O especialista em cafés de qualidade, Hugo Wolff, é proprietário da empresa Wolff Café, provador certificado “Q-Grader”, produtor de cafés especiais oriundos das fazendas de sua família “Portal da Serra” e a “Guanabara” (ambas na região de Ibiraci-MG), além de mestre de torras e barista.
Em entrevista exclusiva ao Jornal do Sudoeste, Hugo contou como está a busca pela mais alta qualidade em cafés na região onde mantém suas lavouras, Ibriaci, que se assemelha às características encontradas nas propriedades de São Sebastião do Paraíso.
Ele conta que o cenário aos produtores de café tem mudado em Ibiraci nos últimos quatro anos por causa da presença de uma cooperativa fair trade que surgiu na localidade, fazendo com que mais produtores estejam buscando melhorias no pós-colheita, a fim de terem lotes melhor qualificados.
Vale lembrar que as transações fair trade têm como objetivo principal estabelecer contato direto entre o produtor e o comprador, desburocratizando o comércio e poupando-os da dependência de atravessadores e das instabilidades do mercado global de commodities.
Na região de Ibriaci, o que vem facilitando a vida dos produtores que querem atingir melhor qualidade com seus cafés foi também o surgimento de microtorrefações. “A torrefação é o elo entre a ponta produtora e consumidora e, para fazer um bom trabalho, precisa ser a etapa mais bem qualificada. Forçosamente quem quer torrar precisa entender de todo o processo”, explica Hugo.
A qualidade
Hugo acredita que investir na qualidade do café é a maneira de agregar valor ao produto, melhorar a renda do produtor e reinvestir na preservação da natureza como um colaborador da qualidade de vida e dos grãos.
Assim ele vê o resultado do trabalho que esses produtores vêm realizando:
“A região tem potencial e está caminhando para se consolidar cada dia mais como produtora de café especial do Brasil”, aponta.
O especialista considera que o clima vai influenciar. “O clima sempre influencia, mas se o produtor tiver os conceitos corretos de nutrição e as técnicas de pós-colheita isso é minimizado. Fazer café especial não é simples. A maior dificuldade está em ser consistente, produzir bons lotes ano a ano. Na última safra não fizemos nenhum lote acima de 84 pontos na escala ‘SCAA’ (veja no quadro o que é isso). Arriscamos mudar os tratos nutricionais e não fomos felizes com essa escolha, apesar da quantidade ter aumentado. Mas saber o que fazer, quando fazer e redefinir as estratégias para um produtor de café especial só faz sentido se ele mesmo souber torrar e analisar sua qualidade”, acredita o produtor Hugo.
Para ele, existem muitas variações que podem influenciar na avaliação final do lote, e o produtor que quer se especializar nesse mercado precisa aprender como se minimizar isso e chamar mais essa responsabilidade para si. Faz parte do negócio.
Muitas propriedades investem em uma produção ultradiferenciada em microlotes, a fim de obter uma qualidade superior com o café colhido neles. Isso torna o investimento menor. Porém, nada impede de o produtor investir em uma lavoura maior, para obter o mesmo resultado de qualidade superior.
“As diferenças entre microlotes e lotes maiores é apenas uma questão de escala. Se o produtor tem infraestrutura e quer produzir lotes maiores com a qualidade de microlotes é possível sim, mas tem que ter processo e conhecimento para tal, pois não seria mais uma questão de acaso para se chegar a um bom resultado, coisa que pode acontecer com lotes pequenos”, diz Hugo.
Importar café
Para Hugo Wolff, o Brasil importar café conillon é “ilógico”. Para ele, isso seria um erro. “Acho que já produzimos muito café e, diferentemente de outros países produtores, temos corretamente leis trabalhistas rígidas e, infelizmente, altos impostos, o que aumenta o custo do produtor. Permitir que cafés mais baratos entrem no nosso mercado é um erro. O Brasil precisa focar no caminho oposto, o da qualidade e valorização dos seus produtores, que a cada dia ficam mais escassos por conta da dificuldade que é empreender aqui”, diz.
Hugo, que conhece as dificuldades do produtor, compara: “O produtor de café, desde o familiar até o industrial, todos são empresários e precisam ter receita que justifique seu negócio. Se nas cidades vemos mais da metade dos negócios fecharem com menos de um ano, imagina a dificuldade do produtor familiar que tem a precificação do seu produto feita pelo mercado e muitas vezes não paga seus custos?”, questiona.
E finaliza: “É ilógico permitir a entrada de café mais barato! A energia, acredito eu, que deva ser gasta por parte dos nossos governantes, se querem aumentar a concorrência para democratizar os preços e qualidade do café no mercado interno é dando suporte técnico aos produtores, reduzindo impostos, aumentando os incentivos e criando leis que nos protejam e estimulem os micro empreendedores locais”.
O que significa a escala ‘SCAA’
O termo “café especial” surgiu em meados da década de 80, com a fundação da SCAA – Specialty Coffee Association of America (Associação Americana de Café Especial) por um grupo de pessoas ligado à indústria do café dos Estados Unidos, preocupado com a perda de consumidores.
Desde os anos 90, quando foram criados os comitês de trabalho, com o objetivo de dinamizar as atividades da SCAA, um deles ganhou particular importância devido à sua missão inicial de criar normas para definir e classificar um café como especial. Esse comitê é o TSC (Technical Standards Committee - Comitê de Normas Técnicas).
Por meio desse comitê, a SCAA estabeleceu completa e consistente codificação para a definição e avaliação de café, introduzindo a chamada “avaliação objetiva”, isto é, quantificando a qualidade do café por meio de uma escala decimal que vai de zero a 100 pontos. Até para o consumidor é muito mais fácil identificar a qualidade de um café com uma pontuação do que por uma expressão técnica como “bebida mole”. Dez diferentes atributos do café são verificados, sendo que individualmente variam de zero a dez pontos.