A jornalista e advogada Raissa Bugança Pereira foi uma dos poucos paraisenses que conseguiram ser aprovados no concurso da Câmara Municipal de São Sebastião do Paraíso. Ao lado do advogado Diego Alceu Farinon, ela integra a equipe de assessoria jurídica da Casa Legislativa do município e, conforme ela mesma conta, tem sido uma experiência bastante enriquecedora e um trabalho muito diferente do que estava acostumada. Filha da professora Ana Maria da Costa Heto e do bancário aposentado João Bugança, casada com o advogado e músico Péricles, Raissa, aos 33 anos, agora vive uma fase tranquila após mais de cinco anos transitando entre Paraíso e Mococa para trabalhar.
Jornal do Sudoeste: Sua primeira formação é em Comunicação?
R.B.P.: Sim, foi minha primeira formação. Eu queria algo voltado para a área de Letras, gostava muito de ler e escrever, mas não queria dar aula. Porém, quando eu já estava no segundo ano de faculdade, comecei a dar aula de informática e redação no Colégio Paula Frassinetti. Como já estava no meio do curso, não queria trancar e mudar para outra coisa, então terminei, fiquei um ano parada e decidi estudar Direito. Estudei dois anos e meio aqui em Paraíso, mas logo tranquei porque eu tinha prestado concurso para o Banco do Brasil e fui trabalhar em Campo do Meio, próximo a Varginha, onde fiquei quase dois. Após, retornei para a região e concluí meu curso. Foi uma rotina muito tumultuada esses anos todos. Agora estou nesta fase mais tranquila, mas desde 2012 que não trabalhava em Paraíso.
Jornal do Sudoeste: Como foi a infância e adolescência em Paraíso?
R.B.P.: Sou a filha caçula, tenho outros dois irmãos, então foi uma fase muito tranquila e acho até que fui uma criança um pouco mimada porque nunca precisei sofrer para ter o que eu queria. Estudei em colégio particular a vida toda e não tenho lembranças tristes da infância. Além disso, sempre fui uma pessoa muito calma e tranquila e não dei trabalho para os meus pais. Sempre gostei de estudar e toda essa minha fase foi no Colégio Paula Frassinetti, onde minha mãe inclusive dava aula. Nunca peguei recuperação, nunca fiz prova final de faculdade, dependência, mesmo porque minha mãe cobrava isto e qualquer coisa que acontecia no Colégio, por exemplo, os professores já falavam direto para ela. Em casa via minha mãe estudando e queria estudar também; e sempre gostei muito de ler e estudar as matérias que eu tinha mais afinidade, como Língua Portuguesa e Matemática e matérias como História e Geografia, que tinha mais dificuldade, estudava o suficiente para pegar média. Porém, sempre mantive uma rotina de estudo e é um hábito que ainda mantenho e, embora as matérias de concurso sempre sejam afins, sempre há algo novo para aprender.
Jornal do Sudoeste: Quando terminou o Ensino Médio, já decidiu fazer uma faculdade?
R.B.P.: Não. Quando eu era criança tinha os sonhos de ser astrônoma e quando descobri que precisava estudar Física, acabei desistindo desta ideia e fiquei sem saber o que eu queria. No Ensino Médio todo mundo quer ser médico, e acho até que cheguei a prestar vestibular para esta área. Também prestei vestibular para Direito, tive conhecimento que abria turma para Jornalismo em Passos, mas não sabia o que eu queria. Então, durante um ano quis começar a trabalhar e fiz cursinho; lembro que meu primeiro emprego foi no Bom Trabalho. Acho que talvez se eu tivesse feito Letras, teria me sentido mais feliz, apesar de que a faculdade de Jornalismo foi muito legal, mas não era algo com a qual eu queria trabalhar porque, apesar de gostar de escrever, eu era um pouco tímida.
Jornal do Sudoeste: E o Direito, o que a motivou?
R.B.P.: Não pensava em advogar (hoje é algo que eu quero) e não sabia se queria fazer Direito ou não, mas como comecei a prestar concurso resolvi fazer o curso e foi na faculdade de Direito que um dos professores me ensinou a estudar de verdade – hoje ele já não está mais aqui – e tomei mais gosto por isso. Lembro que o primeiro concurso que passei foi da Prefeitura, em 2012, para o cargo de Fiscal Urbanista, e quando comecei saiu o resultado do concurso que eu havia prestado para o Banco do Brasil e fui chamada. No BB eu trabalhava seis horas por dia, e estudava para o concurso do Tribunal de Justiça de São Paulo, para o cargo de escrevente técnico judiciário, passei em dois e decidi ir para Mococa, que era mais perto de Paraíso. Lá eu tinha mais flexibilidade com horários e meu chefe sempre me liberava para estudar, foi o mesmo chefe que me orientou a tirar férias para estudar para o Concurso da Câmara.
Jornal do Sudoeste: Não foi muito difícil ficar indo e voltando de Mococa?
