O Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, numa sentença proferida pelo juiz relator Armando Freire, confirmou no dia 2 de maio, decisão proferida por juiz da 2.ª Vara da Comarca de São Sebastião do Paraíso, na ação de nulidade cambial proposta pelo Sindicato Rural (Sindpar), contra Paulo Machado de Pádua. O voto do juiz relator foi acompanhado na íntegra pelos demais componentes da turma julgadora.
A questão se arrastava há algum tempo e foi originada a partir de um empréstimo no valor de R$8 mil tomado pelo Sindpar junto a Paulo Machado. Os juros, segundo alegaram diretores do Sindpar eram cobrados a razão de 12 a 15 por cento, o que elevou a dívida à quantia de R$55 mil, desmembrada em duas promissórias de R$27.500,00. De acordo com o advogado Adilson Salviano de Paula, apesar de pagamentos efetuados a dívida crescia assustadoramente e se tornou inviável o seu pagamento, tanto é que o título foi protestado, o que motivou o Sindpar ajuizar a ação.
Nela, além do pedido de sustação do protesto o Sindpar alegou que os juros cobrados feria a lei de usura, pois os juros eram "extensivos", e foram capitalizados, o que popularmente é conhecido como "cobrança de juro sobre juro". Houve ganho de causa para o Sindipar.
Ao apelar da sentença ao Tribunal de Alçada, Paulo Machado alegou que não havia prova de "agiotagem", as provas documental e testemunha nada comprovaram e que o juiz decidiu além do pedido feito pelo Sindpar.
Para o juiz relator Armando Freire, "o bom senso diz que a lei não deve estar dis-sociada de lógica da vida. A lei não é, apenas, um elemento normativo, criado aleatoriamente. O relator ao traçar comparações, afirma que no caso de agiotagem, quem a pratica "sabe que está agindo ilegalmente", e por isso "o agiota se cerca de garantias que impeçam a caracterização do ilícito, como, por exemplo, trocar um cheque pelo anterior, acrescido dos juros cobrados, tentando, sempre, caracterizar uma operação mercantil, desvinculada da causa subja-cente. Tenta, sempre, fazer crer que o último cheque é o valor original do empréstimo".
"Não se nega que a promissória é um título cambial, protegido pelas características de literalidade, autonomia, abstração e inoponibilidade das exceções, salienta o juiz, para em seguida afirmar que "tais garantias existem para proteger e agilizar a prática comercial, mas não servem para acobertar ilegalidades.
Ao argumento de Paulo Machado de que diretores do Sindpar assinaram a nota promissória, livre de coação e aceitaram o valor nela estampado, o juiz relator rebate que, "não é menos verdade, também, que, se o valor estampado traz embutidos juros acima do que é legalmente permitido, há uma nulidade na origem, que deve ser coibida".
O relator reconheceu o direito de Paulo Machado "receber a quantia que emprestou, devidamente corrigida, acrescida dos juros legais, sob pena de se cometer outro ilícito, aco-bertando enriquecimento ilícito, o que é vedado em lei".
Entretanto, reconheceu que a nota promissória no valor de R$27.500,00 "é fruto de renegociação de dívida, trazendo a incidência de juros acima dos limites legais", o que tornou nulo o ato celebrado entre credor e devedor. "Não se pode encobrir a prática de ato ilegal, sob o manto da literalidade, abstração e autonomia dos títulos cambiais", conclui.