POLEPOSITION

O retorno de Lauda

Por: Sérgio Magalhães | Categoria: Esporte | 02-06-2019 17:50 | 3606
41 dias após escapar da morte, Lauda estava de volta ao cockpit da Ferrari, em Monza
41 dias após escapar da morte, Lauda estava de volta ao cockpit da Ferrari, em Monza Foto: Arquivo / Pole Position

Niki Lauda estava quase morto no hospital após sair milagrosamente com vida do que restou da Ferrari em chamas do acidente de Nurburgring, em agosto de 1976.

A disputa pelo título daquele ano estava restrita a Lauda e James Hunt, da McLaren. Ainda no hospital, o austríaco recebeu extrema-unção de um padre e sabe-se lá como, 41 dias depois de sofrer graves queimaduras no rosto e inalar fumaça tóxica, Lauda estava de volta não só ao mundo dos vivos como ao cockpit da Ferrari para o GP da Itália, em Monza.

Era uma época em que as coberturas de Fórmula 1 não tinham a abrangência que se tem hoje, e talvez por isso, a mais insana das atitudes já tomada por um piloto, acabou virando heroísmo de Lauda. Tinha que ser corajoso ao extremo alguém que ainda com o rosto desfigurado e a cabeça envolvida por faixas de curativos, entrar num carro de corrida numa época em que a segurança apenas engatinhava pelas retas e curvas das pistas por onde a categoria passava.

Lauda queria voltar logo porque ficar na cama pensando no que havia acontecido o prejudicaria ainda mais, não no campeonato, mas o lado psicológico. E acelerou ainda mais o desejo de retornar às pistas quando soube que a Ferrari havia contratado como seu substituto, o argentino Carlos Reutemann, a quem Lauda não nutria simpatia.

Foram horas intensas de fisioterapias e massagens para estar em condições de pilotar novamente. Neste ínterim, Lauda disse ter descoberto o quanto amava as corridas.

Na Ferrari, todos ficaram assustados quando ele apareceu na fábrica, em Maranello, 38 dias após o acidente e disse que estava pronto para correr. Poucos acreditavam que seu retorno fosse possível ainda naquele ano. A equipe ficou de saia justa e foi preciso inscrever um terceiro carro para Reutemann que estava inscrito para a corrida ao lado do outro piloto da Ferrari, Clay Regazzoni.

Enquanto Lauda se recuperava, Hunt somou 21 pontos e diminuiu para apenas 2 a vantagem do austríaco que ainda era o líder do campeonato.

Na sexta-feira choveu em Monza, e Lauda provou de sua fragilidade até então desconhecida: “Quando entrei no carro veio um medo tão grande que toda a motivação foi para o espaço”, revelou somente anos depois já que não podia demonstrar qualquer desconforto. Se demonstrasse, estaria entregando o ouro para o bandido(!). A sua ‘cora-gem’ era um tiro certeiro na guerra psicológica contra Hunt.

Lauda foi buscar forças no quarto do hotel e no sábado fez o 5º tempo, melhor que os outros dois companheiros de equipe. Um tremendo golpe em Hunt que ainda foi punido por conta de irregularidades no combustível da McLaren e teve que largar das últimas posições.

No domingo Lauda fez corrida sólida e terminou em 4º. Quando tirou o capacete, a balaclava (máscara anti-chamas) estava encharcada de sangue e as feridas abertas no rosto e na cabeça.

Os três pontos do GP da Itália ampliaram para 5 a vantagem sobre Hunt que não terminou a corrida. E no final do ano Lauda perderia o título por um ponto (69 a 68) por tomar outra atitude corajosa, desta vez ao recusar correr nas condições precárias do chuvoso GP do Japão.

A rivalidade entre Niki Lauda e James Hunt foi parar nas telas dos cinemas com o filme “Rush”, um dos melhores do segmento já produzido, e também nas páginas do livro “Corrida para a glória”, de Tom Rubython.

Por tudo isso e muito mais, Andreas Nikolaus Lauda, ou simplesmente, Niki Lauda, se tornou figura tão emblemática e que deixou um grande vazio na Fórmula 1.