LÍNGUA SOLTA

É fake ou não é fake? Quem sabe o letramento digital possa nos ajudar nisso...

Por: Michelle Aparecida Pereira Lopes | Categoria: Cultura | 25-06-2019 19:02 | 1825
Michelle Aparecida Pereira Lopes
Michelle Aparecida Pereira Lopes Foto: Reprodução

O texto de hoje retoma as discussões sobre a leitura - já falamos sobre a história da leitura e do livro - agora, para ampliar as reflexões anteriores, falaremos um pouco do letramento na cibercultura. Para isso, precisamos esclarecer rapidamente do que se trata um e outro.

O filósofo francês Pierre Lévy, um dos pensadores do campo de estudos da mídia cibernética, definiu a cibercultura como sendo "o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço". Ou, de modo mais simples, cibercultura é a cultura que surge a partir do uso dos computadores. Logo, hábitos que passaram a ser mediados por um computador sofreram transformações, como a leitura, conforme mencionamos em textos anteriores.

Quando se trata de leitura e de leitor, também se deve considerar o letramento, definido por Angela Kleiman, pesquisadora brasileira do ensino de língua materna, como "um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos". Simplificando, o letramento é um processo contínuo de aprimoramento das habilidades de leitura da palavra escrita. Nosso processo de letramento nunca termina, mas vai sempre se ampliando; todos nós podemos, constantemente, nos aperfeiçoar em nossas habilidades de leitura, de compreensão e de análise de textos, desde que adotemos práticas que nos ajudem nisso.  

As reflexões sobre a cibercultura, seus impactos para a leitura, e o processo de letramento, pode nos ajudar a pensar sobre uma questão que tem se colocado em nossa sociedade: como acabar com a proliferação das fakes news, aquelas notícias falsas que se alastram por toda a rede e vão sendo replicadas pelos usuários?

De início, precisamos considerar que nem sempre o compartilhamento se dá porque o usuário não leu, mas sim porque não é capaz de reconhecer, por exemplo, os traços de uma fonte não segura. Como resolver isso? Como "ensinar" o usuário a detectar fontes não confiáveis? A escola poderia ajudar?

Não é à toa que os documentos oficiais para os parâmetros de ensino de língua portuguesa já consideram os gêneros digitais, mas sim, porque esses podem favorecer uma espécie de letramento digital. É nesse sentido que a cibercultura oferece um momento ímpar para a ampliação das habilidades dos leitores.

Considerando o contexto escolar, seria bom que a escola se aproveitasse da cibercultura para promover esse letramento digital. A escola é um ambiente propício a tornar os leitores cada vez mais capacitados a ler e compreender os diversos tipos de texto com os quais vão se deparar no ambiente virtual, mas para isso, precisa (re)pensar a presença do suporte digital em suas salas de aula. É na escola, por exemplo, que o leitor tem maiores chances de aprender a navegar nas informações online de maneira segura, de modo que possa fazer as escolhas que lhe renderão os melhores resultados para aquilo que busca saber.

 "Com quantos gigabytes / se faz uma jangada / um barco que veleje nesse infomar"... Esses versos de uma canção de Gilberto Gil nos dizem que o mar de informações da net não é coisa para leitores principiantes! E, se é fake ou se não é fake, somente um leitor digitalmente letrado vai poder dizer...

Leia mais sobre a cibercultura e sobre o letramento em:

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

KLEIMAN, A. B. Modelos de letramento e as práticas de alfabetização na escola. In: KLEIMAN, A. B. (Org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas, SP: Mercado de Letras, 1995. p. 15-61.

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MICHELLE  APARECIDA PEREIRA LOPES:
Doutora em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos e pesquisadora da constituição discursiva do corpo feminino ao longo da história. É docente e coordenadora do curso de Letras da Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade de Passos.