Fábio Mirhib
Fisicamente é um pequeno homem. Não muito. Estatura mediana e recebendo a visita temporona da calvície. Gordo sem obesidade. Óculos que lhe aumentam o mistério da sensibilidade, querendo mostrar que o animal vê e o intelectual contempla.
Detesta o barulho infernal da música moderna, porque sua música é a música puramente a música, que extrai do piano e do órgão elétrico, pairando acima do lodaçal deste mundo, tentando unir, a magia dos sons, a criatura ao seu Criador.
Colore todos os casamentos, arrancando do piano, notas harmoniosas que, misturam, a um tempo, a alegria e a seriedade das cerimônias, amor, sonhos maravilhosos, saudades, esperanças e ideias que só a mocidade pode conceber.
Seu coração, músculo liso e estriado que não bataria ao jantar de um corvo, abriga todo um universo de amor e de bondade, estrelas fulgurantes e mares calmos ou em rebeldia.
O mais importante é que ele sabe fazer da amizade uma verdadeira obra de arte. Nada nega a ninguém quando o favor depende de seu talento e de sua dedicação.
Esteve ausente por muito tempo desta cidade porque a vida obrigou-o àquela luta que enobrece e dignifica o ser humano. O pouco que possui foi conseguido a duras penas, e com méritos. Prefere a solidão e acima que a pior solidão é quando se está no meio da multidão.
Filho de humilde e digno sapateiro, nunca trombeteou os triunfos do orgulho ou da vaidade. E nem da soberba.
Seminarista que foi, guarda no peito um sentimento espontâneo de misticismo e religiosidade. Compreendeu, ao regressar a Paraíso, a veracidade das palavras do poeta inglês: “O homem mais feliz é o que não perde de vista o campanário de sua aldeia natal”.
Esse moço sabe bem que a saudade é a esperança do futuro e que a filosofia norteia os homens de bom coração. Não desprezando os humildes e desventurados, aspira sempre o perfume dos lírios po-uco se importando que haja nascido no lodo.
Maestro de primeira linha, nunca deixou de revelar que a modéstia é a moldura do merecimento e que os rios profundos não fazem ruído.
Quem é este homem? Aquele que adivinhar receberá da redação deste jornal, cinco bilhões de dólares, cinco milhões de rublos e cinco bilhões de cruzeiros novos. E, ainda, um passaporte grátis e estada completamente paga para viagem de uma semana, ao país da fantasia, onde florescem os sagrados lutos e onde não existem nem a dor, nem a inveja, nem a guerra, nem a velhice, nem a maldade, onde os homens compreendem que tudo é pó e cinza, e que devem saber viver bem e morrer bem, e que a fortuna é de vidro. Quando mais brilha, mais se espatifa em milhares de fragmentos dolorosos e coloridos.
Escolhemos, a dedo, para homenageá-lo, um velho pensamento francês: “Se os velhos pudessem e se o amplos soubessem, nada faltaria a este mundo”.
(Em homenagem a Lucas Bertucca Filho), publicado na edição de 11 de fevereiro de 1989 do Jornal do Sudoeste.