A Sorveteria Spósito, referência em São Sebastião do Paraíso, e para algumas gerações de paraisenses, completa nesta terça-feira, dia23 de março, cento e dez anos. É a empresa mais longeva em atividade no município paraisense. Mais que isso, é uma das mais antigas sorveterias no Brasil, quando se leva em conta ser gerida pela quinta geração de seu fundador, João Spósito.
Juntamente com sua esposa Paschoalina Iodici, os filhos Nanina, Antônio e Josefina, ele chegou a São Sebastião do Paraíso em 1910. Da longa viagem da Itália, em terras brasileiras desembarcou em Santos, morou por algum tempo em Buenos Aires e posteriormente nas cidades paulistas, Sorocaba e Ribeirão Preto.
Na realidade, seu nome de batismo era Alessandro D’Biasi, que deixou seu país para escapar de perseguição política, tão ferrenha, que poderia ter lhe custado a vida e a de seus familiares. Documentos foram atirados ao mar e ele passou a chamar-se João Spósito.
Um ano depois de fixar residência em Paraíso, João Spósito montou uma fábrica de gelo, atividade pioneira, valendo-se de conhecimentos que trouxe da Itália em sua bagagem, de vez que o processo de refrigeração era pouquíssimo conhecido. Isso lhe rendeu clientes na região e até mais distantes, por exemplo, em Ribeirão Preto. As barras eram acondicionadas em caixas de madeira, em meio a sal grosso e serragem de madeira para que não derretessem.
Com criatividade, passou produzir “doces gelados”, envoltos em papel de seda, vieram novos produtos, e assim surgiu a Sorveteria Spósito, sempre lembrada por picolés e massas de sabores inconfundíveis, bomboniere, generosos vinhos, por suas carrocinhas que percorriam Paraíso levando suas delícias geladas, puxadas por tração animal. E por muitos anos foi o próprio João Spósito quem percorria a cidade, o que permanece na memória de parai-senses que vivenciaram aquela época. Prova disso são as constantes postagens com saudosas mensagens em redes sociais.
Alexandre de Souza, o “Neguinho Spósito”, como era carinhosamente chamado, vivenciou boa parte da rica história da Sorveteria. Seus pais mudaram-se para a fazenda, e ele praticamente criado pelos avós desde os oito anos ajudava na sorveteria. Ausentou-se durante algum período depois do serviço militar, quando o então prefeito, Luiz Pimenta Ne-ves, o convidou para trabalhar coordenando a perfuração de poços artesianos. Mudou-se de Paraíso, por quase duas décadas residiu em outras regiões das Minas Gerais, retornando em 1957 quando juntamente com sua mãe Nanina e as irmãs, Meire e Mara passou administrar a Sorveteria Spósito.
Alexandre que participou de outros empreendimentos, no ramo de eletrodomésticos e no segmento de refrigeração, integrou-se de vez à Sorveteria Spósito. E como era prazeroso, entre uma taça e outra de “vaca-amarela”, “vaca-preta” ou spumoni, também degustar sua vivência relatando fatos históricos de Paraíso, e sua bonita e exitosa experiência de vida. Verdadeira enciclopédia, que na lucidez de seus 89 anos nos deixou no Natal de 2019.
A quinta geração de João Spósito através de sua bisneta, artista plástica e musicista Pas-choalina Coelho Souza (Linah Biasi), assumiu a direção da sorveteria. A exemplo de seu pai Alexandre, desde criança ela e seus irmãos vivenciaram o dia a dia do estabelecimento. “Após o falecimento de meu pai, de domingo a domingo estou aqui, o único período que me ausentei foi quando me casei, e passei uma temporada no Rio de Janeiro”.
Gerir um estabelecimento com a tradição da Sorveteria Spósito conforme disse, “é uma responsabilidade muito grande”. Linah salienta “que pretende fazer uma reforma no prédio, dar uma atualizada no visual, mas nosso produto não sofrerá mudanças, mesmo porque as máquinas de hoje não batem nosso sorvete, e a mesma receita de meu bisavô é mantida até hoje, tanto nos picolés, quanto nas massas”.
A Sorveteria Spósito e Paraíso cresceram juntas. O município completa seu bicentenário em outubro, enquanto o tradicional estabelecimento celebra neste mês cento e dez anos. “E olhe que quando a sorveteria foi fundada, Paraíso era uma referencia na região, crescia mais rapidamente que Ribeirão Preto por causa existência das duas linhas férreas, Mogiana e São Paulo e Minas, por onde meu bisavô exportava os blocos gelo para Monte Santo, Casa Branca, Ribeirão”, enfatiza Linah.
Histórias interessantíssimas aconteceram na Sorveteria Spósito, e certamente dariam um livro. Algumas, peculiares, conforme conta Linah, ao recordar-se de fato ocorrido quando seu pai Alexandre “foi servir o então casal de namorados, Senhora Aparícia e Senhor Caetano Lauria, e derramou a bandeja com água e sorvete no colo de um deles. Era o primeiro dia de namoro, e meu pai fez esta estripulia. Não ficaram chateados, deram risadas, e serviu para estreitar o namoro”.
Entre frequentadores assíduos, marcou época Monsenhor Mancini, amigo da família Spósito. “Era de dentro de casa, e tinha uma confiança imensa em meu pai. Ele não sabia o segredo do cofre na casa paroquial, e ligava para minha mãe, pedindo que fosse auxiliá-lo. Era um coração imenso, generoso, rompante, mas somente da boca para fora”, lembra-se Linah.
Na Sorveteria Spósito foram realizados incontáveis encontros políticos. Recebeu governadores do Estado, artistas famosos, dentre eles o “Rei”, Roberto Carlos, juntamente com seu compadre João Flávio Lemos de Morais, que lá esteve na companhia de artistas da Globo. “Vinham tomavam, e levavam,e não raras vezes João Flávio mandava buscar sorvete”, recorda-se.
É comum nos dias de hoje, pessoas levarem sorvetes para outras localidades. “São Paulo, Belo Horizonte, Campinas. Ontem mesmo preparei duas caixas para Franca”, diz Linah.
Por ocasião do centenário da empresa, homenagens foram prestadas pela Câmara Municipal e pela Academia Paraisense de Cultura a Família Spósito, representada pelos diretores Alexandre de Souza e sua esposa, Maria das Mercês.
A Associação Comercial, Industrial, Agropecuária e Serviços de São Sebastião do Paraíso – ACISSP, por seus diretores, funcionários e mais de dois mil associados, por extensão em nome da comunidade paraisense, parabeniza a Sorveteria Spósito, por seus fundadores e gerações que mantiveram e mantém viva esta empresa, parte integrante de nossa história, uma das mais longevas sorveterias no Brasil, sob administração da mesma família.