Há dúvidas que incomodam. Vão e voltam sempre, sem respostas. O que é realidade, por exemplo. De perto, no presente, os fatos parecem ser vivos e reais. Com o passar dos anos, depara-se com nova face dos acontecimentos, totalmente mudados pelo tempo. Então, qual é a verdade? O que é falso?
Analisando a questão percebe-se que a proximidade do fato é como tentar ver um quadro, uma pintura, de muito perto. Ver-se-ão apenas borrões, com uma visão totalmente distorcida, os contornos ficarão comprometidos. É preciso certo distanciamento para apreciar um quadro, uma gravura. Provavelmente, na vida se dá o mesmo.
Outro argumento convincente é a insciência humana. Não se conhece o amanhã, nem mesmo o futuro próximo. Ora, talvez esta seja a explicação mais coerente para comprovar a tese inicial.
Quando se está vivendo um episódio, um fato, pode-se conhecer só a sua gênese, a origem dos acontecimentos. No presente, aos poucos vai se desenrolando o script, sucedendo as cenas. Na vida, como na literatura, o final pode ser em clímax ou em anticlímax, isto é, o fim que se espera, ou uma frustração, diante do possível epílogo. Ora, na literatura os grandes autores usam as duas mencionadas técnicas. Machado de Assis parece preferir o anticlímax, com términos inesperados, pessimistas, às vezes até niilistas. Alguns dos maiores autores de nossa literatura, como Osman Lins, também tinha preferência pelo anticlímax.
Na vida real, quando se está vivendo o presente, não se conhece o final da história. Assim, belos romances vulgarizam-se, quando não viram dramas ou farsas grotescas. Às vezes o vivido tem até happy-end, quando Deus inebria-se de lirismo. Vezes outras, os próprios heróis da história misturam papéis, fazem tolices e azedam a receita.
Algo, no entanto é certo: para se avaliar se o espetáculo de nossa existência foi bom, só com o distanciamento do ocorrido saber-se-á se vale a pena aplaudir, ou chorar lágrimas inúteis. Fecharam-se as cortinas, não há mais público, apagaram-se as luzes.
Nas coxias restam só os frustrados artistas que, às vezes, terão a oportunidade de participar em outra peça. Senão, é a aposentadoria compulsória.
(*) Ely Vieitez Lisboa é escritora.
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