VERBAS COVID-19

Transparência no uso de verbas do Covid-19 provoca questionamentos

Por: Roberto Nogueira | Categoria: Cidades | 12-08-2020 06:55 | 915
Município aplicou parte do recurso na compra de equipamentos  e EPI
Município aplicou parte do recurso na compra de equipamentos e EPI"s para atendimento da saúde contra o coronavírus Foto: Divulgação

A falta de transparência, a sobra de irregularidades, bem como, a geração de inúmeros questionamentos foram as conclusões da Força Tarefa Cidadã, uma iniciativa criada para monitorar gastos públicos dos municípios no enfrentamento à pandemia da Covid-19. A ação é fruto de uma parceria entre o Observatório Social do Brasil e órgãos de controle a nível federal, estadual e municipal. Em São Sebastião do Paraíso, além de motivar a criação de uma comissão especial de acompanhamento dos gastos dos repasses, o uso dos recursos para o combate ao Coronavírus, que somente em um dos volumes destinados ao município prevê o recebimento de mais de R$ 7 milhões, tem gerado muitas indagações dos vereadores.

Ao analisar os portais oficiais das prefeituras, a Força Tarefa notou que cerca de 90% dos municípios não disponibilizam corretamente as informações e os documentos que permitem a devida fiscalização dos gastos na pandemia. "O primeiro problema é a transparência. Não há como fazer controle social se os documentos relativos a cada compra não estiverem disponíveis", afirma Ney Ribas, coordenador Nacional da Força Tarefa Cidadã.

A Força-Tarefa aponta que, se por um lado, os gestores, em geral, se mostraram empenhados na publicação de dados epidemiológicos, como o número de casos confirmados, mortos e ocupação de leitos, por outro, deixam a desejar na hora de prestar informação à sociedade sobre as despesas no enfrentamento à Covid-19. "No geral, o que estamos constatando é que falta transparência em relação ao que diz respeito à pandemia, especialmente em relação aos gastos: onde, quanto e para que foi gasto", avalia Ney Ribas.

Além de analisar a transparência das prefeituras em relação aos gastos, a Força Tarefa Cidadã também checou as compras dos municípios. Em fevereiro, a Lei 13.979/2020 dispensou a licitação para a aquisição de bens, serviços e insumos de saúde destinados ao enfrentamento da pandemia.

Com a flexibilização, a Força Tarefa identificou que muitas empresas se aproveitaram para praticar preços abusivos na venda de respiradores e de testes rápidos para diagnóstico da Covid-19. Além disso, o levantamento identificou que algumas prefeituras usaram a brecha com a nova lei para se corromperem. "Nós vimos empresas fornecedoras de vinho, por exemplo, vendendo respiradores. Isso não é comum, foge totalmente à regra", exemplifica Ney Ribas. 

Segundo Ribas, a União e os estados têm se esforçado para que os recursos de combate à pandemia cheguem aos municípios e beneficiem diretamente a população, mas o que tem ocorrido em alguns lugares é exatamente o contrário: prejuízo à sociedade. "Há falta de critério não só técnico, mas de cuidado com os recursos que é oriundo dos nossos impostos. Porque no fim das contas quem vai pagar essa conta somos nós cidadãos.

A pandemia está sendo usada como desculpa para se desviar e aplicar mal o recurso público", alerta. 

Estrutura e parceria
Uma das justificativas para a falta de transparência de municípios em divulgar os gastos públicos para o combate à pandemia da Covid-19 é a escassez de tecnologia, recursos e pessoal para isso, algo que os estados, por exemplo, teriam com mais facilidade. As organizações sociais ligadas à transparência e ao controle social concordam com a situação mais precária das prefeituras.

No entanto, na visão de Ney Ribas, o tempo decorrido desde o início da pandemia foi mais do que suficiente para que muitos municípios se adequassem ao nível de transparência exigido pela lei. "A pandemia já tem mais de quatro meses. Não há mais justificativa para dizer que falta estrutura, pessoal e tecnologia. O que falta é vontade política de ser transparente e tornar públicas todas as despesas com recursos destinados à Covid-19", diz.

Iniciativa do Observatório Social do Brasil, presente em 150 cidades de 17 estados brasileiros, a Força Tarefa conta com a participação dos Tribunais de Contas da União e Estaduais, a Controladoria-Geral da União, os Ministérios Públicos Federal e Estaduais, entre outros. A princípio, o monitoramento é feito por voluntários capacitados pelo Observatório. Em seguida, verificadas possíveis irregularidades, os órgãos de controle do estado ao qual o município pertence são acionados para que tomem as devidas providências.

