A juíza da Vara do Trabalho de São Sebastião do Paraíso, Adriana Farnesi e Silva, explica alguns pontos da Reforma Trabalhista, que teve o texto base aprovado pelo Senado na terça-feira (11/7), e sancionado pelo presidente Michel Temer na quinta (13). O projeto de Lei entra em vigor após 120 dias após sua publicação no Diário Oficial da União e, nessa primeira análise, a juíza faz algumas ponderações, sem criticar ou elogiar a reforma. Conforme a juíza, críticos afirmam que a reforma trabalhista reduz os direitos dos trabalhadores e defensores sustentam que ela abrirá caminhos para maior geração de empregos.
É o que destacou o presidente Michel Temer. Em coletiva de imprensa, Temer disse que a reforma representa uma vitória para o Brasil na luta contra o desemprego e na construção de um país mais competitivo. “Nós aprovamos uma das reformas mais ambicionas dos últimos 30 anos. Desde a constituição de 1988, eu fui constituinte, o país aguardava uma nova legislação trabalhista. E é com muita satisfação que eu digo que tive a coragem de propor essa mudança fundamental para o país”, defendeu o presidente.
Para a juíza é importante conhecer a reforma e levar o cidadão à reflexão. “O conhecimento é a chave que liberta. Todos, trabalhadores e empresários, precisam conhecer seus direitos e deveres”, defende. Conforme explica a magistrada, dos doze artigos do Título I - Introdução da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), quatro foram alterados, tendo havido o acréscimo do artigo 11-A com a reforma trabalhista.
“As principais alterações, considerando-se o objetivo aqui proposto, estão nos artigos quarto e oitavo. O caput do artigo quarto da CLT considera serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada. Com a reforma, a esse artigo foi introduzido o parágrafo segundo, que exclui da contagem da jornada, por não ser considerado tempo à disposição do empregador, o tempo que o empregado gastar na troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a troca na empresa”, elucida.
O artigo oitavo da CLT que trata das fontes subsidiárias que as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho podem se valer para decidir como, por exemplo, usos, costumes e jurisprudência, recebeu o parágrafo segundo que dispõe que as súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) não poderão restringir direitos legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.
“Súmulas e enunciados traduzem interpretação reiterada e uniforme sobre normas jurídicas, a partir dos casos concretos levados aos tribunais, trazendo segurança jurídica. O Poder Judiciário não legisla, apenas aplica as leis e, portanto, não pode mesmo restringir ou criar obrigações”, explica a juíza.
Adriana cita como exemplo para maior compreensão o parágrafo quarto do artigo 71 da CLT (que também foi alterado) e dispõe que quando o intervalo para repouso e alimentação não for concedido, o empregador ficará obrigado a remunerar o período correspondente com acréscimo de no mínimo 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
“Sendo o intervalo concedido apenas parcialmente, as decisões judiciais eram divergentes. Alguns entendiam que a expressão ‘tempo correspondente’ da norma referia-se ao tempo total do intervalo. Assim, se um empregado tem direito a uma hora de intervalo e usufruiu apenas 40 minutos, faria jus à remuneração correspondente a uma hora; pois o objetivo da norma, que é proporcionar o descanso necessário à saúde, não foi atingido. Outros entendiam que a expressão ‘tempo correspondente’ referia-se ao tempo suprimido. Assim, o empregado faria jus apenas à remuneração correspondente a vinte minutos, no nosso exemplo”.
Conforme a juíza, também havia divergência quanto à natureza dessa remuneração: se salarial ou indenizatória, ou seja, geraria ou não reflexos sobre outras parcelas trabalhistas, como repouso semanal remunerado e férias. “A Súmula 437 do TST sedimentou a polêmica gerada pela norma jurídica, consolidando o entendimento predominante no sentido de que é devido o pagamento total e não apenas do período suprimido e de que a parcela possui natureza salarial, gerando reflexos. Houve restrição ou criação de obrigação ou mera interpretação da norma jurídica”, questiona.
Conforme explica a juíza, as Súmulas, exceto as do Supremo Tribunal de Justiça, não têm efeito vinculante, ou seja, não são de aplicação obrigatória, mas servem como fonte subsidiária, nos termos do caput do artigo oitavo da CLT e também inspiram os legisladores. Ainda, conforme destaca a juíza, dos 20 vinte artigos do Capítulo II do Título II da CLT que trata da Duração do Trabalho, sete foram alterados e dois foram acrescentados.
“O artigo 71 da CLT que foi alterado na contramão da Súmula em comento, dispondo que a não concessão ou a concessão parcial do intervalo mínimo, para repouso e alimentação, implica no pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. Note-se a expressão ‘com acréscimo de 50%’ e não, ‘com acréscimo de no mínimo 50%’”.
Conforme explica Adriana, o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho – de difícil acesso e não servido por transporte público – e para o seu retorno em condução fornecida pelo empregador deixará de ser computado na jornada de trabalho, nos termos da alteração conferida ao parágrafo segundo do artigo 58 da CLT. “Isso significa que o tempo que um trabalhador rural, por exemplo, fica na estrada, até chegar à fazenda, não será mais remunerado. Ficam as perguntas para reflexão: existiram debates e discussões sociais suficientes? Os interessados participaram ativamente da construção da proposta de reforma? Há ou não déficit democrático”, questiona.
OUTROS PONTOS
Além disto, entre as mudanças da reforma está a questão das férias de 30 dias, que poderá ser fracionado em até três períodos; será possível negociar jornadas maiores de trabalho, de até 12 horas diárias, desde que elas não somem mais de 220 horas mensais (contando as horas extras). Hoje o limite é 44 horas semanais, com no máximo 8 horas de trabalho por dia.
Outra questão apontada da reforma é com relação às ações trabalhista que, pela nova redação, deve dificultar os processos e, segundo críticos à reforma, enfraquecer a Justiça do Trabalho. Pelo texto, se o empregado assinar a rescisão contratual ficará impedido de questioná-la posteriormente. Também limita em oito anos o prazo de tramitação processual. Se até lá a ação não tiver sido concluída, será extinta.
O projeto também prevê uma multa para trabalhadores que ingressarem com ações por “má-fé”, e que o ingresso de uma ação judicial só pode acontecer depois de uma prévia de conciliação entre as partes. Se a ação for mesmo adiante, quem entrar com ação será responsabilizado pelo pagamento de honorários periciais, que normalmente são cobertos pelo poder público. No entanto, não entraram em discussão na reforma questões como o direito de greve, normas de segurança; FGTS; salário mínimo; licenças-maternidade e paternidade; e aposentadoria, entre outros pontos.