A diretora teatral e atriz, Vanessa Tamaso Osti, sempre foi apaixonada pelos palcos desde muito jovem, quando ao assistir à peça “Como Nasceram as Estrelas” decidiu que seria artista. Desde então, alimentou esse sonho até pisar nos palcos pela primeira vez, quando veio morar em Paraíso. Depois, formada em administração, decidiu viver esse sonho e se formou em Artes Dramáticas pela Escola de Artes e Comunicação de São Paulo. De volta a Paraíso, a convite de Kátia Mumic começou a dar aulas de teatro na Oficina de Teatro Sebastião Furlan. Vem aos poucos conquistando seu espaço e buscando realizar sonhos, entre eles de fomentar ainda mais o teatro em Paraíso. Filha de Glória Imaculada Tamaso Osti e Sidnei Garcia Osti, aos 34 anos Vanessa destaca que já viveu muitas coisas boas, mas que ainda há muito a ser vivido e, alegre e receptiva, acolheu a reportagem do Jornal do Sudoeste para contar um pouco da sua trajetória.
Jornal do Sudoeste: Você é natural de São Paulo. Como surgiu esse envolvimento com Paraíso?
V.T.O.: A família da minha mãe é daqui de Paraíso, e na minha infância eu vinha muito para Paraíso passar as férias. Meu retorno está relacionado a um problema de saúde da minha avó, e eu também tinha terminado um trabalho em São Paulo, então decidimos voltar para cá para ficar mais perto da família e até mesmo para ter uma qualidade de vida melhor. Mas eu já havia morado aqui antes, quando eu era criança. Aqui eu terminei o Ensino Médio e voltei para São Paulo, para estudar e trabalhar.
Jornal do Sudoeste: Como foi essa fase de infância e adolescência nessas idas e vindas?
V.T.O.: Para toda criança a mudança é muito difícil. Conheci o escotismo até mesmo por causa dessa mudança, porque eu chorava todos os dias querendo voltar para São Paulo, minhas amigas estavam lá, a minha vida inteira até então estava lá. Nesse processo, minha mãe me colocou no escotismo e eu me apaixonei, é um dos amores da minha vida, e acabei me acostumando. Fiz grandes amigos aqui e, mesmo retornando a São Paulo mantive contato. Eu tinha uma vida agitada lá, mesmo enquanto criança, e aqui já era uma vida mais tranquila, mais perto na natureza – o que eu não tinha em São Paulo.
Jornal do Sudoeste: Como foi essa decisão de retornar a São Paulo após esse período em Paraíso?
V.T.O.: Eu quis voltar porque amo São Paulo, então nunca sei se vou conseguir ficar muito longe. Eu sempre tenho vontade de voltar, mas por hora estou fazendo um trabalho muito legal aqui, mas sempre mantenho meu pé nessas duas terras. Quando eu decidi voltar, foi pensando em estudar e também trabalhar, porque, querendo ou não, a minha família nunca teve muito recurso então eu queria ajudar em casa de alguma forma. Quando eu voltei para lá, fiquei um ano estudando, entrei para a Faculdade, comecei a trabalhar e fiquei até decidirmos retornar a Paraíso.
Jornal do Sudoeste: Sua formação não tem nenhuma relação com o seu trabalho hoje envolvendo teatro, como foi isso?
V.T.O.: Sim. Eu me formei em administração com ênfase em marketing, mas sempre gostei de teatro. ADM foi a minha primeira formação porque meu pai sempre falou para eu fazer algo que, inicialmente, me desse renda, porque eu precisava de recursos. Fiz essa faculdade, trabalhei na área em multinacional durante muito tempo, porém, como amava teatro e vi que dava para fazer um curso profissional, fiz um curso paralelo ao meu trabalho até me formar em artes dramáticas, na Escola de Artes e Comunicação, a Recreartes. São Paulo tem muitas opções de curso, e eu vi um que ficava mais perto para mim. A Recreartes é uma escola voltada mais para o teatro, algumas escolas têm um foco mais em TV, como a do Wolf Maia.
Jornal do Sudoeste: Nesse meio tempo você largou a administração ou conciliou as duas coisas?
V.T.O.: Eu fiz paralelamente, mas o sonho era largar tudo e ir fazer teatro, mas continuei trabalhando nessa área financeira. Pouco tempo depois eu recebi o convite de uma amiga minha, para trabalhar com eventos, que é algo que eu gosto bastante, então larguei tudo e fui trabalhar com eventos e continuei com o teatro. Em São Paulo eu atuava muito mais, mas aqui eu faço direção e dou aulas de teatro, apresentei algumas peças, mas apenas em escola. Aqui, sim, em Paraíso eu larguei tudo e estou apenas com o teatro.
Jornal do Sudoeste: O custo de vida é menor, é possível sobreviver com o teatro?
