A fisioterapeuta e pós-graduada em geriatria, Natália da Silva Moreira, é uma profissional que dedica a sua vida ao bem-estar de pessoas idosas. Desde pequena, sempre teve certeza de que queria ter uma formação voltada para cuidar de pessoas mais velhas, vontade esta que nasceu no amor do avô materno, o senhor Galdino Filho. Após o falecimento do avô, Natália transformou o luto em uma ação beneficente que vem ajudando diversos idosos carentes em São Sebastião do Paraíso: fundou o Grupo de Apoio a Pessoa Idosa Galdino Filho. Filha do produtor rural Galvão e da dona Letícia, que trabalhou muito anos no Inpar, Natália tem uma irmã mais nova, também chamada Letícia. Hoje, aos 32 anos, e há 10 realizando este trabalho de fisioterapia domiciliar para a pessoa idosa, é sorridente que ela lembra a importância de se dar carinho e atenção àqueles que dedicaram a vida toda ao crescimento do país.
Jornal do Sudoeste: Como nasceu esse seu amor por cuidar da pessoa idosa?
N.S.M.: Outubro é o Mês do Idoso e da Fisioterapia, e trabalho com a geriatria desde que me formei. Toda a minha infância foi com o meu avô, o Galdino, é de onde nasceu esse meu amor por cuidar de pessoa idosa. Ele foi meu exemplo de vida. Meu avô era bastante conhecido na internet, tinha uma página no Facebook que se chamava “Galdino Filho”, e eu e minha irmã postávamos tudo o que ele falava, fazia sucesso. Foi ele quem me criou e fazia de um tudo para mim e minha irmã. Faleceu no ano passado.
Jornal do Sudoeste: Então você quis tornar todo esse carinho que recebeu em sua profissão?
N.S.M.: Foi desta criação que nasceu minha paixão pela geriatria. Comecei a estudar fisioterapia em Batatais, em 2004, e assim que eu me formei fiz minha pós-graduação em geriatria. Já faz 10 anos que eu me formei e trabalho nesta área. Foi uma fase muito sofrida durante esta formação, porque eu trabalhava o dia todo, pegava o ônibus e viajava para poder estudar. Eu tinha somente a madrugada e o fim de semana para poder estudar o conteúdo, porque não tinha tempo, mas consegui ir levando e me formei.
Jornal do Sudoeste: Você chegou ir embora por causa dos estudos?
N.S.M.: Sim, mas durante três anos e meio eu vivi esta rotina de ir e voltar. Depois me mudei para Batatais por causa do estágio. Foi outro sofrimento, porque eu não podia trabalhar já que o estágio era integral. Durante esse tempo morei em Batatais, São Paulo e Passos, porque tinha que passar por essas cidades por conta do estágio. Estagiei no A.C. Camargo, que é o Hospital do Câncer de São Paulo e na Santa Casa de Passos. Depois que me formei, voltei para Paraíso e comecei a trabalhar com ginástica laboral no Coolapa, durante dois anos, e após já comecei com o trabalho que realizo hoje que é de terapia domiciliar com a pessoa idosa. Montei um escritório, mas só para resolver alguns assuntos, porque fico transitando de paciente a paciente.
Jornal do Sudoeste: Qual a importância deste trabalho que você realiza?
N.S.M.: Muitas pessoas ainda questionam a necessidade do idoso se movimentar, já que ele não será como antes, então, infelizmente, há esta perspectiva. Porém, o idoso não pode ser encarado desta forma, nós precisamos dar qualidade de vida a ele, para que consiga fazer suas atividades do dia a dia com mais facilidade, já que existe a restrição da própria idade. A terapia domiciliar é uma facilidade para quem cuida, já que não precisa se deslocar com aquele idoso, e também para a pessoa idosa, que geralmente é mais recatada e gosta de ficar no seu cantinho. É importante realizar esse tratamento, a pessoa idosa não pode ficar só sentada e deitada, é horrível tanto para a questão motora, quanto para a própria questão respiratória.
Jornal do Sudoeste: Como fica seu coração nesses atendimentos?
N.S.M.: No começo, quando me formei, sofria um pouco quando perdia um paciente. Durante os atendimentos você se apega muito a eles, e eu faço esse atendimento de duas a três vezes por semana. Mas com o passar do tempo, fui me acostumando, porque isso é algo natural. Esses idosos são como uma força de vida para mim, porque quando eu chego aos locais é como se eu me renovasse. É um trabalho que eu gosto muito e me encanto por tudo o que eles falam, pelas histórias que contam, nós brincamos, contamos piadas, fazemos os exercícios e é algo que é bom para eles e para mim.
