ESPECIAL 202 ANOS DE PARAÍSO

A arte de gêmeos guardinhenses em lidar com madeira e metais

Por: Nelson Duarte | Categoria: Cidades | 24-10-2023 09:54 | 6756
Foto: Nelson Duarte

Os gêmeos Leandro e Fernando (de Souza Gama), 22 anos, residem em Guardinha. Há quatro anos, descobriram suas habilidades como artesãos e têm transformado metais e madeiras em variadas peças de arte.

Junto aos pais Edmar Donizete Gama e Luciene Aparecida de Souza Gama, moraram em um sítio até os 14 anos. Ajudavam na lida diária, tratando de gado e outros afazeres, depois mudaram-se para Guardinha. Estudaram até o terceiro ano colegial. Aguardavam uma oportunidade para ingressar no mercado de trabalho, que por lá é bem escasso e voltado para o setor agropecuário.

Uma pequena lâmina de metal, minúscula mesmo, teve o condão de lhes despertar o talento, mostrar-lhes o dom que trouxeram, que estava pronto para lhes abrir as portas e se tornarem conhecidos. Um dia, enquanto proseavam, Leandro foi moldando a lâmina no chão de concreto, e ela se tornou uma faquinha que ganhou cabo de madeira ondulado, ondulação providenciada com um parafuso.  Foi o primeiro passo para começarem produzir peças maiores, e para isso foi necessário montar uma oficina. “Vimos que tínhamos habilidade e foi dando certo, graças a Deus”, contam, recordando que uma senhora lhes encomendou uma “char-retinha”, depois fizeram um barquinho de madeira, um joguinho de facas, e daí em diante.

Boa parte das ferramentas que utilizam foram fabricadas por eles. “As pessoas tomaram conhecimento do nosso trabalho e as encomendas foram crescendo. À medida em que vendíamos, fomos melhorando a oficina para poder atender à demanda”. Mas o uso constante também traz desgastes, conforme explica Leandro: “Fizemos a forja (para aquecer e dar forma aos metais) de um material grosso, resistente, mas de tanto ser usada foi derretendo. Vamos ter que fazer outra e já temos o material”.

A beleza das peças produzidas por Leandro e Fernando, com criatividade nos entalhes, riqueza de detalhes, chamam a atenção pelo acabamento primoroso em madeira e cutelaria. São autodidatas, “Aprendemos ao mesmo tempo, e fomos aperfeiçoando”, contam, mencionando que tiveram foram motivados pelo marceneiro Manoel Antônio conhecido como Manezinho, que adoeceu não trabalha mais. João Marcos, o “João do Açougue”, lhes ensinou bastante, e deu dicas na parte de facas. Valem-se também de informações colhidas via Internet, por exemplo, sobre têmpera de metais. É também através de redes sociais onde postam fotos de peças produzidas, que divulgam seus trabalhos. “Postamos no Instagram FLG Marcenaria Cutelaria, e no Tic Toc, FLG Marcenaria e Cutelaria”, explicam.

Há grande procura por facas, sabres e adagas, fabricadas a partir de recicláveis, molas de caminhões, caminhonetes e em bronze. O tempo de fabricação vai de um a três dias, dependendo dos detalhes. Na parte de madeiras, o maior número de encomendas é por porta-chaves.

Em alguns modelos, são utilizadas até 13 tipos diferentes de madeiras, deixando as peças com atrativa combinação de cores. Imagem do Divino Espírito Santo, estilizada, também está entre as mais procuradas.

A capacidade criativa dos gêmeos tem transformado madeiras em caminhõezinhos articulados que giram, e têm portas e capô abertos, motocicletas, dentre outras preciosidades que podem ser encomendadas.

“Sempre há alguma peça à pronta entrega. Toda semana recebemos pedidos, principalmente quando fazemos algo diferente e postamos em nossas páginas. Clientes de nossa região e de locais mais distantes, gostam de vir aqui em nossa porta, encomendar, conversar com a gente, ver como trabalhamos. Já vendemos para pessoas que moram na capital, no interior paulista e de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.

Fernando e Leandro ainda não participaram de exposição em feiras de artesanato, que certamente irá projetá-los ainda mais. Pensam em ampliar aprimorar, adquirir maquinário, para lhes possibilitar aumentar a produção.  Almejam local com maior espaço para montarem a oficina, que atualmente funciona no quintal da casa onde moram, e se dedicarem também à fabricação de mesas, cadeiras, móveis, e cutelaria, com o mesmo padrão de qualidade.

Falam com admiração e forma muito carinhosa, do apoio e ajuda recebida de seus pais. “Nosso pai é habilidoso, nos ajudou na montagem da oficina, ele entende, e é um divulgador de nosso trabalho”.  De igual maneira tecem elogios à mãe, Luciene, pelo zelo com eles, seu capricho nos afazeres no dia a dia como dona de casa, e sua habilidade em preparar deliciosas quitandas.

Os gêmeos vez por outra são procurados com pedidos de informações, ou por pessoas que iniciaram algum serviço e encontraram dificuldade em terminar. “Já perdemos muitas peças, e é necessário atenção. Tem o pulo do gato. A experiência que nós temos nós passamos adiante àqueles que nos perguntam. Tivemos ajuda, muitos nos ensinaram, Deus nos deu esse dom. Por que vamos guardar somente para nós”, afirmam, ao admitir que, um dia, quem sabe, poderão participar de projeto para ensinar artesanato a jovens. “É um trabalho que muitos gostam, e nós gostamos de ensinar”, salientam os talentosos Leandro de Souza Gama e Fernando de Souza Gama.