V.T.O.: Sim, é bem menor. Em São Paulo o salário é bom, mas é caro viver, ele vai inteiro embora. Aqui, o salário não é muito bom, mas o custo de vida é baixo, é uma cidade tranquila, em cinco ou dez minutos você chega a qualquer lugar. Em São Paulo, por exemplo, eu morava perto do meu trabalho, mas levava 40 minutos para chegar. Viver aqui está sendo uma ótima experiência e uma ótima oportunidade para eu começar esse meu trabalho exclusivo com a arte.
Jornal do Sudoeste: Quando chegou a Paraíso, você chegou perdida ou já tinha algo em mente?
V.T.O.: Eu cheguei completamente perdida, mas quando vim para cá não tinha muita noção do que eu iria fazer. Eu iria tirar um período de férias e definir meus próximos passos. Todavia, queria atuar e procurei a Katia Mumic, que me recebeu muito bem e me apresentou ao Kayho Rodrigues e ao Lucas Logan na época. Contei a minha história a ela e ela me convidou para dar aula, eu nunca tinha feito aquilo na vida, e foi um susto muito grande, mas aceitei o desafio e estamos juntos até hoje.
Jornal do Sudoeste: Você gosta de dar aulas para essa criançada?
V.T.O.: Adoro. Inicialmente me assustou um pouco porque eu nunca esperei dar aula na vida. Mas sempre gostei muito de ensinar, mesmo na área financeira ajudando estagiários, sempre gostei de passar o que eu sei para o outro. E as crianças são muito transparentes, tudo o que você passar elas reagem naquele instante, às vezes eu falo alguma coisas e esqueço e na semana seguinte eles me lembram. Criança absorve muito o que ensinamos, são muito atentos, tem muita energia e muita verdade, o que é muito importante. No teatro trabalhamos muito com a questão do sonho e do lúdico, essas crianças fazem isto de maneira muito linda. Estou adorando essa experiência.
Jornal do Sudoeste: Já pensou em fazer licenciatura?
V.T.O.: Já pensei sobre, mas tenho ainda outros projetos. Quero continuar dando aula, estou amando, mas quero focar em alguns projetos, buscar recursos junto ao governo e tentar fomentar mais a arte. Hoje em dia é muito difícil conseguir um patrocínio no cara a cara.
Jornal do Sudoeste: Você acredita que em Paraíso falta um olhar para a arte?
V.T.O.: Falta muito. Eu não sei como era antes de eu chegar, mas agora, dando aula e nessa busca por apoio e incentivo, eu percebo que muita gente não conhecia o Teatro, mesmo a oficina tendo 25 anos de casa. Acho que falta um pouco de engajamento, talvez uma falha nossa mesmo em divulgar, talvez poderíamos divulgar mais, mas também vejo que as pessoas não valorizam tanto essa arte que é o teatro; música as pessoas são muito mais engajadas do que em assistir a uma peça, ir até ao teatro. Nos meus projetos, quero continuar dando aula, mas também quero tentar buscar desenvolver projeto para fomentar essa cultura, por exemplo para crianças que não têm recurso e nunca foram ao teatro.
Jornal do Sudoeste: A arte pode ser um combate à vulnerabilidade social?
V.T.O.: Eu acredito que sim, pode até ser que a gente não consiga tirar aquela criança naquele ambiente, mas podemos dar a ela oportunidades para que isso aconteça. Se na casa dessa criança é difícil e o mundo lá fora é difícil, talvez no teatro ela consiga trabalhar o sonho, a criatividades, ter uma visão mais bonita da vida do que talvez ela teria na vida real. É uma oportunidade que ela tem e talvez aproveite isto da melhor forma. Não é uma certeza de tirar essa criança do meio ruim, mas é uma oportunidade.
Jornal do Sudoeste: Vocês apresentaram recentemente uma temporada de teatro. Como foi essa recepção do público?
V.T.O.: Foi muito boa. Foram os “25 anos em Cena”, em comemoração ao aniversário da Oficina. Juntamos nessa apresentação algumas peças apresentadas nesse tempo. O resultado foi muito bom, percebemos que, apesar de não ser tão valorizado, nosso público está aumentando a cada ano. Tivemos uma média de público de 300 pessoas por dia. Tivemos críticas positivas, contamos com a presença de muitos ex-alunos da Oficina, e muitos quiseram entrar para a Oficina depois disso. As pessoas que patrocinam os meus projetos, estão vendo cada vez mais resultados, é uma forma de mostrarmos que a arte está crescendo em Paraíso.
Jornal do Sudoeste: Nessa sua trajetória com o teatro, quais são os momentos mais marcantes para você?
