ELY VIEITEZ LISBOA

As lágrimas de Deus

"De repente pode saltar um índio de dentro do homem". (Paráfrase da afirmação de Graciliano Ramos)
Por: Bruno Félix | Categoria: Cultura | 11-12-2017 17:12 | 6014
Foto: Reprodução

O ingênuo Rousseau prega que o homem é bom, a sociedade o corrompe. O mito do bom selvagem. Hobbes, mais lúcido, diz o contrário: o homem é mau, a sociedade o civiliza. Filosofia, metafísica não se provam. Os adeptos vão discutir as teses ad aeternum. Graciliano Ramos e outros escritores alertam sobre a hipótese de, a qualquer hora, de dentro do homem, um bicho soltar-se, rompendo os grilhões, as prisões do superego, da educação, do ensinado (ou amestrado?). É mais coerente acreditar em Pascal: o mal e o bem coabitam no homem. Todo ser humano é o médico e o monstro.  Na verdade, tem-se a impressão que o homem está involuindo: guerras, maldades e sangue. 
Basta examinar as últimas notícias televisivas ou dos jornais. O mundo foi tomado pela violência, crimes hediondos acontecem, chocando pela sua crueldade. Perderam-se os limites. Até que ponto o homem pode ser tão monstruoso? O que ele anda fazendo com os animais, com o meio ambiente, com todo o universo, para alimentar o Moloch de sua ambição, a obsessão pelo lucro?
A maldade perdeu também suas fronteiras. Com a globalização, os meios de comunicação, o mundo todo virou uma escola maldita que ensina crimes abomináveis. Os monstros se reconhecem cada vez que algum vomita sua sanha contra as mais diversas vítimas, o outro alimenta seu íntimo doentio, aprende. E voltaram a ser moda os crimes passionais, os atiradores insanos que matam todos que estão à sua frente e depois suicidam. A pedofilia, crime abjeto que vicejava nos esgotos da vida, agora grassa como erva maldita nas mais diversas classes sociais. E além de tudo isso, a besta apocalíptica dos tempos modernos: as drogas, verdadeiro  inferno, mal maior da letalidade da degradação humana; e como explicar a corrupção política? O que mais desorienta, aflige, é saber que o caminho não tem volta.   
Acredita-se que Deus, ao dar ao homem o livre arbítrio, Ele o fez senhor dos seus atos. Não interfere, não castiga, às vezes premia. São raros os que sobem no pódio das Olimpíadas Divinas. Ganhar ouro é raridade. Prata e bronze também. Deus deve estar arrependido da Criação. Jamais, em sua onisciência, imaginou que o Homem, criado para grandezas, descesse tão baixo, abastardasse a ele próprio e ao mundo que o rodeia. Transformou-se em uma aberração, vivendo a lei do Amor às avessas. Não há Prozac que chegue para aliviar a grande frustração de Deus, diante da criatura execrável, na qual o Homem vem se transformando. Diante de tais fatos nefandos, o Senhor da Bondade deve chorar lágrimas amargas de arrependimento.




(*) Ely Vieitez Lisboa é escritora.
E-mail: elyvieitez@uol.com.br