Jornal do Sudoeste: Existe algum momento que te marcou muito ao longo destes 10 anos de profissão?
N.S.M.: São muitas histórias, mas uma em especial foi a minha primeira paciente, que veio a falecer tempos depois. Era uma senhora que tinha duas filhas e, por morar sozinha, não tinha muita atenção. Ela sempre me ligava para conversar comigo nos fins de semana, e sempre arrumava uma dor para que eu pudesse ir até ela, mas era algo mais psicológico, para ter a minha companhia. Quando eu recebi a notícia de que ela havia falecido, eu estava em viagem, chorei muito por esta perda. Foi depois dela que e aprendi preservar um pouco mais esse lado sentimental, porque é algo que eu vou passar por muito tempo, é o meu trabalho.
Jornal do Sudoeste: Ainda há esta questão do abandono do idoso?
N.S.M.: Sim, é por isso que a gente se apega muito, tanto eles a mim, quanto eu a eles. Talvez isto aconteça por causa desta ligação muito forte que eu tive com o meu avô. Há famílias que não, mas a grande maioria só dá a atenção do que se diz respeito à assistência médica, remédio, cuidador, mas a pessoa mesmo não participa da vida do idoso. Eu sinto que a pessoa idosa sente muito por isto, eles querem carinho, atenção. E é aí que eles se apegam muito em quem cuida deles.
Jornal do Sudoeste: É fundamental que a família dê esse carinho e atenção ao seu idoso...
N.S.M.: Sim. A família deveria dar muita atenção, não somente ao pai, mãe e avô, mas também aos tios. Vejo também muitos idosos que não se casaram ou não tiveram filhos e são os sobrinhos que cuidam. É importante que a família não veja a pessoa idosa como um “móvel de casa”, que se deixa no canto e se contenta apenas com alimentar esse idoso. É preciso dar mais qualidade de vida a eles, não importa se esse idoso vai poder voltar a andar ou não como antes. O que podemos fazer para melhorar a vida desta pessoa? É sempre mantê-lo ocupado, para ele sentir que há atenção e que a família se importa com a saúde dele. A família deveria ter mais esse carinho, afinal esse idoso trabalhou por tantos anos. A maioria que eu trato são pessoas que trabalharam na zona rural e, então, chegam nesta fase da vida e ficam sentadas no sofá, isto é horrível. É importante que ele tenha uma atividade para que eles não apenas se sintam úteis, mas também para dar mais vida a este idoso.
Jornal do Sudoeste: É importante começar esse tratamento fisioterápico mais cedo?
N.S.M.: Sim, é muito importante. Há aqueles que procuram somente quando não há muito a ser feito e já estão debilitados e não conseguem sequer sentar sozinhos e deixam para procurar um profissional naquela fase que já está crônica. É importante fazer este atendimento desde o início, assim que o idoso começar a perceber que existe uma dificuldade no caminhar, de se equilibrar ou até mesmo quando fizer uma cirurgia e necessitar deste tratamento, que é fundamental começar o quanto antes e não deixar essas dificuldades evoluírem, porque depois para recuperar é muito difícil.
Jornal do Sudoeste: Você acredita que todos deveriam conviver com uma pessoa idosa?
N.S.M.: Sim, sou muito suspeita para falar. Eu fico encantada com esses velhinhos, tanto que após o falecimento do meu avô eu montei um grupo de apoio ao idoso carente, que leva o nome do meu avô Galdino. São idosos que moram em suas casas, mas normalmente não têm família ou idoso que está acamado, então fornecemos Nutrem, fralda geriátrica, entre outras coisas que eles precisam. O grupo se chama “Grupo de Apoio à Pessoa Idosa “Galdino Filho”. Não temos um local fixo, mas temos a página no Facebook e um grupo no WhatsApp.
Jornal do Sudoeste: Como é formado este grupo e como funciona?
N.S.M.: O grupo é composto por pessoas que se identificam e gostam de fazer serviço voluntário. Eu cadastro todas essas pessoas e idosos que necessitam de ajuda. Nós ajudamos com cesta-básica e outras coisas que eles precisarem. Às vezes esses idosos passam por necessidade porque vivem de aluguel e recebem somente um salário, então prestamos este apoio. Isto é feito com auxílio das pessoas que me ajudam, seja financeiramente, me passando o dinheiro e eu comprando esse item ou doando algo.
