CURA GAY (1)
Lamento profundamente ter que explicar o óbvio, mas o alvoroço que a classe artística e jornalística causou ao questionar decisão de colega magistrado sobre a denominada “cura gay” merece esclarecimentos. Aliás, a ira por trás das críticas injustas parece-me tão descabida que somente pode vir: a) da ignorância, ou b) da falta de responsabilidade, ou c) da maldade em deformar opiniões e contribuir para o caos social. Escolha, leitor, qual alternativa mais se adéqua aos barulhentos que não entenderam e mesmo assim jogaram pedras.
CURA GAY (2)
O colega magistrado não conhece e nem precisa conhecer os meandros da psicanálise. Não detém conhecimento enciclopédico. Não possui capacitação profissional para dizer se existe ou não cura gay, ou se homossexualismo é doença. Ele não julgou isto. Pelo amor de Deus, só em um país com 73% de analfabetos funcionais em sua população adulta se poderia fazer tão equivocada “leitura” da decisão judicial. O colega se restringiu ao tratamento jurídico da questão que lhe foi posta, como era seu dever: um grupo de psicólogos lhe pediu para não mais ser obrigado pelo Conselho Federal de Psicologia a deixar de realizar tratamentos psicoterápicos em pacientes insatisfeitos com sua orientação ou tendência homossexual. Em bom e claro português, os psicólogos pediram para não serem obrigados à abstenção do tratamento. O tema era tabu até então. Havia a proibição, e pronto. Como ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer nada, senão em virtude da lei (é o que determina a Constituição Federal), o juiz simplesmente permitiu aos autores da ação o livre exercício profissional ministrado a homossexuais insatisfeitos com esta tendência. Pronto! Foi isso.
CURA GAY (3)
Portanto, a decisão judicial não disse que homossexualismo é doença, não disse que há tratamento para isso ou que o tratamento é correto. Não entrou nestes detalhes, não era sua praia e nem precisava, porque isso não foi pedido. A própria existência da polêmica dentro da psicanálise demonstra que há, sim, entendimentos antagônicos sobre a “cura gay” e há correntes da psicanálise que admitem a possibilidade de tratamento da tendência homossexual como um desvio de comportamento que pode ser remediado, atenuado, arrefecido. É uma linha correta de pensamento? Não sei, e o juiz da causa também não, não é a nossa ciência, mas me parece antidemocrático e antirrepublicano não se permitir que se pense e se aja conforme este pensamento. Dizer que existe terapêutica para homossexuais insatisfeitos com esta sua condição não significa ofender aqueles outros gays que estão acomodados em suas preferências sexuais. A situação é tão clara que me revolta muito seja deturpada de forma tão nociva por deformadores de opinião.
CURA GAY (4)
Conheço inúmeros homossexuais que me relataram sua insatisfação com esta sua condição. Dizem-me isso claramente. Gostariam de não ser gays. Toda a carga ultraconservadora da sociedade, todo o machismo familiar, o fato de estarem presos a um corpo que não lhes agrada, tudo isso lhes impõe intenso sofrimento. Vamos privar deles o direito de procurar uma mínima chance psicoterápica de lidar com o problema, somente porque é politicamente incorreto tratar o homossexualismo como “problema”? Não é humano, não é cristão, fechar as portas da ciência, tolher esperanças remotas de modificação de tendências homoeróticas não pretendidas, ao argumento asqueroso de que o tratamento psicanalítico do tema é antiético. Antiético é o profissional de saúde mental não se preocupar com o bem estar do paciente.
O DITO PELO NÃO DITO.
“Nunca fui capaz de responder `a grande pergunta: ´O que uma mulher quer?” (Sigmund Freud, o pai da psicanálise).
RENATO ZUPPO, Magistrado, Escritor.