Lewis Hamilton é fã confesso de Ayrton Senna. Nunca escondeu isso. Mas poucas vezes vi um fã lembrar o ídolo. Hamilton é um desses casos. Ele faz lembrar Senna!
Dois exemplos recentes ainda vivos na memória os GPs da Bélgica e da Itália. Em Spa-Francorchamps não havia a menor chance de conquistar a pole diante da força do motor Ferrari nas longas retas e subidas do lendário circuito belga. Mas a chuva que molhou a pista no Q3 desmanchou o favoritismo da Ferrari e Hamilton cravou a pole. Na corrida, com o asfalto seco, não teve muito que fazer e terminou em 2º.
Domingo passado, em Monza, foi outro exemplo da capacidade de Hamilton em trabalhar a desvantagem técnica e convertê-la em vitória. Claro que para isso tudo tem que sair perfeito, tanto do piloto como da equipe. E contar com a sempre bem-vinda ajudazinha do adversário. Com Senna a coisa também funcionava assim.
As chances de vencer o GP da Itália eram remotas. A nova atualização do motor Ferrari que estreou na Bélgica aumentou a diferença que, segundo comenta-se no paddock da Fórmula 1, era cerca de 40 cavalos de potência a mais que a versão que a Mercedes havia estreado na França. E Monza, não só por ser a casa da Ferrari, é a pista mais veloz do campeonato. Logo a Ferrari tinha todo o favoritismo com os dois carros na primeira fila do grid com Raikkonen na pole e Vettel em 2º. As apostas em Hamilton provinham da possibilidade de chuva que não caiu.
Mas Hamilton venceu. Foi uma das vitórias mais espetaculares de sua carreira, bem ao estilo Senna. Quem viu o brasileiro correr sabe do que estou falando. Ayrton sabia como ninguém driblar o favoritismo dos adversários com uma pilotagem implacável sem cometer erros. O ano de 93 em que tinha uma McLaren ‘capenga’, empurrada por um motor Ford V8 defasado em relação ao mesmo propulsor que equipava a Benetton de Schumacher, Senna deu trabalho para Alain Prost que tinha um supercarro da Williams. Senna ganhou 5 corridas e terminou como vice-campeão.
A Mercedes de Hamilton não é ‘capenga’ como aquela McLaren de Senna, mas bater a Ferrari em Monza era improvável em condições normais de corrida. No vacilo de Vettel em atacar Raikkonen, Lewis foi agressivo sem ser desleal quando os dois se tocaram e Vettel levou a pior ao rodar e cair para a última posição.
Num campeonato apertado como o deste ano, quem tinha mais a perder ao dividir a segunda chicane ainda na primeira volta era Vettel, que cometeu mais uma falha como nos GPs do Azerbaijão, França e Alemanha.
Sem o principal adversário no caminho, entrou o trabalho de equipe. Primeiro a Mercedes induziu a Ferrari numa pegadinha de pit stop, e Raikkonen foi cedo demais para a troca de pneus. Quando Hamilton fez a sua troca (8 voltas mais tarde), retornou 6s atrás de Kimi que ficou preso atrás de Valtteri Bottas que ainda não havia parado. Esse jogo de equipe da Mercedes, muito bem executado por Bottas, permitiu a aproximação de Hamilton e acelerou o desgaste dos pneus de Raikkonen que não teve como se defender do ataque certeiro de Hamilton.
Não se trata aqui comparar o piloto da Mercedes com Ayrton Senna. Mas há algo além do fato de Lewis ser apenas um fã: a mesma sede de vitórias. Senna jamais desistiu de lutar mesmo quando não tinha carro para vencer. E Hamilton também segue essa linha de implacável e preciso.
Volta voadora
A pole position de Kimi Raikkonen em Monza com a média de 263,587km/h foi a volta mais rápida da história da Fórmula 1.