Em 28 de março de 1948, às 14 horas, quando as folhas do outono começavam a colorir os jardins de São Sebastião do Paraíso, nascia na sede da União Espírita Allan Kardec, situada à rua Artur Bernardes, nº 131, na Vila Mariana, uma semente de amor e generosidade: a “Associação Feminina Obreiras do Bem”. Um grupo de mulheres caridosas que, desde então, tem estendido suas mãos para auxiliar os mais necessitados, iluminando a vida de milhares de pessoas carentes, das crianças aos idosos.
Naquele tarde, a reunião inaugural foi dirigida pelo casal Pompeu Adelardo Giubilei e Regina Fressatti Leão. Os dois lideraram a criação deste grupo exclusivamente formado por senhoras de todos os centros espíritas da cidade. A primeira presidente, a própria Regina, desabrochava o início de uma trajetória de amor e dedicação que perdura até os dias de hoje.
O documento histórico da fundação delineava os nobres objetivos da Associação Feminina Obreiras do Bem à partir daquele momento: assistir os necessitados com roupas e medicamentos; organizar donativos para a construção de um prédio acolhedor, que pudesse reunir a família espírita paraisense em ocasiões de conferências; promover e intensificar o catecismo em cooperação com a Juventude Espírita Allan Kardec; estimular a união entre a comunidade espírita da cidade através de eventos recreativos e culturais, além de construir um sanatório para atender pessoas com doenças psiquiátricas, uma escola primária e um abrigo para crianças órfãs. E para tornar reais tantas aspirações, o grupo de mulheres esperava contar com o apoio da comunidade paraisense, realizando rifas e sorteios de prendas, unindo esforços em prol do bem comum.
Após 75 anos, as “Obreiras do Bem” seguem cultivando esperança em São Sebastião do Paraíso. Em sua jornada, elas administram o Albergue Noturno, que como um farol, guia dezenas de pessoas para um abrigo seguro e acolhedor ao anoitecer. As mãos talentosas dessas mulheres também bordam o futuro, presenteando recém-nascidos de mães carentes com enxovais, além de oferecerem cadeiras de rodas, camas hospitalares e muletas para aqueles que atravessam momentos difíceis em suas vidas.
Cyrene Amaral Coimbra, recém-eleita para o seu quinto mandato como presidente da associação, fala sobre os trabalhos realizados atualmente pelo grupo de mulheres: “O primeiro de tudo é a manutenção do Albergue Noturno, que é projeto mais importante e mais difícil de ser mantido. É a nossa ‘menina dos olhos’. Temos, ainda, o projeto ‘Mamãe Feliz’, onde confeccionamos, costurando, bordando e tricotando, enxovais para crianças recém-nascidas, com roupinhas, manta, toalhas, fraldas, sabonetes e outras coisas que a mãe e o bebê necessitam logo depois do nascimento. Só no último mês, 30 kits foram doados para essas pessoas. Também temos o ‘Apoio à Dor’, onde fazemos o empréstimo das cadeiras e outros objetos a quem mais precisa”.
Cyrene, inclusive, viu de perto a Associação Feminina Obreiras do Bem dar os seus primeiros passos e, mesmo ainda criança, participou ativamente do desenvolvimento do projeto. Quando tinha apenas oito anos, ela ia com o pai, Dino Amaral, até o local onde se construía a represa de Furnas para vender bilhetes de rifas que a instituição promovia para angariar fundos para a construção de sua sede. O local, que hoje abriga o hospital psiquiátrico Gedor Silveira, foi construído graças aos esforços de muitas mulheres e suas famílias, incluindo a de Cyrene. “Eu me lembro de ir a esses lugares com o meu pai e vendermos muitos bilhetes, porque aquelas pessoas tinham dinheiro e gostavam de ajudar”, lembra a atual presidente, que coordena a associação com o apoio da irmã Dinomar Campos do Amaral, ex-presidente e atual tesoureira do grupo feminino.
E por falar em tesouraria, o desafio financeiro das Obreiras do Bem de manter seus projetos vivos tem sido cada vez maior. O Albergue Noturno, por exemplo, necessita de cerca de R$8 mil mensais para funcionar. Graças à parceria com a prefeitura, em 2021, a associação recebe do município R$3 mil por mês. Entretanto, a diretoria precisa “matar um leão por dia” e contar com o apoio da comunidade para fechar as contas.
O grupo de mulheres organiza bingos e rifas, além de receber doações mensais de populares. “Nós mesmas vamos à casa dessas pessoas para receber as doações para não ter que usar parte dos recursos pagando uma pessoa para realizar esse trabalho. Porém, essa ajuda diminuiu bastante depois da pandemia. Ainda assim, a população nos abraça e nos apoia muito em tudo o que nos propomos a fazer”, explica Dinomar.
Além disso, a associação mantém um bazar em sua sede, que vende roupas, calçados, móveis, eletrodomésticos, eletrônicos e outros objetos. Tudo fruto de doação. “Graças a Deus, as pessoas nos doam muitas coisas. Fazemos uma triagem e parte do que ganhamos vai para o bazar. A outra, repassamos para as pessoas que necessitam. O pessoal que vem para o albergue sempre tem roupa limpa e calçados, tudo que recebemos dessas pessoas, conta a atual presidente”.
Engana-se, porém, quem acredita que as Obreiras do Bem estejam satisfeitas com o trabalho que já realizam. Cyrene declara que elas querem fazer mais pelas pessoas e sonha alto. “Nós queremos muito contratar um profissional da psicologia para ajudar as pessoas que chegam no albergue. Também temos o desejo de construir um restaurante popular, onde se pague um valor simbólico por um prato de comida. Estamos procurando uma área para começar a realizar esse sonho. Sabemos que não é fácil, mas se contarmos com a ajuda do povo paraisense, como sempre contamos nesses 75 anos, eu tenho certeza que vamos conseguir”.
Questionada sobre o que as leva a dar continuidade ao trabalho voluntário, mesmo diante de tantas dificuldades e desafios, Cyrene declara que tudo é feito por amor ao próximo. “Nós poderíamos estar em casa, descasando. Mas não seríamos tão felizes e realizadas em nossas vidas. A Associação de Mulheres Obreiras do Bem sobreviveu e ainda sobrevive graças ao amor às pessoas que necessitam. Essa é a nossa missão.”.
Por fim, a presidente da Associação Feminina Obreiras do Bem fala sobre o futuro da instituição. Seu desejo é que o trabalho e o legado deixado pelas tantas mulheres que já passaram por lá continue inspirando as próximas gerações a estender a mão e oferecer o ombro aos que mais necessitam. “Um dia, nós vamos partir, mas o projeto precisa continuar.
E o nosso trabalho aqui é mostrar para as mulheres mais jovens que vale a pena continuar acreditando que é melhor dar do que receber. Continuamos plantando sementes que, se Deus quiser, vão gerar bons frutos no futuro. Meu desejo é que os próximos anos sejam de realizações e que a chama da caridade nunca se apague, mantendo viva a esperança de um mundo mais justo e solidário”, conclui Cyrene.