O homem nasce para morrer. Há todo um processo lógico que vai do nascimento, quando se é novo, belo, forte, até a antítese disso, a velhice, quando imperam a fragilidade, a falta de beleza, a degenerescência.
O próprio espírito pode envelhecer. São raros os velhos que continuam dinâmicos e otimistas. Depende da personalidade e da moda, a Geriatria. Florescem clínicas, há remédios milagrosos que retardam o envelhecimento precoce. Na verdade, pessoa bem alimentada, saudável, amada, tem geralmente uma velhice sã, aceitável e até bela.
Mede-se a cultura de um povo pelo modo com que ele trata os velhos. Em geral, é com preconceito, desprezo e escárnio. A televisão e os outros meios de comunicação tornam o problema mais grave. Eles criticam a velhice e enaltecem a juventude, como fórmula mágica de felicidade.
Poucos autores, mesmo entre os da chamada literatura infanto-juvenil, têm um posicionamento mais positivo servindo de antídoto contra esta crítica destrutiva, que nada constrói e não forma na juventude uma consciência lógica, lúcida, para respeitar o passado, os velhos, por razões muito simples: eles são o vivido, o passado, a experiência, a sabedoria, um rico manancial de exemplos.
Entre os “fabliaux” (séculos XIII e XIV), temos a historieta “La Housse Partie”: um pai gasta tudo que tem para dar um rico casamento ao seu filho. Muitos anos depois, instigado pela mulher, o filho expulsa o velho pai, que lhe pede apenas um cobertor, para abrigar-se do frio. O filho manda então seu garoto procurar, na estrebaria, um cobertor (tipo de pelego) para dar ao velho, na sua partida. O menino obedece, mas antes de dá-lo ao avô, corta-o em duas partes iguais. Lamentações do velho, reprimendas do pai. O menino explica: “A outra metade, eu a guardo para o senhor; quando estiver velho e me der todos os seus bens, eu o expulsarei também”. Não é preciso uma análise profunda para compreender a pequena história da Idade Média. O homem, no entanto, animal teimoso, que custa a aprender as lições da vida, séculos e séculos após, não vê que é tolice não aproveitar a experiência dos velhos.
A comprovação dessa assertiva são os asilos que constituem, de certo modo, um mal necessário, mas uma instituição muito deprimente. Os velhos devem ser aceitos, compreendidos, amados, cuidados com carinho e amor, nos seus próprios lares. Eles amam suas raízes, gostam de seu espaço e sofrem, até morrem, quando são violentados, tirados dali ou feitos de joguetes entre os filhos.
Os velhos, santificados pela experiência, marcados pela vida, são criaturas assinaladas. Que sejamos suficientemente sábios e pacientes para reverenciá-los por duas razões incontestáveis: eles são a experiência, a vida passada a limpo e o mais importante, são, no presente, o que seremos, inexoravelmente, no futuro.
(*) Ely Vieitez Lisboa é escritora
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