Jornal do Sudoeste: Você tem vontade de criar um espaço para receber esses idosos?
N.S.M.: Sim, mas hoje minha vida é muito corrida e este trabalho que faço é em horários vagos, mas penso em ter um local para ajudar essas pessoas. O idoso não tem muita força, não tem como trabalhar, vive com um salário e os remédios são sempre muito caros e a maioria das pessoas não liga. Para quem esse idoso vai pedir ajuda? É justamente por isto que decidi montar esse grupo de apoio.
Jornal do Sudoeste: Você ainda sente muito a perda do seu avô?
N.S.M.: Hoje não fico muito triste, porque tive a oportunidade de conviver muitos anos com ele. Meu avô tinha 87 anos quando faleceu, e todo o tempo que ele teve, dedicou-se a mim e a minha irmã, e nós a ele. Faz parte da vida. Ele nos ensinou tantas coisas e não era uma pessoa que ficava triste, tudo fazia piada. Como ele teve artrose de joelho, não andava e ficava na cadeira de rodas e, mesmo assim, não ficava triste. Íamos aonde quer que ele tivesse vontade de ir, adorava fazer amizade. É por isto que penso um pouco sobre nós, que andamos, temos a oportunidade de viajar, mas ficamos limitados a questões tão pequenas.
Jornal do Sudoeste: Quem quiser fazer parte do grupo de apoio ou ajudar, como faz?
N.S.M.: Pode entrar na página no Facebook (Grupo de Apoio ao Idoso Galdino Filho) ou pelo telefone 98868-6762, tanto para me passar o contato de idosos carentes, que necessitam de ajuda, quanto de querer ajudar com doações, seja ela fraldas, Nutrem ou cesta-básica, porque a partir daí eu sei para quem direcionar esta ajuda, quem são as pessoas que realmente precisam. Há muito idoso em Paraíso precisando de ajuda, a maioria mal tem o que comer.
Jornal do Sudoeste: Você acredita que falta apoio da população?
N.S.M.: Sim. As pessoas têm mania de jogar a culpa no prefeito, no secretário, no servidor, culpa todo mundo, mas ela mesma não faz nada. Se cada um fizer um pouco, evoluiríamos bastante. É tão simples. Às vezes recebo uma doação de R$ 10, juntando um pouco dali, um pouco daqui, dá para se fazer tanta coisa. Não resolve esperar do próximo, é tão simples ajudar. Às vezes um remédio, que a pessoa diz que é tão caro e eu chego a pensar que é R$ 200 ou R$ 300, na verdade custa R$ 40 e ela está passando mal por causa disto. Pensa no sofrimento dessa pessoa, que não tem a quem recorrer e fica lá sozinha, sofrendo.
Jornal do Sudoeste: Parece que os governos não têm dado tanta importância a investimentos na saúde, como você encara isto?
N.S.M.: Quando a gente não vive, tudo o que não está perto da gente não tem importância. Nós que vivemos isto, estamos perto, vemos o que a pessoa está passando, não tem como a gente cruzar os braços e não ajudar, precisamos sempre fazer alguma coisa.
Jornal do Sudoeste: Qual foi o momento de maior dificuldade que você passou nesses últimos 10 anos de profissão?
N.S.M.: Foi quando meu avô faleceu, passei uma fase muito difícil, mas não podia ficar sem trabalhar e deitada na cama sendo que havia tantas pessoas precisando de mim. Foi este trabalho que me deu forças para continuar. Mas passou, melhorei, tive a ideia de montar esse grupo e segui em frente. Vejo meu avô em cada pessoa que atendo, alguns, inclusive, chegam a me lembrar bastante dele (risos).
Jornal do Sudoeste: Qual o balanço que você faz destes 32 anos?
N.S.M.: Acho que nós nascemos com algum propósito na vida. O meu é trabalhar com idoso, não há explicação, sempre gostei e minha vida se resume a isto: é das 7h às 20h me dedicando a este trabalho. Não somente agora, mas desde antes, quando convivia com meu avô. Acredito que meu propósito seja este, cuidar de pessoas idosas e, não somente para o bem dele, mas pelo meu também, porque eu me sinto feliz com isto.