Em Paraíso vereadores questionam sobre o uso dos recursos liberados
Em São Sebastião do Paraíso a utilização dos recursos recebidos pelo Município para adoção de medidas de combate a pandemia do Covid-19 tem gerado questiona-mentos dos vereadores. Um dos repasses da União para a Prefeitura ultrapassa a casa dos R$ 7 milhões, maior valor recebido entre as cidades da região. A Câmara até criou uma comissão especial para o acompanhamento do emprego das verbas recebidas e tem feito indicações para que medidas que visam a segurança dos servidores da saúde seja garantida.

No dia 29 de junho o presidente da Câmara Municipal, Lisandro Monteiro, determinou a criação de uma comissão especial para acompanhar a aplicação dos recursos extraordinários federais enviados ao município para combate ao novo coronavírus. A proposta é garantir a transparência dos recursos públicos por meio da fiscalização de etapas chaves da execução orçamentária, em vez de uma prestação de contas pontual. Os vereadores José Luiz das Graças, Marcelo Morais e Vinício Scarano foram escolhidos para compor o grupo de trabalho.

Na época Lisandro justificou que é função da Câmara e de cada vereador acompanhar e fiscalizar as ações do Executivo. "Cumprindo a prerrogativa legislativa de fiscalizar a aplicação desses recursos, decidi lançar uma comissão para que os recursos sejam investigados de 15 em 15 dias", afirmou na época o presidente. Com a decretação da pandemia de Covid-19, diversos repasses extraordinários foram efetivados pela União para estados e municípios com intuito de auxiliar no combate à propagação da doença.

No início de junho o Governo Federal iniciou o repasse aos municípios dos R$ 60 bilhões do Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, previstos na Lei Complementar 173/2020, sancionada em 27 de maio. Na microrregião de São Sebastião do Paraíso, o envio chegou a mais de R$ 13 milhões também dividido entre as cidades de Itamogi, Jacuí, Monte Santo de Minas e São Tomás de Aquino. Para São Sebastião do Paraíso foi destinada quantia superior a R$ 7,8 milhões. A Secretaria do Tesouro Nacional adiantou que repasses das parcelas seriam feitos nos dias 13 de julho, 12 de agosto e 11 de setembro.

Apresentando dúvidas sobre o repasse feito pelo governo, se a verba tinha sido enviada em quantia única ou parcelada o vereador Valdir Donizete do Prado, acreditava que o recurso já estava todo depositado na conta da Prefeitura. Ele foi alertado pelos colegas que o envio é feito de forma gradual e as remessas são feitas mensalmente em parcelas que chegam a casa de R$ 1.950. 000,00 conforme lhe foi esclarecido por Lisandro.

O vereador Marcelo de Morais solicitou que fosse enviado ofício ao Ministério Público com a reivindicação e alerta para que sejam testados todos os servidores da saúde, principalmente aqueles que estão atuando na linha de frente ao combate ao Coronavírus. "Já que veio tantos recursos, não justifica recebê-los e não dar proteção aos servidores", disse. Ele ressaltou que vários funcionários trabalharam na realização do inquérito sorológico da Covid-19, onde cerca de 20% das 118 pessoas testaram positivamente.

Os vereadores Vinícius Scarano e Cidinha Cerize, juntamente com Marcelo fizeram ponderações a respeito do fluxo de atendimento das pessoas na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) e também no Ambulatório Municipal. "É preciso tenha um direcionamento do fluxo para que não se misture as pessoas com suspeita de Covid-19 com outros pacientes", opina a vereadora. Vinícius disse que manteve contato com a Secretaria Municipal de Saúde e que esta situação já seria resolvida.

Quanto a fazer parte da comissão especial da Câmara que fiscaliza os recursos recebidos da Covid-19, ele enfatizou a importância deste trabalho para que se tenha ciência e clareza onde a verba está sendo empregada. "É muito legal ter formado essa comissão porque isso promove transparência de forma mais dinâmica e didática ao cidadão. Muitas cidades do país estão se aproveitando da situação para fazer superfaturamento de compras de produtos, principalmente de combate à pandemia, devido ao decreto de calamidade pública; essa comissão é muito importante até para reforçar nossa fiscalização", disse.

Lisandro pediu ainda que a Prefeitura disponibilize quinzenalmente em seu portal na internet informações referentes ao quantitativo do valor recebido pela União para o combate à Covid-19; decretos municipais ou de projetos de leis de créditos extraordinários que aumentem as dotações programáticas da área de saúde devido a repasses extraordinários da União. Também foi solicitado divulgação sobre o total já empenhado (nota de empenho) pelo município e quanto resta a empenhar; total pago (ordem bancária) aos contratantes por CNPJ; e distribuição na estrutura de saúde municipal dos bens adquiridos.