“Os livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas”. A frase imortalizada por Mário Quintana conjuga muitíssimo bem com o pensamento de nosso entrevistado. Da querida cidade vizinha de São Tomás de Aquino trazemos a história do professor Reginaldo Ghiraldelli. Aos 42 anos o filho de Antônio de Pádua Ghiraldelli e Nirce Pessoni Ghiraldelli, irmão caçula de Elaine, tem uma trajetória permeada por muito trabalho, dedicação e sede de conhecimento. Professor do departamento de Serviço Social da UnB – Universidade de Brasília, Reginaldo generosamente compartilha sua jornada, expõe sua visão sobre a importância da Educação bem como das demais políticas públicas e as expectativas acerca da atuação do novo governo.
Reginaldo, como foi crescer em São Tomás de Aquino? O que você traz consigo de sua terra natal?
Trago boas recordações do período da infância e da adolescência em São Tomás de Aquino, especialmente por ser uma cidade pequena, tranquila e de convivência amistosa entre a população. Estudei todo o ensino fundamental e médio em São Tomás de Aquino, em escola pública, na Olegário Maciel e na Tancredo de Almeida Neves. Aos 10 anos de idade comecei a trabalhar na Cooparaiso para ajudar minha família que não dispunha de muitos recursos financeiros e ali permaneci por cinco anos. Mesmo atravessando dificuldades em certos momentos, consegui concluir o ensino fundamental e médio, tendo o apoio incondicional da minha família.
E como decidiu cursar Serviço Social?
Sempre gostei de estudar e de aprender. Durante o ensino fundamental e médio alguns conteúdos e disciplinas me despertavam mais o interesse e atenção, especialmente História, Geografia, Sociologia, Língua Portuguesa, Filosofia e Literatura. Quando finalizei o ensino médio pensei em cursar História, Letras, Jornalismo ou Enfermagem, mas depois fui ler sobre o Serviço Social e foi uma identificação imediata. O curso de Serviço Social me ofereceria uma aproximação aos conteúdos com os quais me identificava e me permitiria contribuir profissionalmente com questões que sempre me inquietavam e me incomodavam como, por exemplo, a pobreza, o desemprego, as desigualdades sociais e a necessidade de investimentos em políticas públicas para o atendimento das necessidades humanas da população.
Onde cursou a graduação e como foi esse período?
Estudei na UNESP (Universidade Estadual Paulista) campus de Franca -SP, de 2000 a 2003. Desde o ingresso no curso tive a certeza da minha escolha profissional. Os conteúdos ministrados e a experiência do estágio supervisionado no Centro Jurídico Social (da Unesp) serviram para confirmar que eu havia feito a escolha certa. Acessei o ensino superior público, um patrimônio brasileiro o qual devemos defender e preservar, pois sem ele acredito que não teria tido possibilidades de estudos para além do ensino médio. Durante a graduação fui bolsista de extensão e de iniciação científica, o que me permitia a permanência na Universidade. Também morei durante dois anos na moradia estudantil. Isso para dizer o quanto são fundamentais as políticas públicas de educação e de permanência de estudantes nas escolas e universidades.
Na sequência você fez o mestrado, doutorado e um pós-doc na Itália. Como foram essas experiências?
Após a graduação eu decidi cursar o mestrado e em seguida o doutorado, ambos em Serviço Social, também na Unesp de Franca. Mais recentemente tive a oportunidade de realizar um pós-doutorado na Universidade de Roma “La Sapienza” na área de Sociologia do Trabalho. A realização do mestrado e do doutorado possibilitaram a minha inserção em um universo distinto, o da docência. Desde a graduação pensava nessa possibilidade, pois meus professores eram inspirações e referências para mim. O período do pós-doutorado na Itália foi desafiante e me possibilitou o contato com uma outra realidade. Além do desafio de aprender um novo idioma, me deparei com um outro contexto, com novas relações profissionais e pessoais que me propiciaram novos aprendizados. Na Universidade de Roma “La Sapienza” pude desenvolver um projeto de pesquisa sobre trabalho, desemprego e direitos sociais, fazendo uma análise comparativa entre a realidade brasileira e a italiana.
Qual sua trajetória como docente até chegar à UnB?
