Projeto de lei irá beneficiar deficientes visuais

Por: Redação | Categoria: Arquivo | 13-10-2002 00:00 | 1309
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As editoras brasileiras poderão ser obrigadas a imprimir em braile 0,5% dos livros e revistas de grande circulação que publicarem. É o que determina o projeto da senadora Heloísa Helena (PT-AL) que aguarda, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), relatório do senador Sebastião Rocha (PDT-AP) para ser levada à apreciação da Câmara. Em São Sebastião do Paraíso, a pedagoga Neuzi Marques de Pádua, comenta a importância da iniciativa e aproveita para ressaltar a necessidade de projetos como esse.
Neuzi trabalha na Escola Especial Mariana Marques como pedagoga especializada em Educação Visual. Ela conta que atualmente trabalha com crianças portadoras de problemas visuais permanentes. Para a pedagoga, o projeto de Heloísa Helena é muito interessante. " O material especializado para crianças com deficiência visual é muito caro. Muitas vezes só é possível utilizá-lo através de associações que representem essas pessoas ou por intercâmbio entre as escolas. Desta forma, as crianças acabam ficando sem saber ler e escrever em braile, o que é uma pena. Se esse projeto for realmente colocado em prática, o acesso será mais fácil e todos eles terão uma vida melhor, " afirma.
Há muito tempo trabalhando pela APAE, Neuzi observa que a maioria da população, e principalmente a mídia, acaba excluindo essa parcela de habitantes que só pode contar com a boa vontade alheia para descobrir o que se passa no mundo. "Uma coisa que muitas pessoas desconhecem é o quanto é importante para um jovem com deficiência visual ouvir as pessoas lendo um texto sobre seu cantor favorito ou até mesmo uma previsão de horóscopo, " enumera.
A proposição da senadora Heloísa Helena prevê um período de três anos para que as editoras viabilizem as publicações em braile. "Acredito que basta ter vontade por parte dos grandes editores. Em questão de recursos humanos, será facilmente possível, já que os cegos poderiam trabalhar na conversão dos textos comuns para o alfabeto braile. Por outro lado, o material necessário para a fabricação dessas edições só seria dispendioso no ato da compra, já que a manutenção é fácil e há o apoio das escolas especializadas. Em Minas, um grande exemplo é a Escola São Rafael, situada em Belo Horizonte, " salienta.
Maior interessada
Uma das alunas de Ne-uzi, está especialmente feliz com a possibilidade do projeto se tornar uma realidade. Maria da Glória Neris de Jesus tem 21 anos de idade. Completamente cega desde que nasceu, a jovem conta que permaneceu na única escola completamente voltada para deficientes visuais de Minas Gerais por apenas seis meses. "No Instituto São Rafael, aprendi a ler e escrever em braile, mas quando vim morar com a minha mãe em Paraíso, acabei esquecendo," conta.
A mãe de Maria da Glória, Aurora Maria de Jesus, natural de Salinas, no norte do Estado, mora em Paraíso com a família há sete anos. Afirma que a filha está sempre buscando informações, e acredita que quando virar realidade o projeto da senadora, tudo ficará melhor. "O único problema que a minha filha tem é na visão. Fora isso, ela é absolutamente normal e ler e escrever para ela é muito importante," ressalta.
Especialista na tecelagem de tapetes, a jovem espera que a teoria seja logo colocada em prática. "Na maioria das vezes, tenho que pedir para os outros lerem para mim. E eles nunca têm tempo. Acho que cada cidade deveria ter uma escola especializada em deficientes visuais. Assim, a gente que não sabe ler poderia aprender a trabalhar e ganhar dinheiro como qualquer cidadão, " lembra.
Convivendo juntas desde o início do ano, professora e aluna concordam que a iniciativa da senadora poderá melhorar a vida de cerca de 374,1 mil alunos matriculados nos diversos níveis da educação que são portadores de dificuldades visuais. "Eu acho incrível! Através da Maria da Glória imagino a imensa satisfação que tantas crianças como ela terão ao poder ler um jornal normalmente. Espero sinceramente que haja mais iniciativas como essa em todo o País," conclui Neuzi. 

Saiba mais sobre a Escola São Rafael
Em 1922, João Gabriel de Almeida, após concluir estudos no Instituto Benjamim Constant voltou a Diamantina, sua terra natal.
Aires da Mata Machado, percebendo no conterrâneo o desejo de fazer alguma coisa em favor dos cegos, uniu-se a ele e juntos foram a Belo Horizonte, pleitear dos poderes públicos a fundação de um educandário para cegos.
Eram dirigentes políticos da época: Dr. Raul Soares, governador, Dr. Mário Brant, secretário das Finanças e Sandoval de Azevedo, Secretário do Interior a quem levaram suas idéias e de quem receberam todo apoio necessário.
Foi rápido o projeto e a tramitação para a fundação da Escola Especializada. Instituto São Rafael foi o nome sugerido, inspirado no Arcanjo Rafael, guia de Tobias, o cego.
É importante destacarmos aqui o significado do papel da E.E. São Rafael na expansão e melhoria da educação do aluno portador de deficiência visual em Minas Gerais.
O Instituto tinha, no começo, os cursos primário e ginasial, o Curso Musical, com Teoria da Música, Instrumentos e Cantos e três oficinas pedagógicas. Conseguiu, já no início, alto nível de ensino, tanto no aspecto acadêmico quanto no artístico.
Às vésperas dos 75 anos, o São Rafael conta com estrutura ampliada, em duas modalidades de atendimento - internato e externato, com alunos em todas as faixas etárias. São 390 estudantes. Os cursos vão da pré-escola ao segundo grau, sendo que o Ensino Médio não é oferecido apenas para deficientes visuais.
Outros serviços também estão disponíveis, como a estimulação precoce, para crianças de 0 a 3 anos, orientação e mobilidade, oficinas pedagógicas e serviço de apoio itinerante, para ajudar as escolas comuns que têm alunos deficientes.
Há mais: imprensa braile, central de informática, braile para adultos. A luta principal dos diretores continua sendo pela integração dos deficientes visuais na sociedade por meio da preparação para a educação e o trabalho. A escola conta, para suprir suas necessidades, com o apoio de organizações como a Associação de Amigos do Instituto São Rafael.
A entidade, que registra como um de seus grandes momentos a visita de Monteiro Lobato em 1937, apresenta com, orgulho a "Banda Visão Zero" e o "Forró no Escuro", grupos que fazem sucesso em festas na capital e no interior. E sua aluna mais famosa destaca-se no esporte, o Instituto São Rafael revelou a atleta Ádria Santos.