V.T.O.: São vários momentos marcantes. O primeiro deles quando eu decidi ser artista após assistir Como Nasceram as Estrelas, com minha prima e uma tia. Eu era criança, é algo que ficou na minha memória. Depois, aqui em Paraíso, quanto estudei na ETFG, tivemos aulas de teatro e apresentamos a peça Bailei na Curva, que é um texto bem forte, de teor político e minha turma era sensacional. Esta foi a minha primeira apresentação, e eu era bem tímida então estar diante do público pela primeira vez foi um marco muito grande. Outro momento foi quando me formei em Artes Dramáticas e apresentamos a peça Eros Despedaço, que é uma junção de um texto intitulado Quatro e Quarenta e Oito, da Sarah Kane – um texto um pouco pesado que aborda o suicídio – e um texto do Dostoievski. Nós adaptamos esses textos e fizemos uma peça maravilhosa e que teve uma repercussão muito boa. Saímos na Vejinha de São Paulo. Foi outro marco para mim. Agora, como diretora, duas peças que me marcaram bastante foi Alice no “País das Maravilhas”, a primeira que eu dirigi em Paraíso e a primeira turma para quem eu dei aula, e a última que foi “Meu Sonho de Criança”, que foi um roteiro escrito por mim, não foi nenhuma adaptação. Fiz pensando em cada aluno meu e teve um resultado muito positivo, recebi elogios de psicólogo que leu.
Jornal do Sudoeste: Você também está ligada ao Grupo de Escoteiros, como é essa sua relação?
V.T.O.: Nos Escoteiros hoje eu sou chefe. Funciona da seguinte maneira: começa a partir dos seis anos e meio, e não tem idade para acabar. É divido por idades. De seis a 10 anos você é lobinho; de 10 a 14 escoteiro; 15 a 18 sênior e guia; de 18 a 21, pioneiro; acima de 21 é a chefia, que não tem hierarquia, todos nós adultos somos voluntários e nos dividimos nas funções e vemos com quem temos facilidade maior de trabalhar. O objetivo do escoteiro é formar cidadãos melhores. E tudo o que fazemos é por meio de jogos, instrução, orientações. É um complemento da educação que essa criança recebe da família e da escola.
Jornal do Sudoeste: Você acha que teria tomado outro rumo na vida sem ser pela arte?
V.T.O.: Não. Eu sempre gostei de arte e sempre estive envolvida. Antes de me formei em Arte Dramática, eu não conseguia me visualizar trabalhando só com isso, fazendo tudo o que estou fazendo neste momento da minha vida. Agora não consigo me imaginar sem. Hoje tenho a minhas aulas, quero tentar um projeto para expandir o teatro em Paraíso. Eu gosto de todos os tipos de arte, como música e dança, quero ainda montar um projeto onde consiga unir todas essas artes, e não ficar apenas cada um na sua. Eu sempre penso em criar e sempre me imagino trabalhando com arte.
Jornal do Sudoeste: Tem algum ator ou escritor que a inspira?
V.T.O.: Eu sempre fui muito noveleira, então, embora trabalhe com teatro, sempre gostei muito de TV. De atores eu gosto muito do Antônio Fagundes e da Glória Pires, são grandes exemplos de dramaturgia; e no teatro tem o diretor Zé Celso, que eu sou apaixonada pelos seus trabalhos, é um diretor bem polêmico, mas sua criativa e a forma que lida com o teatro é incrível. Em um de seus trabalhos ele recriou Os Sertões, que ele dividiu em cinco peças, algumas de duas horas, uma de cinco horas com intervalo e eu ia, ficava no teatro esse tempo e apaixonada pelo o que estava vendo. Tinha interação com o público, e o Zé Celso faz muito isso, de puxar as pessoas para participar da peça. Eu gosto muito disso.
Jornal do Sudoeste: A curto prazo, tem algum projeto em vista?
V.T.O.: Para o ano que vem temos algumas ideias que ainda não estão muito estruturadas e não posso adiantar muita coisa. Mas já estamos no fim do ano, e nessa época fazemos uma peça de conclusão de curso das crianças e as minhas turmas irão apresentar Peter Pan, que é uma das histórias mais lidas e mais apresentadas do mundo.
Jornal do Sudoeste: Qual o balanço que você faz de toda essa caminhada?
V.T.O.: Eu diria que é muita bagagem vivida e muita para se viver. Acredito que mudanças, adaptações e otimismo são palavras que me definem, tendo em vista essa questão de adaptação a uma nova profissão, flexibilidade em mudar de cidade e me adaptar a uma nova realidade, não apenas às cidades em si, mas aos perfis das pessoas, que são muito diferentes. Até mesmo na arte, São Paulo é um polo cultural, tem de tudo e a toda hora, tem muita oportunidade e tanta coisa que às vezes você fica sem saber aonde ir. Aqui estamos crescendo, aos poucos. E o otimismo: sou uma pessoa que nesses 34 anos, sempre fui muito otimista e, mesmo nas dificuldades, sempre tentei ver oportunidades ao invés de obstáculos e acredito que será assim pelo resto da vida. Foi assim com a vida e acredito que será assim também com a arte.