuto a minuto. A música é uma coisa muito divina”. Foto: Arquivo JS

Guelfo Colombo Neto é músico desde os seis anos de idade, quando começou a brincar com violões e cavaquinhos. Aos 59 anos, afirma que respira música: dá aulas, faz apresentações solo, acompanha outros músicos e se mantém na constante busca de mais conhecimentos para continuar desenvolvendo seu dom. Para Guelfo, sem música a vida seria vazia.

Quando a música entrou em sua vida?

Eu sou músico desde os seis anos de idade. Comecei a tocar cavaquinho, violão. Meus pais tocavam e aquilo, para mim, era brinquedo. Depois, comecei com outros instrumentos, o acordeom, o cavaquinho. Lá pelos quatorze anos, comecei a mexer com música em conjuntos. Naquela época, lá por 1968, fiz parte do grupo Regentes. Fazia parte também o Nelsinho, aqui do Jornal, o Ricardo, já falecido e o Oberlaender, filho do senhor Benedito Marinzeck que era proprietário do conjunto. Éramos os quatro, depois vieram outros elementos. O Manuel Luiz Silva, que é falecido. Houve outras formações. Depois, passei para “Os Brasões”, nos anos 70. Participei de outros grupos.

Seus pais são músicos?

Meus pais tocavam por hobby, naquela época, na roça. Minha mãe também cantava legal, meu pai tocava violão, cavaquinho.

Quem são seus pais e onde vocês viviam?

Meu pai é Antonio Colombo, falecido há quatro anos, e minha mãe é Lourdes Pereira Colombo, irmã do Antonio Pereira, que era cantor (Brasões), já falecido também. A música é de família, mesmo, mas era um hobby. Naquela época, havia famílias que estavam envolvidas com a música, mas não faziam shows profissionais. Apenas alguns se sobressaiam mais. Nós morávamos na roça, em uma fazenda em Fortaleza, perto de São Tomás de Aquino. Eu sou nascido lá. Havia terços, festas juninas. Havia o terço de São Gonçalo. Era instrumental, com bandolim. Era bonito. Eu fui criado assim, desde os seis anos de idade, meus pais colocavam instrumento em minha mão e fui aprendendo.

Quais instrumentos?

Comecei pelo cavaquinho. Depois, passei a pegar o violão, lá pelos nove anos de idade. Mais prá frente, surgiu a guitarra, nos anos 60, uma época muito boa para a música. Eu era moleque e surgiram os Beatles, que ficaram famosos nessa época. Então, comecei a me interessar por guitarra. A guitarra que tocava na época era do Nelsinho, também. O Nelsi-nho é amigo-irmão, até hoje. Ele trabalha com jornal, mas nós fazemos trabalhos juntos, na área da música, ainda.

Como você conheceu o Nelson?

Conheci o Nelson na fábrica de calçados onde trabalhávamos. Tínhamos qua-torze anos. Ele falou que tinha uma guitarra e sabia que eu tocava violão. Chamou-me para ir à sua casa, para ver se eu pegava a guitarra. Ele tocou com o grupo “Zezinho e seus Big Boys”. Era baterista, mas tinha essa guitarra. Passei a ir a casa dele e tocar guitarra. Depois, começamos a tocar no “Regentes”.

Você estudou música em algum momento?

Muito pouco, teoria, muito pouco. Um maestro me passava alguma coisa, mas eu já tocava e já tinha ouvido absoluto, graças a Deus. Eu tirava música de ouvidos, do rádio. Naquela época, não havia Internet, nem pick up. Ouvíamos no rádio e tirávamos, até aprender.

Quais são suas influências musicais?

Quando comecei a tocar, morava na roça. Era música, Tonico e Tinoco, Zico e Zeca. Meus primos moravam na roça também, e cantávamos juntos. Eles eram afinados. Minhas irmãs, também. Lá em casa todo mundo era musical, mas só eu que sobrevivo da música. Lá, a influência era a música sertaneja. Depois, mudei para a cidade, nos anos 60, comecei a ouvir rádio. Conheci Elvis, os Beatles, Frank Sinatra, as orquestras que havia em Paraíso. Ficava doidinho para ver e participar. Então, começaram a surgir os conjuntos em Paraíso. Os anos 70 foram os mais marcantes.

Qual o seu grupo e cantor preferidos?

Há muitos, mas o que mais marcou, mesmo, foram os Beatles. Foi uma influência, mesmo. E o Elvis, pois minha irmã era muito fã dele, ouvia bastante.

