Com 29 anos, a jovem Vanessa Soares Silveira já viveu muito mais do que algumas pessoas até mais velhas que ela. É determinada, e seguiu sonhos que a levaram para os Estados Unidos da América. Apaixonada pela Língua Inglesa, desde muito cedo queria falar o idioma e morar em outro país, sempre muito conectada a cultura norte-americana. O que parecia impossível, e que muita gente duvidava que fosse acontecer, tornou-se realidade. Vanessa cresceu, morou cinco anos nos EUA, e voltou para São Sebastião do Paraíso, onde descobriu sua verdadeira vocação e, onde, conforme ela mesma diz, estava a sua verdadeira felicidade. Precisou cruzar fronteiras e passar muita dificuldade até se encontrar, mas é uma experiência que só serviu para torná-la um ser humano iluminado. Bem humorada, a filha do funileiro José Aparecido Silveira e da dona Dinomar Stica Soares, irmã do Alessandro, conta um pouco de como foi essa fase na sua vida, marcada por muitas descobertas, realizações e aprendizado.
Jornal do Sudoeste: Cinco anos morando fora. Como foi isso?
Vanessa Soares Silveira: Quem já teve a experiência de morar fora, é difícil querer ficar, apesar de que em cada fase da sua vida você vai notando certas coisas. Hoje, eu já penso se realmente quero ir embora novamente, passar frio, porque gosto muito do nosso clima tropical, e penso se realmente valeria a pena. O mais difícil para mim, lá fora, é o clima e a comida. Aqui, ao passo que frutas são baratas e gostosas, lá é muito caro e nem é orgânico. Lembro-me da primeira vez que comi morango nos EUA, porque aqui nós não tínhamos muito acesso, lá era abundante. Quando eu fui comer estranhei muito, lembrava a fruta, mas não era saboroso como é aqui. Hoje eu dou muito mais valor a essas coisas do que eu dava antes de ir embora.
Jornal do Sudoeste: Você aprendeu inglês e é fluente na língua. Tem muita facilidade em aprender?
Vanessa Soares Silveira: Eu gosto de saber de tudo um pouco, às vezes eu não aperfeiçoo 100%, como é o caso do inglês que é algo que eu amo e estudo todo dia. Mas eu faço outras coisas como patinar, eu saio, tento fazer algumas manobras, mas não é algo que quero profissionalmente. Porém, o inglês eu quero saber o que posso melhorar, como no português que nós não sabemos todas as palavras.
Jornal do Sudoeste: É uma língua difícil de aprender?
Vanessa Soares Silveira: É uma língua comercial e por isso é mais simplificada, no entanto acaba se tornando um pouco complicada porque uma palavra pode ter várias significações. Quando cheguei aos EUA meu Inglês era quase zero. Eu sabia apenas me apresentar. Desde criança tinha fascinação por morar fora, nos EUA ou Londres. Quando você é criança você não tem essa noção do que é o mundo. Para se ter uma ideia, as crianças americanas, por exemplo, pensam que o Brasil é uma parte dos EUA. Então, desde criança, quando meu pai colocava filmes legendados para eu assistir, aquele idioma se tornou algo que queria muito aprender. Também houve muita influência dos meus pais, que gostam muito de músicas internacionais, tanto que eu amo os Beatles por causa deles. Lembro-me que certa vez peguei a música Imagine, do John Lennon, naqueles rádios de fita, gravava e transcrevia o que eu ouvia, decorando as canções.
Jornal do Sudoeste: Quando você começou aprender de fato?
