No último final de semana teve início a quinta temporada da Fórmula E, edição 2018/2019 do Campeonato Mundial de carros elétricos. A prova de abertura foi em Ad Diriyah, na Arábia Saudita, e chega a ser cômico uma corrida de carros movidos a eletricidade correr na terra do petróleo, e pasmem, choveu no deserto(!) na hora da classificação. São coisas do automobilismo, no final deu tudo certo, foi uma boa corrida, movimentada desde a largada e que terminou com a vitória do conceituado piloto português, Antonio Felix da Costa, que já bateu na trave algumas vezes para ingressar na Fórmula 1, mas sempre faltou algo para que tivesse uma chance.
Muito se fala que a Fórmula E é o futuro do automobilismo. Na mesma direção, a MotoGP estreia em 2019 o seu campeonato de motos elétricas (MotoE) que terá o brasileiro Eric Granado no grid. Mas está muito longe ainda o dia em que o esporte a motor se renderá em sua totalidade ao segmento elétrico. Por mais que haja tendência mundial em restringir o uso de combustíveis fósseis nos veículos de rua, os motores a combustão ainda vão queimar muito combustível, principalmente nas pistas.
Não se pode negar o crescimento da Fórmula E. A categoria surgiu com certa desconfiança no final de 2014. Soou estranho ver aqueles carrinhos esquisitos correr sem fazer barulho. Aliás, esse é um dos obstáculos que a categoria enfrenta para atrair o interesse dos chamados “fãs puristas” do automobilismo que não conseguem digerir uma corrida de carros sem o barulho do motor.
Uma das grandes reclamações desde que a Fórmula 1 trocou os motores aspirados pela nova geração dos V6 turbo híbridos, foi o abafamento do som. Antes, o ‘grito’ dos V8 arrebentava os tímpanos, e era um grande barato. Em minha experiência com o automobilismo, eu nunca ouvi de quem viu de perto pela primeira vez uma corrida de Fórmula 1 dizer que o que mais lhe havia impressionado fosse outra coisa senão o barulho do motor.
Com os complexos e sofisticados motores atuais da Fórmula 1, chamados de “unidades de potência” por serem formados por um conjunto de seis partes: o motor de combustão, a turbina, os dois sistemas de recuperação de energia: cinética (MGU-K), e térmica (MGU-H), as baterias que carregam a parte híbrida, e a central de gerenciamento, o som perdeu qualidade, embora ainda faça barulho, mas longe de ensurdecer como era até pouco tempo.
A Fórmula E apresentou uma nova geração de carros, com visual mais agressivo, aceleração de 0 a 100 em 2.8 segundos (o F1 leva 2.4s de 0 a 100, mas as semelhanças param por aí), velocidade máxima de 280km/h, e agora equipados com baterias que dão autonomia para uma corrida inteira, sem a necessidade de trocar de carros, que, se por um lado mexia com a estratégia de corrida, por outro soava estranho o piloto entrar nos boxes e saltar de um carro para o outro. Há um envolvimento crescente de montadoras gigantes da indústria automobilística envolvidas com a categoria de carros elétricos. A F-E começa a ser para elas o mesmo laboratório de desenvolvimento tecnológico que a F-1 representou nos seus primórdios tempos. Mas apesar de todo o crescimento da nova categoria, eu não vejo os elétricos como ameaça ao futuro das competições com motores de combustão. Muito menos à Fórmula 1 que sempre foi e continuará sendo a essência do automobilismo.
Vejo a Fórmula E apenas como um jeito diferente de fazer automobilismo, com propósitos e tecnologias diferentes, e que precisa, na visão deste colunista, corrigir uma bobagem adotada nesta temporada, o chamado “modo de ataque”, em que os pilotos têm de sair do traçado ideal e passar sobre um determinado ponto da pista que lhe dá 25kw a mais de potência, ‘algo como ganhar uma vida nos videogames’. É algo extremamente artificial e desnecessário, que tira o sentido da corrida e fere a essência do esporte. Fora isso, é uma categoria em ascensão, que tem atraído pilotos importantes, como Felipe Massa e Stoffel Vandoorne, os mais recentes que deixaram a F-1, mas sem ser ameaça à principal categoria do automobilismo. Há espaço para todos.
Feliz Natal!