Qual a força do rádio em sua vida?

Minha mãe ligava o rádio logo cedo. A gente acordava cedo, minha mãe e meu pai iam trabalhar, nós íamos para a escola. Não havia pick up e pelo rádio ouvíamos o bom sertanejo, de raiz. Havia paradas de sucesso, que eram muito legal. As músicas duravam o ano todo no sucesso. As músicas eram muito bem feitas. A gente ouvia e queria aprender a tocar daquele jeito.

Onde surgiu o interesse pela MPB?

Tempos depois, amigos meus violonistas, como o médico Dr. Elídio dos Santos, que era do  Rio de Janeiro e morou em Paraíso, me apresentaram trabalhos de Baden Powell, que tocou com Elis Regina, Tom Jobim. Isso me influenciou muito. Estes amigos sabiam que eu mexia com música, dava aulas, e gostavam muito de mim, por isso me chamavam para ouvir discos na casa deles. Através destes músicos da Bossa Nova, Baden, Tom Jobim, comecei a tirar alguma coisa da música instrumental, também.

Eu estudo até hoje. Os clássicos, também. De ouvido. Depois que surgiu a pick up, eu ganhava discos, fitas. O Dr. Garcia foi outra pessoa que me influenciou muito. Ele foi meu aluno de violão, por volta de 1980. Ele me chamava para gravar músicas na casa dele, pois eu não tinha recursos. Gravava e tirava tudo, assim fui desenvolvendo.

Você dá aulas, atualmente?

Sim, dou aulas. Comecei a dar aulas em 1969, de violão, ia às casas dos alunos. Até hoje, ainda leciono, mas um pouco menos. Dei aula de viola e cavaquinho, também. Mas era mais violão e, depois, guitarra, quando o pessoal começou a comprar guitarra.

Com quem você toca, atualmente?

Eu não trabalho fixo, mais. Toco no “Paraíso em Seresta”, com Nelsinho, Ângela, Arthur e a Silvia. Grandes amigos, com quem já trabalho, há muito tempo. Toco com a Danuza, também. Há oito anos, fazemos algumas coisas juntos. Ela começou a ter aula de violão comigo e, um dia, cismou em cantar em barzinho. Nós ensaiamos. Começamos, tocamos muito tempo junto. Ainda fazemos alguma coisa juntos, mas não é fixo, pois hoje está mais difícil, devido à escassez de barzinhos.

Faço algumas coisas fora da cidade, também, como em Ribeirão, quando me convidam. Faço algumas viagens para tocar. E faço algumas coisas menores, sozinho.

É difícil ser músico em Paraíso?

Viver de música em Paraíso, como eu vivia de primeiro, é difícil. Eu vivia de música, mesmo, não reclamo. Apesar de dar aula, fazia shows. Eu tinha uma reserva, não esbanjava, queria ter uma casa para dar aula de música e sobrevivia com isso. Hoje, está mais escasso, está difícil. Naquela época, fazíamos muitos shows. Agora, com a música eletrônica, está mais complicado. Viver de música é difícil, mas eu não reclamo, porque já tive esse privilégio.

Por que você não saiu de Paraíso?

Eu estive por uns tempos em São Paulo, em 72. Estava com 20 anos de idade. Toquei em algumas boates, fui bem recebido. Depois, como era apegado à minha família, voltei para Paraíso, para mexer com música aqui. Eu gosto de Paraíso. Eu não gostava daquela vida turbulenta de São Paulo. Eu sempre fui mais light. Depois, toquei em Franca, também, em 79. Era bom, porque é perto de Paraíso. Toquei com o falecido Chicão Neves, o conhecido cantor Francisco Neves. Trabalhei muito tempo com o Quincas e toquei sozinho, também. Trabalhava de quarta em diante, direto, por uns três anos. Ganhava um bom dinheiro, lá. Trabalhei em Ribeirão, também, mas morava em Paraíso.

Como é o trabalho com o “Paraíso em Seresta”?

Aqui, em Paraíso, não havia esse trabalho com seresta. Pensamos em fazer uma coisa diferente, com os clássicos da música brasileira neste gênero. Muita gente não conhece o que estamos fazendo. Estamos resgatando esse estilo dos anos 50. Levamos aos jovens, também, e às pessoas que estavam carentes de ouvir músicas boas. Graças a Deus, nós acertamos, está agradando. Além de fazermos músicas antigas, fazemos algumas novas, para os jovens. Eles vão a nossos shows e falam: “Que coisa bonita, não conhecia”. Está sendo uma satisfação fazer este trabalho.