Vanessa Soares Silveira: Quando cheguei aos 15 anos, foi quando eu fiz o projeto Agente Jovem, e tive uma professora que também dava aula de inglês. Eu ia à lan house e transcrevia as letras das músicas e pedia para ela traduzir para mim, nem pensava em eu mesma fazer isso, mesmo porque queria ter um assunto para conversar com essa professora. Então ela me recomendou uma instituição em Paraíso que tinha uma espécie de programa de intercâmbio e acabou que não era nada daquilo. Meu pai foi comigo na época, ele sempre me apoiou, apesar de ter aqueles que não acreditavam em mim. Tempos depois comecei a fazer curso de inglês, só sabia falar I love you, não sabia falar mais nada. Apesar disso, eu via que não estava evoluindo então decidi parar e estudar por conta. Na época, lembro-me que entrei em um site chamado Live Emo-tion e que a maioria das pessoas era indianas e o que eu aprendi, aprendi com o sotaque indiano e cheguei nos EUA falando assim. Os americanos achavam estranho e eu fiquei chateada com isso, mas decidi que eu iria aprender e falar melhor que eles.
Jornal do Sudoeste: Foi um processo rápido?
Vanessa Soares Silveira: Sim, mas depende muito da pessoa. Em seis meses eu já estava fluente. Lembro que dois anos após estar morando lá, quando conheci meu sogro, ele ficou surpreso com a minha fluência. Aquilo me deixou muito feliz e, como leonina, elevou muito meu ego, mas se não fossem aquelas pessoas que duvidaram de mim, eu estaria estacionada. Conheci brasileiros que moravam por lá há mais de dez anos e não falavam nada da língua. Justamente por isso eu não tinha amizade com brasileiros, primeiro que defasa-va meu aprendizado e segundo porque cheguei a ser assaltada por brasileiro nos EUA, e no Brasil mesmo isso nunca aconteceu. Essa foi uma situação que aconteceu com pessoas que eu achava que eram amigas, e quando você está em um local desconhecido e conhece alguém que fala o mesmo idioma, você se sente em casa e acaba se abrindo demais, o que levou a essa situação.
Jornal do Sudoeste: Como você conseguiu alcançar esse sonho?
Vanessa Soares Silveira: Eu queria muito morar fora e na época me indicaram a Débora da Fisk, que conseguia esses intercâmbios pelo Au Par In America; quando comecei esse processo eu tinha de 18 para 19 anos. À época ela não estava mais fazendo isto, mas eu insisti e ela me ajudou. O Au Par é um programa que te leva para os EUA para trabalhar como babá e também estudar. Quando eu cheguei lá era tudo diferente do que eu imaginava. Eu morava em Napervill, em Illinois, próximo a Chicago e fiquei com essa família por três meses. Eu não entendia o humor americano, tanto que eles sempre diziam don’t take it so personally,ou seja, não leve para o lado pessoal. Eles te falam o que tem que falar e não pensam muito no que a pessoa sente, se vai magoar ou não, ao contrário do brasileiro.
Jornal do Sudoeste: E o que aconteceu depois?
Vanessa Soares Silveira: Depois disso eu fui para Virginia, na cidade de Ashiburn e fiquei com essa família nove meses. Eles tinham quatro filhos que eu tomava conta, um deles tinha down e eu nunca tinha trabalhado com crianças portadoras desta síndrome, mas foi uma experiência maravilhosa. Eu aprendi muito nessa fase. Mas quando completa um ano do programa, você decide se quer continuar com a mesma família, mudar para outra família ou voltar para o seu país, eu decidi seguir em frente. Então fui para Connecticut, para a cidade de Riverside, foi a família que eu fiquei por mais tempo.
Jornal do Sudoeste: Como foram seus estudos?
Vanessa Soares Silveira: Todo o lugar que eu morava, estudava, e depois transferia para outra cidade. Estudei língua inglesa e lá o processo é diferente daqui. Nos EUA eles têm o que é chamado de credit classes, ou seja, as classes que você tem crédito são muito caras, mas são mais reconhecidas. No Brasil só valem esses certificados e a única que eu tinha era Álgebra, as outras eu fiz sem o credit para pagar mais barato, isso porque estudar nos EUA é muito caro. Na época eram U$ 500 por três meses. Lá, se eu fosse arrumar um emprego, essas certificações serviriam, mas aqui só valem as com o credit.
Jornal do Sudoeste: Houve uma virada na sua vida nesse processo, como foi isso?
