São Sebastião do Paraíso é um município que, em seus 202 anos de existência, sempre carregou consigo histórias de personagens apaixonados e comprometidos com a terra em que nasceram.
E uma dessas figuras pode ser encontrada pelas ruas do centro sempre com sua farda da Guarda Civil Municipal e um sorriso no rosto: Marcileia Mariano, uma “guardiã” que por quase 35 anos dedicou-se a servir e proteger sua amada cidade.
Marcileia representa um marco na história das guarda Civis municipais, sendo parte da primeira turma feminina de GCM de Minas Gerais. Ela passou a integrar a corporação assim que foi criada, em 1989, durante o segundo mandato do prefeito Waldir Marcolini, atendendo o desejo do então gestor criar uma “polícia municipal”.
Depois de ser aprovada em dois concursos públicos (a Câmara Municipal cancelou a primeira seleção, acusando irregularidades) Marcileia teve a oportunidade de realizar o sonho de menina. Antes, a jovem trabalhava em boutique da cidade, mas o desejo de seguir os passos do pai, policial militar, fez com que ela trocasse as roupas elegantes pela farda que tanto admirava. “Eu convivi pouco com o meu pai, o cabo Sebastião Marcelino. Ele faleceu quando eu tinha sete anos. Mas sempre carreguei na memória a imagem dele vestindo a farda. Então, quando vi essa oportunidade, eu abracei”, conta.
Ingressada na recém-criada GCM aos 20 anos de idade, Marcileia não tinha ideia de que, um dia se tornaria um dos grandes símbolos da corporação. Ela se lembra com carinho dos primeiros passos da Guarda Municipal. “Éramos um grupo de 12 homens e dez mulheres, todos com o desejo de servir a cidade”.
Com treinamento rigoroso ministrado pelo Exército e pela Polícia Militar, Marcileia encontrou um laço inesperado: “Dois dos meus professores foram colegas de trabalho do meu pai na PM: o soldado Morais e o cabo Morais, pai e tio do nosso atual prefeito, Marcelo. Eles me ensinaram a trabalhar na rua, assim como meu pai os havia ensinado no passado”.
Do início da GCM, Marcileia revela uma história um tanto quanto curiosa e conhecida por poucos. Idealizador do projeto juntamente com Marcolini, o Coronel Walter Albano Fressatti, chefe de gabinete naquela época, teve a ideia de se fazer uma guarda montada, como a que teria visto em uma de suas viagens ao exterior. Inclusive, foi ele o responsável por ir até o Rio Grande do Sul selecionar os animais que seriam usados pelos agentes paraisenses. “Foi uma coisa muito interessante. Os homens faziam o patrulhamento pela cidade a cavalo e funcionava muito bem. O Coronel e o Sr. Waldir foram grandes homens”, lembra.
Sobre os momentos mais marcantes de sua carreira, Marcileia recorda da vez em que um policial bateu à porta da sua casa já de madrugada. Motivo: uma mulher havia sido presa por suspeita de tráfico, e não havia policial feminina para revistá-la. “Eu levantei, fiz questão de vestir a minha farda e ir ajudar, porque sempre fazíamos ações em conjunto com a polícia. E acabou que eu encontrei droga com a moça.
Depois o delegado nos convidou para fazer a revista nas mulheres que visitavam os detentos do presídio. Ficamos 17 anos nessa função, até a chegada das agentes penitenciárias”.
Outro marco profissional de Marcileia foi a ação na porta das escolas. Ela e seus colegas, apelidados de “Anjos Azuis” por Coronel Fressatti e pais e alunos, cuidavam com zelo das crianças e adolescentes durante a entrada e a saída das aulas. A presença deles garantia segurança e confiança, gerando uma imensa gratidão por parte dos pais, que até hoje reconhecem o trabalho.
Mas nem todos os momentos de GCM foram de glória na vida de Marcileia. “O momento mais difícil foi com três anos de guarda. Estava grávida... eu saía para a rua de farda com aquela barriga enorme para fazer a porta das escolas. Acho que fui a primeira grávida a usar farda até os nove meses de gestação. Mas, infelizmente, meu bebê faleceu no parto”, lamenta.
A dor do luto poderia ter acabado com a vida de Marcileia. Mas foi naquela hora que o povo paraisense, que ela sempre serviu com devoção, retribuiu todo o carinho da melhor forma possível. “As pessoas que me viram grávida vinham até mim na rua e conversavam comigo, me davam força e esse apoio fez com que eu me dedicasse ainda mais ao meu trabalho, servindo com amor redobrado”.
Implacável, o tempo se passou. Marcileia e o marido Luciano, que também é Guarda Municipal, tiveram outro filho, Luiz Guilherme, e a vida seguiu. Agora, ela vive seus últimos momentos com a farda que tanto venera. Em maio de 2024, a GCM completa 35 anos de corporação e vai se aposentar. E agora? “Eu estou preparada para isso. Vou fazer meu corte e costura que eu tanto amo.
Além disso, vou me dedicar mais à Casa de Apoio (entidade que presta apoio a familiares de pacientes de outros municípios internados na Santa Casa de Paraíso). Vou continuar servindo, mas de uma forma diferente”, conta Marcileia.
Sobre o significado da Guarda Municipal em sua vida, a GCM declara de forma poética. “Ela foi um meio de realizar o meu sonho de ser como o meu pai. Estar na rua, numa praça, conversando com as pessoas e podendo ajudá-las... Isso tudo me fez muito feliz, conclui Marcileia”.
E assim, a guardiã de São Sebastião do Paraíso se prepara para escrever um novo capítulo, deixando para a comunidade um legado de dedicação, amor e proteção. Marcileia, deixará a farda, mas, com o seu sorriso, permanecerá sempre a postos no coração do paraisense.