Prédio que aguardava tombamento foi demolido

Por: Redação | Categoria: Arquivo | 27-07-2003 00:00 | 785
Foto:

Um fato ocorrido durante a semana anterior tomou de tristeza e revolta descendentes de imigrantes italianos em São Sebastião do Paraíso. Trata-se da demolição do antigo prédio da Sociedade Italiana, que o vereador Waldir Marcolini pretendia tornar patrimônio histórico do município. "Eles não têm amor ao passado, não tem sentimento, se tivessem sensibilidade, não fariam isso. Queria que sentissem na pele se demolissem uma parte da Santa Casa que eles construíram com esforço e suor como o nosso povo fez. Acabaram com a história da sociedade italiana," afirma.
A iniciativa de tombar o casarão surgiu quando um amigo de Marcolini que mora em Campinas, José Olavo Nogueira, disse que em São Simão, no Estado de São Paulo acabaram demolindo o prédio de um antigo clube semelhante ao existente em Paraíso. "Imediatamente eu procurei intervir, com medo de que acontecesse o mesmo aqui. Entrei com o pedido para a prefeita há cerca de um mês e fui falar com o advogado Luiz Ferreira, para ver se ele poderia apressar o tombamento o mais rápido possível," conta.
Waldir fica emocionado ao falar dos ancestrais que ajudaram o Brasil a progredir. Sua revolta é maior quando diz que a diretoria da Santa Casa ao tomar conhecimento dos seus planos, apressou-se em demolir a construção. "Eu tinha pedido o tombamento do prédio e tencionava pedir o apoio da Embaixada Italiana, que diversas vezes, contribuiu com material e reforma de vários prédios pelo interior de 
São Paulo," salienta. "Usaram de pura maldade"
O vereador diz que a atitude da diretoria da entidade reflete pura maldade. "Isso é inveja de pessoas que não têm o mínimo de amor ao passado. Primeiro recebi uma notícia que tinha uma escada lá, fui correndo ver e me disseram que eram uma reforma, que não iam demolir o casarão. Liguei para o Dr. Glauco, que é o diretor da Santa Casa e pedi para não que ele não deixasse demolir o prédio e ele afirmou que não ia permitir," explica.
"Depois de uma semana, fui chamado novamente. Os operários já estavam derrubando o telhado e disseram que só podiam parar com ordem da diretoria da Santa Casa. Liguei novamente para o Dr. Glauco, procurei diversos diretores e eles mandaram dizer que não estavam. E por fim, meteram a picareta no antigo Clube da Sociedade Italiana. Não levaram em conta as benfeitorias que fiz em prol da Santa Casa no passado. Doei aparelhos de hemodiálise, reformei as salas onde foram instaladas. Através de um amigo que eu tinha na LBA, a Santa Casa recebeu cozinha e lavanderia completa que funcionam até hoje. Doei um Raio X pequeno, uma aparelhagem completa de otorrinolaringologia. Agora eu pergunto, por que não demoliram antes? Foi só eu pedir o tombamento e eles correram para derrubar o prédio," questiona indignado. 
Satisfação 
Contudo, Waldir Marcolini não esperou que a diretoria da Santa Casa se manifestasse. O vereador procurou o diretor clínico da entidade, o médico Glauco Figueiredo e cobrou dele a promessa de que o prédio não seria demolido. "Ele me disse que infelizmente não pôde fazer nada, porque o conselho se reuniu duas vezes e resolveu demolir," conta.
O vereador questionou ainda o porquê da decisão justamente quando há menos de um mês ele havia entrado com o pedido de tombamento. "Disseram que estavam passando por dificuldades, por isso fizeram a demolição. Para vender o terreno. É o mesmo que dar uma punhalada no peito de todo descendente de italiano que mora em Paraíso. Eu espero que eles não consigam vender o imóvel tão cedo!," concluiu.


Conheça um pouco da História do Antigo Pronto Socorro
Em Paraíso por volta de 1892, começaram a chegar imigrantes italianos para trabalhar nas fazendas de café. Primeiramente ficaram na zona rural, vindo para a cidade a fim de se empregar nos comércios. Por não terem aonde se divertir nos finais de semana, posto que não eram aceitos pela alta sociedade paraisense, pre-conceituosa em relação aos empregados das fazendas, reuniram-se e decidiram fundar o Clube Sociedade Italiana. "Fizeram um prédio espaçoso na Rua Pimenta de Pádua, as cortinas eram de veludo importado da Itália, havia um salão enorme onde se realizavam vários jogos diferentes. Eles iam até lá somente aos domingo porque trabalhavam até aos sábados. Todos os imigrantes freqüentavam o local e o clube lotava mais que o da alta roda da cidade," conta o vereador.
Marcolini acrescenta ter presenciado algumas das reuniões dos operários italianos quando criança. "Eu via aquela animação dos imigrantes brincando e cantando com uma alegria incrível. Mas, quando em 1939, veio a Segunda Guerra Mundial, o Brasil ficou numa situação difícil porque o Mussolini, que era presidente da Itália na época, se aliou ao Hitler. Então o presidente resolveu fechar todos os clubes italianos, e proibiu os imigrantes de ouvir rádio que transmitia as notícias da Itália. Ficaram impedidos de freqüentar o clube e fazer reuniões, sob risco de prisão. O meu avô foi preso porque estava jogando "bochas" com os amigos. Por sinal, o delegado que o levou era pai do Geraldo Fróes. Enfim, por ordem de Getúlio Vargas, a sociedade italiana foi fechada," diz.
Marcolini nasceu em São Sebastião do Paraíso, mas ao ficar órfão de pai aos 7 anos de idade, foi morar no Rio de Janeiro em busca de formação escolar. "Voltei para cá em 1976 e ao ver o prédio da Sociedade Italiana abandonado, achei que Paraíso precisava de um Pronto Socorro, como já existia no Rio de Janeiro. O prédio tinha sido doado pelo Governo para a Santa Casa, que cedeu gratuitamente par montar o PS. À noite, não havia plantão no hospital. Até o médico se vestir, tirar o carro e ir fazer o atendimento, às vezes o doente morria. Era absurdo uma cidade como Paraíso não ter plantão 24 horas. Por isso contratei 7 médicos e comprei uma ambulância numa atitude inédita em Paraíso. Finalmente o prédio que os italianos fizeram com tanto carinho e amor estava servindo para a população e lá ficou funcionando durante 7 anos," afirma.
O antecessor na Prefeitura à Waldir Marcolini, Alípio Mumic havia começado a construir o prédio onde hoje funciona o Pronto Socorro. "Alípio levantou as paredes e fez toda a infra-estrutura, só não cobriu porque não deu tempo. Eu achei que era prudente acabar o prédio que ele nos iniciou. Contratei uma firma para fazer o acabamento e transferi o atendimento para lá. O prédio da sociedade italiana era pequeno, os doentes não podiam dormir lá por falta de leitos, não tinha Raio-X. No novo prédio, ficou melhor. A Prefeitura foi usando o antigo clube para alguns serviços médicos, por exemplo, vacinação infantil, enfim, ele não foi totalmente desativado," explica.
E assim foi, até que em 1988, o casarão onde outrora funcionara o clube fechou as portas por completo. "Nós, descendentes de italianos, temos muito amor à nossa Itália. Somos muito sentimentais. O que São Paulo é hoje, deve-se aos italianos. Eu como vereador, achei por bem fazer o tombamento, mas enfim, é assim que termina a história dos imigrantes italianos em Paraíso, sem a menor consideração e respeito," concluiu.