R.B.P.: Era difícil, mas nunca aconteceu nada e durante esse tempo nem cheguei a ver aci-dentes na estrada. Quando estava finalizando meus estudos, cheguei a pensar que formaria e depois me mudaria, mas como meu marido é advogado aqui, de todo jeito teríamos duas casas ou alguém enfrentando estrada; como homem é mais imprudente na estrada, preferi eu fazer essa rotina. Mococa fica a mais ou menos 1h de Paraíso e a condição das estradas é boa, mas mesmo assim é arriscado e fui muito abençoada por não ter sofrido nada.
Jornal do Sudoeste: E sobre o concurso da Câmara?
R.B.P.: Era a oportunidade que eu queria e quando soube já comecei a intensificar meus estudos novamente, nunca parei de estudar. Era a minha chance porque aqui eu teria uma carga horária de quatro horas para ganhar próximo ao que eu recebia em Mococa para uma carga de oito horas sem contar o deslocamento. Então estudei muito. Tirei férias em agosto e estudava de manhã, tarde e a noite. Antes de começar, fazia academia, no final da tarde fazia caminhada com a minha mãe para descansar um pouco a cabeça, e começava a estudar novamente à noite. Apesar de parecer pouca coisa no edital, não deu tempo de estudar tudo e houve temas que passei o olho no conteúdo na véspera e foi cobrado na prova. Quando saiu o gabarito cheguei a pedir recurso de quatro questões que eu não concordei e todas elas foram deferidas. Na redação também cheguei a pedir recurso porque um dos itens que era “estruturação do texto argumentativo-dissertativo”
Jornal do Sudoeste: Foi uma surpresa ser chamada pela Câmara de Paraíso?
R.B.P.: Foi porque o concurso foi homologado e não sabíamos quando seríamos nomeados ou quando começaríamos. Na época, como eu trabalhava em um fórum, não tinha como pedir OAB porque seria uma atividade incompatível com a qual eu atuava; para isto eu teria que pedir exoneração, o Tribunal teria que publicar para eu poder pedir a OAB para tomar posse do cargo. E isso tudo demora, e foi logo no final do ano, quando tudo está parado e eu não sabia o que faria, porque o concurso tinha a validade de dois anos prorrogáveis para mais dois. Mas no final acabou dando tudo certo e fui nomeada e tomei posse no início de fevereiro. Nós achávamos que seria pouca coisa, mas o trabalho já começou com tudo: ação de Prefeitura, cassação de vereador, vereador pedindo para ser investigado, coisas que eu nunca imaginei que veria na vida.
Jornal do Sudoeste: Você estranhou o contato com o Direito Legislativo?
R.B.P.: Bastante. É algo que precisa estar o tempo inteiro estudando e são questões que têm dois, três até quatro entendimentos e às vezes você precisa pegar um entendimento que cabe em determinado caso da Câmara de Paraíso neste momento; e às vezes as leis, que precisamos dar um parecer, são questões que nem chegamos a ver na faculdade e outras que passamos por cima e aqui precisamos nos aprofundar. Cada dia é uma coisa diferente, o que é muito bom por ser dinâmico e é o que eu buscava, estava cansada do meu antigo emprego porque era sempre a mesma coisa; acordar sabendo o que vai acontecer. Chega uma hora que cansa muito.
Jornal do Sudoeste: E quais são seus planos com sua nova função?
R.B.P.: Atualmente faço pós-graduação pela UFLA em Gestão Pública Municipal; é algo que veio a calhar, mas não foi intencional. Quando abriu inscrição para a Universidade Aberto do Brasil, o polo de Paraíso, em Pedagogia e em Gestão Pública Municipal, na época a vaga era sorteada, saiu o primeiro sorteio e não estávamos, deixamos um pouco para lá, quando saiu o terceiro sorteio fui contemplada e as aulas tinham começado em julho e estávamos em setembro, então já havia muita atividade atrasada para colocarmos em dia. Agora está na fase de começar a fazer TCC; os dois primeiros que fiz, em Jornalismo e Direito, este último inclusive ganhei prêmio por ele, amei fazer.
Jornal do Sudoeste: O Direito não é estático e passa por muitas mudanças, como você avalia as mudanças dos últimos anos?
R.B.P.: Tenho notado muitos retrocessos como, por exemplo, mudanças na legislação trabalhista. Hoje, o empregado que se vê em situação ruim ele nem pode entrar na justiça porque se perde tem que pagar; está muito complicado e se continuar assim, daqui uns dias não vamos mais ter Justiça do Trabalho por causa disto. As pessoas agora têm que se submeter a vontade do patrão porque ou tem emprego ou tem direito e não as duas coisas, e isso está errado. Cada dia mais, advogados estão desvalorizados e falo que minha sorte é a renda fixa, caso contrário acho que jamais viveria da profissão de advogado.
Jornal do Sudoeste: Qual o balanço que você faz dessa trajetória?
R.B.P.: Estou colhendo os frutos de todos esses anos de estudo; estou nesse caminho desde 2012, foram alguns concursos nesse período e esse da Câmara foi o primeiro de Ensino Superior que eu passei e valeu muito a pena. Mesmo assim, antes disto fui colhendo pequenos frutos até chegar aqui, não sei ainda se é onde estarei daqui a dez anos, mas por enquanto estou muito feliz, estou estudando muito e não quero parar. Quero também ter um tempo para mim, porque isso também é importante e a vida não é só trabalhar.