Vanessa Soares Silveira: Sim. Nesse meio de tempo eu conheci meu ex-marido, nos casamos e eu fui morar em Manhat-tan, Nova York. Ele era diretor de filme 3D. Nesse período eu vivi uma vida muito surreal, mas fazia parte do meu mundo, estava tão acostumada a conhecer astros e estrelas de Hollywood que para mim tanto fazia, eu não dava muita importância a isso. Hoje eu penso nisso e vejo o quão surreal foi essa época.
Jornal do Sudoeste: Mas você voltou para Paraíso, por que isso aconteceu?
Vanessa Soares Silveira: Eu voltei em março de 2015. Eu costumo dizer que virei gente lá, comecei a me soltar e ser mais extrovertida naquele país, por isso é muito difícil ainda me expressar em português. Sobre voltar, eu tinha tudo materialmente, mas não estava feliz, havia um vazio dentro de mim. Quando eu voltei para o Brasil, no outro dia eu estava dando aula. Fui melhorando, aprendendo e descobri, como que por acaso, que eu queria ser professora. Hoje, não sei o que faria se não fosse professora, é algo que eu amo fazer. Gosto de poder passar tudo o que vivenciei nos EUA para os meus alunos, para que quando ele chegarem lá passem menos dificuldades que eu. O que passei no começo foi sofrido, mas me ajudou a ser quem eu sou hoje.
Jornal do Sudoeste: O que você sentiu quando finalmente conseguiu chegar aos EUA?
Vanessa Soares Silveira: Quando eu cheguei me senti literalmente um peixe fora d’água. Nunca tinha viajado, muito menos de avião, foi muito cansativo e surreal. Algo que foi bom é que quando eu cheguei lá, descobri uma pessoa que não sabia que existia. Aqui eu era uma pessoa miudinha, não conversava com ninguém, então decidi ser uma pessoa diferente. Sobre estar lá, recordo-me que quando cheguei era um calor insuportável, eu mal respirava. Quando cheguei ao hotel e entrei no banheiro, havia uma banheira e um chuveiro sobre essa banheira. Fui tomar banho, não conseguia ligar o chuveiro e até conseguir colocar água nessa banheira para tomar um banho, mas chorei muito, não queria acreditar que a vida seria tão difícil assim. Para dormir foi outro processo, comi muito mal e no outro dia acordei muito gripada. Não foi fácil.
Jornal do Sudoeste: Os Estado Unidos era o que você esperava?
Vanessa Soares Silveira: Não era nada do que você imagina e tudo é muito diferente. Os cafés da manhã são muito reforçados, não há almoço, então de manhã é bacon, ovo, e manteiga de amendoim, que é muito rica em proteína. O waffle, que quando você é criança e vê na TV e tem uma ideia completamente diferente, foi outra decepção, então eu tive a ideia de fazer bolinhos de chuva usando aquela massa, mas era muito trabalhoso. Todo o que você vê é muito ilusório. Outra decepção foi o churrasco, que é muito comum nos fins de semana e era apenas linguiça e hambúrguer. Enfim, uma coisa que eu gostava muito era a pontualidade, ninguém chegava de repente na sua casa, era tudo agendado.
Jornal do Sudoeste: Quando foi que você realmente viu que estava feliz?
Vanessa Soares Silveira: Quando eu voltei para o Brasil e descobri a minha profissão. Eu tinha um sketchup onde coloca fotos de tudo o que eu queria conquistar. Quando isso aconteceu, senti-me muito vazia. Mas quando voltei e me descobri professora, vi que a felicidade estava aqui do meu lado. Porém, poder morar fora foi uma experiência muito boa. Se isso não tivesse acontecido, eu não estaria aqui hoje. Temos que ver o lado bom de tudo e acolher aquele momento. A felicidade está em você, e não nas coisas. Mas temos que sofrer para aprender isso. Hoje, eu já sei agradecer mais a tudo o que eu tenho.
Jornal do Sudoeste: Levou tempo para se adaptar a essa nova língua?