Antes de concluir o mestrado comecei a lecionar em algumas instituições de ensino na cidade de Montes Claros. Após a conclusão do mestrado, ingressei no doutorado. Considerando que fazia o doutorado na Unesp-Franca, precisava residir mais próximo. Nesse período lecionei no Centro Universitário de Formiga, na UEMG de Divinópolis e em seguida no Centro Universitário UNA de Belo Horizonte. Após concluir o doutorado em 2010 abriu um concurso para o Departamento de Serviço Social na Universidade de Brasília e decidi prestar. Na época eu residia em Belo Horizonte. Fui aprovado no concurso da UnB e me mudei para Brasília em 2011, onde resido atualmente.
Vivendo já há um bom tempo em Brasília, o que acha imperdível para aqueles que querem conhecer nossa capital? A cidade é cheia de simbolismo, concorda?
Brasília é a capital do país, o que já demonstra a sua importância no cenário político, econômico, social, cultural e histórico. É uma cidade particular pela sua origem e propósito, mas que traz em si as contradições e o retrato dos centros urbanos brasileiros, marcados pelas profundas desigualdades sociais. Em Brasília é possível encontrar pessoas de todas as regiões e estados do país, que geralmente migram em busca de inserção profissional e melhorias nas condições de vida. Para quem deseja visitar a cidade, é interessante conhecer a Praça dos Três Poderes, os museus que contam um pouco a história da cidade, os parques e as regiões administrativas, de forma a entender a dinâmica local.
De que forma o Serviço Social pode contribuir com a sociedade?
O Serviço Social é uma profissão que atua no campo das mais variadas políticas públicas, como a saúde, a previdência social, a educação, a habitação, a cultura, a assistência social, dentre outras. Em uma sociedade marcada por tantas desigualdades, exclusões e miséria, o Serviço Social pode contribuir para o acesso aos direitos de cidadania da população por meio de orientações a indivíduos, grupos, famílias e na intervenção direta nas instituições nas quais atuam o profissional.
Nos últimos anos presenciamos cortes significativos na área da Educação, além de diversos ataques às universidades públicas. A que você atribui isso e como contornar a desinformação?
Nos últimos seis anos, durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro presenciamos não só cortes nas políticas de educação, mas nas políticas sociais como todo, contribuindo para o desmonte do sistema de proteção social brasileiro e com repercussões diretas no acesso da população aos direitos sociais. A educação foi uma das áreas mais afetadas, colocando em risco a sobrevivência e manutenção das escolas e universidades diante dos cortes orçamentários. Vivemos um período de disseminação de desinformação, de ataque à ciência, de censura ao pensamento crítico e precisamos buscar formas de enfrentar essa situação. A educação é uma das vias para contornarmos essa situação. É preciso investimento na política de educação na sua totalidade, abarcando todos os estágios e níveis de formação. A educação, a arte, a ciência e o conhecimento são instrumentos fundamentais no combate à desinformação. A educação transforma vidas e transforma a realidade social.
O novo governo está apenas iniciando, mas já vemos indicativos de grandes mudanças nas políticas públicas. Crê que serão positivas? O que esperar da nova gestão do governo Lula, em especial na área da Educação?
Sem dúvidas o novo governo já começa sinalizando positivamente para importantes mudanças e melhorias nos diversos âmbitos da vida social. As expectativas são boas em torno do governo Lula quando se pensa no investimento em políticas públicas, como é o caso da educação e de outras políticas fundamentais para a sociedade brasileira como a saúde, a previdência social, a moradia, a assistência social, a preservação ambiental e a cultura. Em relação à educação a expectativa é de maior investimento em ciência, tecnologia, infraestrutura, ampliação do ensino público de qualidade em todos os níveis, políticas de assistência e permanência de estudantes nas escolas e universidades, dentre outras.
Reginaldo, quais seus planos para os próximos anos?
Meu plano é dar prosseguimento ao meu trabalho na docência na Universidade de Brasília (na graduação e na pós-graduação), aos meus estudos e pesquisas que realizo junto ao grupo de pesquisa que coordeno, que é o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho, Sociabilidade e Serviço Social (TRASSO) e talvez realizar um novo pós-doutorado.