Por Michelle Lopes
No texto de hoje, propomos refletir sobre o papel das Ciências Humanas em uma sociedade, bem como sua importância para que os convivas possam compreender melhor as relações sociais que se desenvolvem a cada época.
Ao grande público, parece que as Ciências dividem-se basicamente em dois grandes grupos: de um lado, encontram-se as ciências "incontestáveis", para quais os leigos voltam seus olhares de admiração e sequer se atrevem a contestar seus pressupostos; nesse grupo podemos encaixar a Matemática, a Física, a Química e até mesmo a Astronomia. Para as ciências desse grupo, não há qualquer indagação quanto a sua necessidade, obviamente, porque todos nós compreendemos facilmente a importância de sua contribuição para as grandes descobertas da humanidade: desde o uso da eletricidade até as vacinas contra doenças perigosas. Por isso, para o grande público, é nessas ciências que se encontram as pessoas mais inteligentes e seus cientistas podem ser até mesmo cultuados.
Do outro lado, podemos dizer que num espaço com bem menos privilégios e com menor reconhecimento do grande público, estão as Ciências Humanas: a Linguística, a Filosofia, a História, a Sociologia, e muitas outras; juntas, essas ciências tratam, de modo geral, da constituição histórica de uma sociedade e da qualidade da existência humana. Nesse conjunto de ciências, o homem é, ao mesmo tempo, o objeto e o objetivo dos estudos e, assim sendo, as ditas humanidades são responsáveis por construir, dentro de uma sociedade, os espaços de pensamento livres, o debate das ideias e a discussão sobre valores preponderantes para a boa convivência social.
Apesar da relevância de suas pesquisas, a pouca compreensão dos estudos das humanidades pelo grande público faz com que os cientistas dessas áreas sejam, de certa forma, desdenhados e/ou, ainda, não sejam considerados cientistas, tampouco sua contribuição seja valorizada. Às Ciências Humanas falta o prestígio social. Esse baixo reconhecimento torna-as suscetíveis a todo tipo de indagação e de acusação de leigos e de amadores.
Em um mundo informatizado, fragmentado pela agilidade e imediatismo midiáticos, às Humanidades cabe problematizar, por exemplo, a superficialidade das relações desenvolvidas em uma rede social, o excesso de informações rasas, o bem-estar artificial proporcionado pelo consumo. Em se tratando especificamente das ciências da linguagem, cabem, além das reflexões sobre o ensino e aprendizagem da língua materna e das estrangeiras, as indagações sobre os enunciados veiculados nas grandes mídias e nas campanhas publicitárias, a produção e a circulação dos sentidos na sociedade e os reflexos deles para a estrutura social e as relações entre os sujeitos.
Para além do jargão mercadológico do "agregar valor", as Ciências Humanas empenham-se em "cultivar valores", porque plantam ideias, observam o desenvolvimento de novos hábitos, regam as discussões sobre o modo como olhamos para nós mesmos e para os demais, fertilizam o terreno do saber e abrem novos espaços de fala. Por tudo isso, a escritora, professora e crítica literária brasileira, Leyla Perrone-Moisés afirmou que os estudos das humanidades "servem à vida tanto quanto a pesquisa sobre o genoma". Nós nos atrevemos a completar os ditos da professora concluindo que as humanidades é que nos fazem mais humanos, por isso são fundamentais para a vida humana contemporânea.
MICHELLE APARECIDA PEREIRA LOPES:
Doutora em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos e pesquisadora da constituição discursiva do corpo feminino ao longo da história. É docente e coordenadora do curso de Letras da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade de Passos.