ENTRETANTO

Entretanto

Por: Renato Zupo | Categoria: Justiça | 01-11-2023 07:38 | 217
Renato Zupo
Renato Zupo Foto: Arquivo

Segurança pública no Brasil
Sempre lutei furiosamente para demonstrar a todos aqueles que trabalham comigo, meus alunos, leitores, ao meu público e até mesmo meus filhos, que na vida há uma regrinha simples, mas inesquecível e infalível: às vezes para fazermos o bem temos que fazer o mal. Nós ajudamos muita gente que, aparentemente, prejudicamos. Isso vai desde deixar seu filho sem celular pra ele aprender a fazer o dever de casa pontualmente até multar um motorista por excesso de velocidade para que ele pare de dirigir de maneira imprudente, pondo em risco a vida dele e a dos outros. É também seguindo a este raciocínio que tomamos uma injeção de medicamento: sentimos dor, mas é para nos curar. Ou seja, impingimos o mal por um bem maior. 

Castigo do bem
A pena é um castigo. Por ela se impõe punição a uma pessoa, como forma de reprimir o crime e atemorizar. Criminosos correm o risco de ser presos e têm medo da punição e do castigo e, por isso, tendem a não prosseguir na prática de crimes, não cometê-los, ou ao menos praticá-los menos escancaradamente. A pena não é um mal pelo mal, não é uma mera retribuição estatal ao crime, castigando o criminoso simplesmente porque ele praticou o crime. Ela tem que intimidar (sim), ela precisa tirar das ruas os maus elementos (sim), as pessoas têm que ter medo da pena (claro que sim), mas ela também protege e ressocializa o criminoso – a pena, por este princípio, protege não somente à sociedade, mas também ao criminoso. E protege o criminoso daquele que pode ser seu pior inimigo: ele mesmo. 

Prender e punir
O ponto aqui é: não podemos abrir mão da justiça punitiva eficiente, rápida e efetiva. É claro que há inúmeros outros fatores que aguçam a violência, sobretudo urbana, nos dias de hoje. Educação, baixa renda, falta de empregos, dissolução familiar, etc… O que digo é que o mais importante, o mais imediato e eficiente, o que resolve mesmo a curto prazo, é prender e punir. Não sou desumano, desalmado e meu raciocínio não é simplista ou preconceituoso. É claro que cadeia tem que socializar ou ressocializar, tem que ser humanizada, tem que respeitar direitos humanos e a dignidade do preso. Temos que combater também desigualdades sociais, é claro. “Também” é a palavra-chave. Não dá pra tentar pagar heranças históricas com o sossego do resto da população por décadas e é necessário interromper urgentemente a escalada de números de violência urbana, de criminalidade e, principalmente, de impunidade.

Eu acredito em cadeia!
A solução passa pela conscientização de todos de que tem que haver cadeia, tem que haver punição e tem que haver castigo. Não é “só isso”, mas é principalmente isso. É por isso que sou um juiz que acredita em cadeia para conter a criminalidade, para conter e melhorar o criminoso. Só isso basta? Claro que não. Mas tem que ter isso. A punição estatal não pode ser mitigada, esmaecida, incorporada a políticas sociais e a ações positivas de reeducação familiar. Isso tudo é importante, com isso atacamos a criminalidade no nascedouro e vamos inibindo ao surgimento de novos bandidos. É importantíssimo, mas não pode condicionar a ação do Estado punitivo. Não se pode impedir a persecução criminal, a apuração do crime e a punição do criminoso, no aguardo de que políticos de ocasião e educadores “revolucionários” tentem mudar o mundo. Nós operadores do Direito é que temos que fazer o trabalho urgente e pesado, e agora.

Brasil em guerra
No Brasil morrem quase 50 mil pessoas por ano vítimas de crimes violentos. Cinquenta mil pessoas! Se bobear, no Afeganistão do Talibã está morrendo menos gente. Na Ucrânia (em Guerra!!!) também há menos vítimas, em média. Vamos raciocinar comigo, por favor: com estes números apavorantes, não dá pra pensar em Direito Penal mínimo, em medidas socioeducativas, em paliativos à prisão – DÁ????

O Rio de Janeiro continua lindo?
Estamos falando de violência urbana aqui, é claro, por conta dos recentes eventos de violência bandoleira no Rio de Janeiro. O Rio é lindo, mas atingiu um estágio de caos impensável e inadmissível em um país que não esteja em guerra, ao menos declarada. O descaso para com as comunidades, a permissividade com a existência de um Estado Paralelo criminoso e os exemplos que vêm de cima, da cúpula do poder oficial, por lá, são estarrecedores e causam o que está se vendo: terror. Facção criminosa fazendo terrorismo, grupo criminoso impondo o medo, às vezes politicamente – e digo isso com bastante cuidado, colocando a palavra “política” no seu sentido, na sua acepção correta, e não estou falando de política partidária, hein? O que é o ideal agora é a justiça ágil, valorizando a polícia e o seu trabalho, assinando em baixo do que pensa e diz o criminalista Klaus Roxin: criminosos inimigos do Estado merecem os rigores da lei e da pena, mas aquela pena que melhora, aquele castigo do bem, rigoroso, mas pedagógico. Com vigor, mas sem raiva e sem sangue nos olhos. Assim deve ser a justiça punitiva estatal.

O dito pelo não dito.
A violência, seja qual for a maneira como ela se manifesta, é sempre uma derrota”. (Jean Paul Sartre, Filósofo francês).
RENATO ZUPO – Magistrado, Juiz de Direito na Comarca de Araxá, Escritor.