O amor platônico é belo e trágico. Arvers, poeta francês famoso, escreveu muitas obras e a mais bela é um soneto, conhecido no mundo todo como Soneto de Arvers. Nele ele conta a tragédia de um amor impossível. Eram comuns os saraus nos palácios de nobres da época. Convidado, o nosso poeta infeliz declama, perto de sua Amada, dona da casa, seu sentimento proibido, imenso, que seguia seus passos, adorando-a. Encantada, a anfitriã inveja a mulher tão amada. Que mulher seria aquela? E jamais soube que era ela mesma.
Conheço histórias notáveis desses amores impossíveis, que florescem na alma, sem nada exigir, sem nenhuma esperança. A terrível história da Secretária, que adorava seu Chefe. Durante mais de vinte anos, colocava em sua mesa um botão de rosa, lindo e fresco, regado pela sua ternura, desejando ao Amado toda felicidade do mundo, saúde, vitórias. Assim, como um Anjo bom que velasse por ele. Nunca lhe falou sobre sua paixão.
Na minha adolescência tinha uma amiga bela e tímida, que morria de amores por um jovem, seu vizinho. De manhã, contava Júnia, ficava adorando ver sua sombra pelos vitrôs do banheiro defronte sua casa, ou vê-lo, escondida, quando ele saia.
Certa vez brincávamos com uma bola e eu, Cupido canhestro e bem intencionado, arremessei, de propósito, a bola até os pés do Príncipe. Júnia atravessou a rua, trêmula de emoção, mal podendo andar, com vertigens. Recebeu a bola do jovem, porém não conseguiu abrir a boca, dizer uma só palavra de agradecimento.
Muitos anos depois, em uma festa, encontrei o Príncipe, então casado e com filhos. Ao cumprimentar-me, me reconheceu e perguntou se eu não era amiga de uma vizinha sua, uma jovem que não era feia, mas meio débil mental, que mal sabia falar... Diante de sua ignorância, tive pena e contei-lhe que ele era o grande amor de Júnia, que ela morria de amores por ele, por um único olhar seu...
Ele me olhou surpreso. Vi, em seus olhos escuros, um enorme pesar por não ter sabido, antes, daquela paixão. E, misteriosamente, percebi uma grande melancolia em seu rosto, uma tristeza infinda diante da inexora-bilidade da vida, que jamais volta.
Vieitez Lisboa é escritora.
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