Vinte e três de fevereiro de 2019. Como as coisas acontecem?! Assim, de repente, a Espada de Dâmocles despenca sobre nossa cabeça?! Aparentemente algo simples, comum. Na realidade, novo, único. Sábado, catorze horas, almoço, novidade gastronômica, prato italiano, calzone, comprado na Loja de Conveniência, no Posto de Gasolina que abastece o Condomínio. Resolve-se que era a hora da siesta. Aí aconteceu. O quê? Realidade ou fantasia?
De repente uma cortina negra, espécie de anestesia geral, tomou-me. Aplicada por quem? Deus ou o Diabo? Três horas de um sono pesado, sem sonhos ou pesadelos. Como se eu morrera durante aquele período. Acordei (voltei à vida?!) A casa participou. As cachorras não latiram, as gatas não miaram. Gerald, o galo índio, não veio cantar esganiçado, na porta do quarto. A gatinha Nininha não apareceu arranhando a porta, com miado suplicante e olhos pidões, quando quer algo. Olho para a porta do quarto. Meu marido diz: Acordou? Era hora...Aos poucos fui voltando à realidade. Perguntei-lhe, meio aérea: Por que levantou tão cedo? Olho o relógio. Seis horas. Penso que é de manhã. Ele alerta: É sábado ainda. Já almoçamos e você dormiu três horas, sono pesado. Fiquei perplexa. Levei alguns segundos para entender o que se passava. Fiquei fora do mundo durante três horas, da maneira mais bizarra possível. A vida parou, o silêncio caiu sobre a casa, sobre mim, como um manto negro. Onde estive?! Aí veio a revelação. A morte, a morte é assim. De repente, o nada, como uma vela que se apaga. Levei alguns segundos para entender o que se passava. Ficara fora do mundo da maneira mais bizarra possível. A vida parou. Todas as dúvidas, os questionamentos, perguntas e respostas claras e evidentes. Não há depois. Não há cobranças. Apenas o nada, o fim. Ao invés de me amedrontar, veio uma grande paz. O fim é bom. O fim é silêncio, descanso e paz.
Comentei com meu marido o acontecido, ele confessou que já passara pela experiência algumas vezes, essa fuga da realidade. Por isso não o assustava mais. Para mim, não. O fato era enriquecedor e inusitado. Surgiram perguntas complexas. Então, o futuro, a morte são o nada. Sem Deus, sem o Diabo, sem cobranças, sem retornos.
Algumas horas depois fiquei totalmente em paz. Gostei do acontecido, como se fora uma epifania, um privilégio. Estou bem de saúde, quase curada de um problema grave, mas não muito. Aproveitei a volta da lucidez e aí aconteceu algo controverso: tive necessidade de conversar com os santos de minha predileção, meus mortos queridos, com a linda e sorridente guru, a Gurumay, no retrato à beira de minha cama, presente de Magda e sua fé inabalável.
Terei ainda, com certeza, algum tempo, ou talvez muito, pela frente, para novas descobertas e bastante lucidez para analisá-las. Ao invés de medo e tristeza, senti-me privilegiada. Nem todo mundo recebe um telegrama do lado de lá. Um e-mail? Um recado? Agradecer a quem? Desconheço o remetente, mas a destinatária ficou muito agradecida.
Toda elucidação é muito bem-vinda. Espero que a mensagem veio com bastante antecedência. Essas descobertas me encantam. Vou pensar muito nessa data, no acontecido. Não é sempre que se recebe um presente desses, uma elucidação, uma luz.
(*)Ely Vieitez Lisboa é escritora.
E-mail: elyvieitez@uol.com.br