Com um nó no peito, sinto dizer ser esta a última crônica semanal que escrevo para o jornal. Pelo menos por esse ano.
Tempo é escolha. As escolhas, muitas vezes, são por necessidades ou por preferências, mas temos que fazê-las: o dia tem somente 24 horas, pouco quando há muito que fazer. Minha decisão é por necessidade.
Minha atividade como escritor é algo recente. Começou com um blog familiar onde relatei, para os parentes, cem anos dos acontecimentos de nossa passagem por este mundo. Nunca escrevi, tinha certo bloqueio, mas era o contador dos causos nas reuniões com os irmãos, cunhados e sobrinhos. Para que nossa história não se perdesse, fui instado a deixar registrado para que todos, no presente e no futuro, soubessem as origens e nossas vicissitudes.
Ao escrever o blog, despertou em mim um prazer em escrever, coisa insuspeitada, inesperada. Isto acabou motivando a escrever meu primeiro romance, baseado na história da minha mãe: "Maria Clara, a filha do Coronel". Eu sempre tive a percepção, e falava isso para ela, quando ainda estava conosco, que a vida dela dava um livro. Em realidade deram três. Dividi sua estória em uma trilogia. O segundo já está escrito, o terceiro em elaboração.
No processo de escrever, minha mente viajou, acabando por elaborar uma estória ficcional baseada nos fatos e acontecimentos dos anos 1960, que me marcaram profundamente. Mas não só por isso. Foi uma década que comecei pré-adolescente e terminei em um jovem precocemente com muita responsabilidade, pois, já com dezoito anos, fui nomeado gerente de uma loja de tecidos com mais de seiscentos metros quadrados em Campinas, com um quadro de funcionários com cerca de sessenta pessoas, sendo dez deles homens com idade para serem meu pai.
Imaginem como isto foi impactante em minha formação.
Mas o que marcou profundamente, a mim e a todos que viveram aquela riquíssima década, foram os acontecimentos mundiais que mudaram o mundo e, como não poderia deixar de ser, influenciaram e moldaram a história do Brasil.
Foi, talvez, a década mais rica em acontecimentos revolucionários que mudaram o mundo, contrapondo uma explosão de desejos de mudança dos jovens ao pensamento conservador que marcava o planeta até então.
Após a II Guerra Mundial, houve um crescimento exponencial da população jovem, que veio ao mundo marcada pelos horrores da guerra e certos de que um novo conflito aconteceria a qualquer momento, agravado pelo risco de acabar com a vida na Terra, uma vez que as duas super potências dominantes, Estados Unidos e União Soviética, acumulavam um arsenal de armamento nuclear capaz de destruir várias vezes nosso planeta e a relação entre eles era tensa e carregada de ódio.
Essa realidade levou a juventude a uma inquietude e uma busca desenfreada de novos valores para extravasar suas angústias, ao mesmo tempo em que começava a lutar para sacudir os valores e pensamentos antigos e envelhecidos, na tentativa de impedir a eclosão nuclear. Foi a geração "paz e amor".
A busca por novos conceitos e novas maneiras de viver a vida eram desejos coletivos, contudo os jovens não sabiam exatamente o que queriam nem como fariam as transformações. Já na década de 1950, captando essa agitação juvenil, nasceu o rock and roll, que deu a possibilidade dos jovens manifestar seus sentimentos inconformistas e vontade de viver a vida. Tanto mexeu com os adultos, conservadores, que o ritmo era tido, por estes, como "coisa do diabo".
A revolução cubana, em 1959, elevou o imaginário da mocidade a níveis altíssimos, uma vez que, dizia-se, os jovens barbudos, derrubando a ditadura de Batista, representavam os novos tempos e que, finalmente, o povo tinha chegado ao poder.
Logo depois, em 1961, um jovem charmoso era eleito presidente dos Estados Unidos: finalmente a juventude assumia o poder de um dos dois impérios que dominavam o mundo, com John Kennedy.
A milenar e conservadora Igreja Católica, reconhecendo os sinais do tempo, revolucionou, pelo menos em parte, suas liturgias, permitindo a participação dos leigos na missa, passando a ser falada na língua de cada povo em substituição ao latim, língua que ninguém entendia. E, emblematicamente, a igreja voltava-se aos fies, fazendo com que o padre rezasse a missa voltado para o público, e não de costas como fazia até então. Era o tempo do Concílio Vaticano II.
Ao mesmo tempo em que crescia a participação dos jovens, recrudescia a guerra fria entre comunismo e capitalismo, que disputavam cada país, estimulando guerras locais, sem, contudo, entrarem em confronto direto, que era o que se temia e os falcões, de ambos os lados, ansiavam. Disputavam, também, o domínio dos céus, com as primeiras experiências de colocar um satélite, depois um ser humano em órbita terrestre. Começava a Corrida Espacial.
Estados Unidos e Rússia investiam pesado em novos armamentos e novas tecnologias para, com isso, se sobrepor e manter e ampliar seus domínios.
Vários acontecimentos deixaram a todos em suspense, como a construção do Muro de Berlim; o bloqueio de Cuba por parte dos Estados Unidos, após a descoberta dos armamentos nucleares na ilha de Fidel Castro; a tensão no extremo sul da Ásia e na Coréia; o estremecimento nas relações entre União Soviética e China, que se ameaçavam de invasão; a tentativa da Tchecoslováquia de deixar o bloco do leste europeu; as atividades cubanas levando sua revolução, agora comunista e com apoio soviético, para outros países da América Central e do Sul e a contra-ação americana, tentando impedir.
O que acontecia no mundo, naturalmente, se refletia aqui: a derrubada de João Goulart pelos militares apoiados pelos EUA, evitando, assim, em suas óticas, a implantação de um regime comunista. Começava a ditadura militar e a reação das esquerdas, levando à luta armada.
Dentro desse quadro, conto a estória de dois jovens que se conhecem na escola e, ao mesmo tempo em que vão aprendendo a história da humanidade, vão amadurecendo e sendo influenciados pelos acontecimentos, tomando partido, juntamente com outros colegas, por um lado ou outro, até serem levados ao confronto, enquanto se desenrola um romance entre eles.
Tomei a decisão de autopu-blicar este livro, que batizei de "Cravo Vermelho", devendo lança-lo até o mês de setembro. Naturalmente, terei um trabalho imenso em sua revisão, preparação, lançamento e os contatos com as livrarias. Ao mesmo tempo, estarei escrevendo um novo livro que já está formado em minha mente e revisando outro, que é a continuação do "Maria Clara" que pretendo lançar no primeiro semestre do próximo ano. Por si só, estes três objetivos exigirão uma dedicação enorme do meu tempo, mas, além deles, eu tenho que me dedicar aos meus negócios no ramo joalheiro, atividade que me dá o pão de cada dia.
Com tanta coisa por fazer, terei que deixar certas atividades, uma delas, infelizmente, pois me dava imenso prazer, era escrever semanalmente minha crônica para este jornal.
Não é um adeus, mas um até breve.
* Virgilio Pedro Rigonatti, Escritor, www.lereprazer.com.br rigonatti_pedro@terra.com.br autor do livro “MARIA CLARA a filha do coronel” que se encontra à venda nas livrarias Supertog, Estação do Livro e Livraria Beca