Poetas já cantaram a importância das grandes amizades. Paulo era assim: um príncipe, o irmão que nunca tive. Conheci-o em 1956, época da Faculdade e já o respeitava: alguns anos mais velho que eu, muito culto, falando cinco línguas. Alto, esbelto, elegante, dançarino perfeito. Na realidade, o que mais me encantava nele era seu desprendimento, seu amor pelas viagens (amava a Europa!) e a pureza de alma.
Dizia que era médium e nunca me perdoou, porque não conseguiu fazer-me acreditar na reencarnação. Várias vezes me disse: Gosto de tudo em você, menos de sua fé, que é muito frágil. E ele realmente tinha razão. Até hoje sou apenas espiritualista e o post-mortem, para mim, são muitas hipóteses e nenhuma certeza.
Dizem que conhecemos os verdadeiros amigos, quando a
desgraça nos bate à porta. Em 1973, repentina e tragicamente, perdi meu primeiro marido (ele, tão jovem, com quarenta anos!), fiquei desnorteada. Foi Paulo que, em longas conversas e conselhos espirituais, conseguiu amenizar minha dor.
Ele tinha uma cosmovisão diferente, uma maneira de viver original; era um exemplo vivo da filosofi8a de Horácio, o Carpe Diem: viver o momento. Todo dinheiro que conseguia, partia para a Europa, em viagens inesquecíveis. Tinha amigos em vários países, com os quais se correspondia em inglês, francês, italiano, espanhol e alemão.
Um dia ele me disse que seu guia espiritual avisou-o que ele morreria aos setenta e seis anos. Brincadeira de espírito travesso... Quando ele completou oitenta, deixou de pensar no assunto.
Algo que me impressionou sempre foi no dia em que eu o conheci. Convidou-me para um almoço em sua casa (ele era ótimo cozinheiro!). Na véspera eu sonhei com muitos detalhes, vi o local, sua casa, a sala, os quadros de pintores franceses, sua biblioteca. No dia seguinte, quando o sonho virou realidade, fiquei abismada. Ele explicou-me com simplicidade que minha alma, à noite, visitara o local. Até hoje, sem entender, jamais pude aceitar a explicação.
Visitou-me várias vezes em Ribeirão Preto. A primeira vez disse que meu apartamento cheirava a rosas, pela sua espiritualidade. Minha mãe o adorava e todas amigas a quem eu o apresentava, encantavam-se com ele, com sua educação, seu modo de ser.
Aos oitenta e nove anos, muito doente, foi viver em uma bela Casa de Repouso, no bairro da Pampulha, em Belo Horizonte, cidade onde nasceu. Telefonei-lhe duas vezes e na terceira tarde, soube que ele estava no Hospital. Não houve tempo para uma última visita. Quando telefonei novamente, ele havia falecido.
Ficou-me na memória muita saudade, lembranças e sua figura bonita, dançando com a amiga querida Regina Fráguas (que também já se foi), em um baile da Recreativa.
Depois que ele faleceu, sinto-o mais próximo de mim: o amigo-irmão tão querido. E parece-me vê-lo sorrindo, ele agora, mais sábio ainda, porque conhece todas as respostas.
(*) Ely Vieitez Lisboa é escritora.
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