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Entretanto

Por: Renato Zupo | Categoria: Cultura | 18-10-2017 11:10 | 1817
Foto: Reprodução

JANÁUBA
Cidade próspera do Vale do São Francisco, no Norte de Minas, próxima de Montes Claros. Conhecida por sua produção açucareira, cachaça, agropastoril, Janaúba agora é o palco do massacre mais cruento da moderna história brasileira. Chamam de “Tragédia”. Para mim, esse termo vem sedimentado no inevitável, no caso fortuito e na força maior. Não é o caso. O governo local cria sérias complicações ao colocar para trabalhar com crianças um doido  esquizofrênico com ideias psicóticas e mania de perseguição. Doidos e crianças não combinam, e não é necessário ter um QI de 130 para intuir o fato. Não é preconceito, é conceito. Mais cedo ou mais tarde iria dar problema sério, a surpresa ficou por conta da carnificina.




MOVIMENTO ANTIMANICOMIAL
Desde os anos 1990 uma vertente respeitável da psicologia e da psiquiatria vem defendendo a abolição dos tratamentos de saúde mental de internação por longos períodos ou sem prazo de término. Para controlar esquizofrênicos, paranoicos e dementes, se utilizam de remédios, de verdadeiras camisas de força químicas, para ir pouco a pouco liberando os pacientes para convívio familiar, dando-lhes alta. O estandarte da libertação dos pacientes psiquiátricos foi progressivamente ganhando força e hoje quase não há mais estabelecimentos hospitalares para doentes mentais, os antigos hospícios ou manicômios, públicos ou privados que sejam.  É bom e é ruim. Recomendo que assistam ao razoável filme brasileiro “Bicho de Sete Cabeças” para verificarem como era a internação psiquiátrica antigamente: longa, sem justificação e diagnóstico seguro, funcionava como uma prisão para pessoas que simplesmente destoavam do padrão social de “normalidade”. Usuários de drogas, doentes perfeitamente tratáveis em meio livre, autistas, homossexuais, eram confinados em hospícios com péssima condição de higiene e por lá ficavam quase por toda a vida. Era preciso fechar essa torneira de injustiças. Mas tem o lado ruim da coisa, que aparece toda vez que um maluco sai matando e horrorizando. Foi assim com o cartunista Glauco, assassinado por um deles. Outro caso: um engenheiro morto dentro de um shopping a golpes de porrete por um doido com mania de perseguição. O ejaculador dos ônibus da Avenida Paulista é também um caso recente. E, agora, o incendiário de Janaúba. Tem doido que só internando. A análise deve ser acurada, caso a caso.




PSICOS
Lido muito com profissionais de saúde mental, preponderantemente psiquiatras e psicólogos. Discuto muito com eles, porque o Direito  é parasitário. Precisa de um hospedeiro sempre, de uma ciência-fonte, para sobreviver. O Direito sem embasamento em outras doutrinas, como a sociologia e a medicina, é estéril e inócuo.  Por isso, ouso estudar esses campos “congruentes” – ramos de pensamento com pontos em comum com a ciência jurídica. E também por isso polemizo com outros especialistas. Não sou leigo na área, e não é qualquer conclusão, qualquer laudo, que me convence. Sobretudo, tenho as ciências psico como intensamente subjetivas. Já atuei em processos com duas ou três conclusões periciais diametralmente opostas: um laudo dizia que o criminoso era absurdamente insano; outro afirmava que ele teatralizava a loucura; um terceiro o descrevia como um perigoso psicopata – doença que, como se sabe, não gera a insanidade e a ausência de discernimento da pessoa. Devemos velar pela qualidade da formação profissional de todos os profissionais que lidam com a saúde e a liberdade dos indivíduos, como de resto com toda a educação. E estarmos prontos para os subjetivismos de uma vida moderna em que, cada vez mais, nada é absoluto.




AÉCIO E O STF
A Constituição Federal diz que o Poder Judiciário somente pode punir a um parlamentar com a concordância do respectivo parlamento, a menos quando preso em flagrante delito. A regra também não vale para a prisão em decorrência de condenação transitada em julgado. Fora isso, qualquer punição penal, seja prisão ou medida cautelar, deve passar pelo crivo do Poder Legislativo. É por isso que a sanção ao Senador Aécio Neves deve aguardar pronunciamento político, não por causas escusas.




O DITO PELO NÃO DITO.
“Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim”. (Fernando Pessoa, poeta português).




RENATO ZUPPO, Magistrado, Escritor.