Sua vida é só a música?

Só a música, mesmo. Eu respiro música. Lógico, eu gosto de meu esportezinho, gosto de academia, musculação. Sempre gostei de vida mais light. Geralmente, os músicos gostam de vida mais boêmia, eu já gosto da vida light. Mas dedico a maior parte do tempo para a música. Principalmente, à noite, fico muito tempo praticando, ouvindo os clássicos. Faço para mim, também. E pratico esporte todo dia. Cinco vezes por semana, vou à academia. Sempre gostei. A gente vai envelhecendo e tem que fazer o que faz bem prá gente, não pode ficar em uma coisa só.

Você se preocupa com alimentação e outras questões da vida saudável? 

Sim, procuro ter uma alimentação boa, desde mocinho. Sempre procurei em revistas o que faz bem prá gente. Graças a Deus, a gente vai envelhecendo e aprendendo mais coisas. Eu como cereais integrais, de manhã, frutas, como pouca carne, mais branca e peixe. Bastante verdura. E procuro dormir cerca de sete horas por noite.

Como é sua relação com Deus?

Sem dúvida, é muito gratificante. A todo o momento, temos que agradecer a vida que Ele nos deu e o dom que Ele me deu. Gosto muito do dom que Ele me deu. Agradeço por isto, de minuto a minuto. A música é uma coisa muito divina.

Ele é tudo, é o Rei do Universo, e nós estamos em Suas mãos. Agradeço meu dom. Todas as pessoas têm seu dom, devem procurar aproveitá-lo, agradecer e seguir pelo bom caminho.

Você frequenta alguma igreja?

Não, quando vou à igreja, vou sozinho. Faço minhas orações em casa, ou sozinho em alguma igreja. Sou católico, mas já fui a outras igrejas, por convite. Acho que todas as religiões são boas. Tenho primos pastores, tenho tias em igrejas evangélicas, mas continuei sendo católico, como todo mundo lá de casa. Mas há coisas muito boas nas outras igrejas, com todo o respeito. Eu acho que temos que respeitar a religião de cada um. E agradecer a Deus, a todo o momento, desde a hora em que levantamos, por estarmos nessa vida.

O que você gosta na música atual?

Na MPB, gosto de Zeca Baleiro, Zé Ramalho, que está fazendo sucesso até hoje, Jorge Versilo, Emílio Santiago. E das cantoras, Ana Carolina, Zizi Possi. Gosto de internacionais também, que fazem sucesso até hoje, como Rod Stewart, Paul McCartney, que é imortal.

Você é saudosista, acha que a música de antigamente era melhor?

Sim. Os antigos influenciaram os sons de hoje, assim como os atores de cinema, a arte em geral, a pintura. Pois antes eram fenômenos. Hoje, não há tanta criação. Quando comparamos, até mesmo os filmes, sempre comentamos que os atores de antes eram melhores. Gosto muito de cinema, ando assistindo bastantes filmes. Hoje, temos tecnologia avançada, há filmes modernos. Mas eu penso que os filmes antigos, como as músicas antigas, eram melhores.

Há coisas boas, temos que ouvir e tentar acompanhar. Mas antigamente, sem tecnologia, era feito na raça. As melodias, as letras, eram melhores. Os atores faziam os papéis mais reais, hoje há dublê. E assim acontece com a música também. A moçada de hoje vê a gente tocando coisas antigas e fala que realmente eram melhores. Tanto o rock n´rol, como a MPB, que ouvem no “Paraíso em Seresta”.

Não há muita divulgação, a TV no Brasil, infelizmente, apresenta apenas aquela rotina. Poucos programas mostram coisas novas. Há muitos cantores bons surgindo, mas a criação é pouca.

O que a música nos ensina?

A música permanece no nosso espírito. Se não houvesse música, a vida seria muito vazia. Todo mundo gosta de vários estilos musicais, mas a música é uma só, a nota é uma só, é universal. Ela traz satisfação. Talvez, uma certa tristeza ao relembrar de algum momento, mas também relembra bons momentos, boas emoções. Desde que levantamos, às vezes de mau humor, ligamos o rádio, há sempre uma música que traz alegria. Ela mexe com todo mundo, até com quem não fala em música. É um dom maravilhoso que Deus nos deu, a vida fica mais cheia. Sem a música a vida seria vazia.

por Cristiane Maria Bindewald