Vanessa Soares Silveira: Eu levei cerca de seis meses, mas isso depende muito da pessoa. Havia momentos que era muito cansativo, minha cabeça doía e eu não queria continuar falando naquela língua, mas era normal porque você está trabalhando seu cérebro de uma maneira que nunca trabalhou antes e eu ainda estava aprendendo. O momento que eu descobri que estava fluente foi quando percebi que já estava pensando em Inglês e foi uma festa pra mim, até então eu não tinha parado para reparar que pensava naquele idioma. Fiquei muito feliz, não vou esquecer esse dia, foi muito importante. Eu digo que se você quer falar fluentemente em pouco tempo um idioma, você precisa desse processo de imersão. O que me ajudou muito também é que eu fazia ESL – English as a Second Language, e estudava também. Lá o processo de aprender a gramática da língua é muito leve, ao contrário daqui que impõe muitas regras e acaba atrapalhando no aprendizado. Até hoje eu estudo muito, porque senão você “perde” a língua.
Jornal do Sudoeste: Qual conselho você daria para quem tem esse sonho de morar fora?
Vanessa Soares Silveira: Eu penso que se você quer alguma coisa, você tem que fazer o seu melhor para conseguir, se você não faz, é porque você não quer. Na época eu consegui juntar R$ 6 mil para essa viagem. Todo o dinheirinho que eu ganhava eu juntava, sempre foi assim, é algo que meu pai tinha me ensinado. Ele foi o único que achou que eu iria conseguir, as pessoas não eram muito de por fé em mim, e isso me motivou, eu fiz de tudo para realizar esse sonho. Muitas pessoas ficam somente no pensamento, mas não agem porque é difícil.
Jornal do Sudoeste: Sobre a cultura, o povo americano é receptível?
Vanessa Soares Silveira: Depende do quão bem você conhece a pessoa. Se não conhece, o máximo do contato que você vai ter é um aperto de mão. Eu entranhei demais quando cheguei aqui, porque o brasileiro é mais caloroso e tem isso de abraçar e dar beijo. Lá não, eles não são assim, acho isso muito estranho e acabei pegando um pouco desse costume. Foram cinco anos emergida naquela realidade. Além disso, é um povo muito reservado e que não gosta de ficar jogando conversa fora, é aquela expressão time is money, tempo é dinheiro. Porém, no subúrbio, as pessoas já são mais descontraídas, ao contrário da cidade grande. Eles também são muito racistas e o preconceito religioso também é muito forte, além de serem muito impacientes.
Jornal do Sudoeste: Qual o balanço que você faz de toda essa fase que você viveu?
Vanessa Soares Silveira: Eu aprendi que cada momento é único, sendo bom ou ruim, irá te ajudar se você souber ver desta maneira. Vinte e nove anos, quando eu era criança parecia ser a idade de uma pessoa muito velha, hoje, aos 29, não acho isso, é muito jovem. A gente nunca aprende tudo e sempre acha que quando completar 18 anos vai saber, e não é assim, você faz 20, 30, 40 anos e não é nada disso. Se eu ler essa entrevista daqui 10 anos, será um pensamento totalmente diferente. Eu aprendi que tudo se transforma, tudo se renova e tudo passa e você tem que aproveitar o agora, como dizem, existem dois dias que você não pode fazer nada, é o ontem e o amanhã.
Jornal do Sudoeste: O que fica de lição?
Vanessa Soares Silveira: Para quem tem interesse de ir para fora, pesquisar bem o que quer e que tenha a coragem, que é mais essencial que saber o idioma. E saber também que lá será difícil e que a felicidade está em você. Eu fui a uma cachoeira, aqui em Paraíso, e me diverti muito mais que em um parque na Disney, mas isso porque eu estava com as pessoas certas. Às vezes a gente pensa que o muito trará a felicidade e às vezes uma flor pode proporcionar isso muito mais que uma viagem para o exterior, mas cada um tem um pensamento. Tem um escritor americano, o Wayne Dyer, que diz o seguinte: if you change the way you look at things, the things you look at changes – se você muda a maneira de ver as coisas, as coisas que você vê mudam.