Esta crônica inicia uma série concebida para descrever elementos da história da literatura produzida por autores da cidade de São Sebastião do Paraíso, no Sudoeste Mineiro, focalizando, nessa publicação, a obra do poeta e professor José Soares Junior. A respeito de sua trajetória no mundo das letras, localizamos um soneto decassílabo de sua autoria, intitulado Morena, publicado no primeiro jornal da cidade, A Voz do Paraíso, em 7 de setembro de 1901. Trata-se de um dos mais antigos registros que tivemos a oportunidade de acessar e que confirma, de certo modo, o destaque dado à sua sensibilidade poética pelo escritor José de Souza Soares, no livro São Sebastião do Paraíso e sua História, publicado em 1945.
O objetivo da série que hoje iniciamos é retornar às raízes mais distantes da cultura local, mostrando seus profundos laços com os valores universais da arte literária. Esses dois autores – o escritor José de Souza Soares e o poeta José Soares Júnior – são membros da grande Família Soares, que participou ativamente, dos primeiros momentos de construção do arraial, erguido, pouco a pouco, no entorno da Capela consagrada a São Sebastião, erguida no patrimônio doado à Igreja Católica, pela Família Antunes, em escritura datada de 25 de outubro de 1821.
O poeta José Soares Júnior recebeu formação escolar no ambiente doméstico, com lições ministradas pelos seus familiares, como era muito usual na época, em se tratando das famílias mais abastadas e com cultura literária. Esse poeta pioneiro da literatura local também se fez professor e ensinou muitos outros jovens da cidade. Como afirma José de Souza Soares, foi ele o seu primeiro mestre, proferindo lições suficientes para iniciar o ensino secundário em São Paulo.
Para finalizar, cumpre registar que, ainda no início do século XX, José Soares Junior deixou Paraíso e fixou residência em Batatais, onde exerceu o magistério num tradicional colégio dessa vizinha cidade paulista e atuou como jornalista. A respeito de sua obra poética, transcrevermos abaixo alguns sonetos de sua autoria.
A meu pai
Honrado velho e meu melhor amigo,
Se ora descansas desta vida, escuta:
No fragor, nos embates desta luta,
Sinto que seus preceitos vão comigo.
O valor que me vem ante o perigo,
Vem-me da tua previdência arguta,
Vida em fora sentindo-me contigo,
Mas me avigora contra a sorte bruta.
E quando alcanço aqui qualquer vitória,
Contra o mal, que constante nos atrai,
Contigo, então, partilho a minha glória.
É que te vejo lá no ceu, gozando
Alma de eleito, o filho abençoado,
Espírito de amor, de honrado pai!
A minha mãe
Precioso escrínio de virtudes raras,
Alma que tanto amou, aceita agora,
O preito deste que tu tanto amaras
E teus carinhos mereceu outrora.
Como o clarão, ao longe, de uma aurora,
Vem-me à lembrança o teu semblante. Caras
Reminiscências que teu filho adora,
Como o raio de sol em manhãs claras.
A luz do sol nascente alegra e aquece
E como o sol nascente me aparece,
O teu perfil de santa, mãe querida!
E no céu onde estás, ó alma eleita,
Os pobres versos de teu filho, aceita
Homenagem de amor, que te é devida.