Coisas da vida
por Murilo Caliari e André Pádua
por Murilo Caliari
As
pessoas falam que a vida é assim. Eu a vejo de um jeito diferente. Eu vejo a
vida como as pessoas são. Cada vez ela é
de um jeito. Às vezes ela é certinha, ordenada e outras vezes a vida é
desregrada.
Parece
que em algum lugar, determinado autor escreveu que a criança no começo da vida
não separa o outro de si e que precisa de um espelho pra regular sua imagem.
Esse espelho é o que diz o outro. Então, quando a imagem vista tem uma boca que
tem uma voz diz "você é isto", a criança se torna aquilo. E começa a
delinear limites e fronteiras se desenham em torno daqueles pensamentos soltos
de imagens.
Mas
isso é só alguma coisa que alguém escreveu há muito tempo e que eu li e agora
falo que foi assim.
Na
verdade, as pessoas são a vida delas. E o jeito de se viver é muito difícil de
escolher.
Eu
tenho cinco dedos na minha mão e quando vou escolher uma saída na hora de ir
embora eu olho bem direto pra minha mão e me divido em cinco pessoas. Cada uma
delas tem um rosto e no rosto tem uma boca e na boca tem uma voz que me atinge
num sobressalto.
Acho
que a vida é uma coisa que não conheço tão bem. Porque ela tem vários rostos e
vozes com mãos que têm dedos e em cada dedo tem uma maneira diferente de
conversar comigo, porque de vez em quando eu vejo as coisas de cabeça pra baixo
e o mundo se torna mais terrível que a vida que é maravilhosa, quando o rosto
que sai da mão é aquela pessoa que você ama. Entende?
Não
queria ficar falando essas coisas da vida que mal entendo. Sou um homem sério
quando estou cansado. Fico irritado e essa é minha maior virtude, porque quando
me irrito fico bravo e adquiro razão.
As
pessoas bravas lutam por ter razão e na maioria das vezes alcançam aquilo que
almejam. Já eu, dócil e mole como uma veia que corre pelo braço, fico só na
espera da picada. Vendo de longe um pássaro que venta e entra pelo buraco da
porta.
Eu não entendo muito a vida. As pessoas ficam falando
coisas, como se eu devesse viver a vida delas. Como se fosse culpado por serem
impossíveis aqueles problemas matemáticos. E eu aqui, querendo ser feliz sem
precisar de me espelhar na forma da vitória. Pensando como derreter aquele
troféu pra trocar em fichas de sinuca.


