No próximo dia 9 de novembro acontece no Espaço Ser e Tempo, a quarta reunião do grupo Leia Mulheres, que desta vez irá debater a obra "A Falência", de Júlia Lopes de Almeida. No dia 5 de outubro o grupo se reuniu para conversar sobre a obra "A Casa Torta", da escritora inglesa Agatha Christie, onde, de acordo com uma das mediadoras do grupo, Sarah Lara Naves, foi interessante dada à diversidade de opiniões sobre a obra e a escritora.
"Foram opiniões muito distintas e interessantes. Teve pessoas que amaram a obras, pessoas que não gostaram. Conseguimos dar nossa contribuição e, também, entender os diversos pontos de vista. A Casa Torta é um romance policial, foi uma leitura leve, com discussões leves. Também, graças a essas contribuições, conseguimos traçar um paralelo entre a vida da escritora e a sua escrita. Era uma autora que também trazia os mistérios de suas obras para a sua própria vida", destaca.
Entre as temáticas debatidas no encontro, Sarah comenta que umas das principais discussões foi sobre as relações de dependência que existe nas famílias. "A história narra um assassinato ocorrido dentro de um ambiente familiar e pudemos, assim, transportar essa realidade para as nossas vivências. Com o desfecho da obra, cujo assassinato envolve uma criança, conseguimos debater sobre a infância, seus comportamentos e, também, sobre empatia. Apesar do tema sério, a conversa foi leve e muito descontraída", completa.
A FALÊNCIA
Pouco conhecida pelos amantes da leitura, a escritora brasileira Júlia Lopes de Almeida é um dos maiores exemplos de apagamento da mulher na história da literatura. Nascida em 1862, Julia foi contemporânea de grandes nomes do Cânone Literário, entre eles Machado de Assis. Seu nome foi cogitado para ocupar uma cadeira na primeira formação da Academia Brasileira de Letras (ABL), mas foi preterida, sendo eleito em seu lugar seu marido, Filinto de Almeida.
Segundo aponta o escritor brasileiro Luiz Ruffato, em prefácio que abre a edição do selo Penguin da editora Companhia das Letras de "A Falência", em um artigo no jornal O Estado de S. Paulo, de 12 de dezembro de 1896, o escritor Lúcio de Mendonça, um dos fundadores da ABL, anunciou uma reunião que definiu os nomes dos quarenta imortais, citando Júlia Lopes de Almeida com um dos candidatos.
Entretanto, no ano seguinte, quando se realizou a sessão solene de fundação da ABL, quem tomou posse não foi a escritora, mas seu marido, Filinto de Almeida. Eleito como membro da ABL em 1919, o escritor Humberto de Campos, explicou que, na fundação da Academia, uma das cadeiras estava destinada à escritora, contudo, o artigo que regulava a candidatura feminina havia desaparecido. De a acordo com o escritor, constrangidos, vez que a autora estava informada dessa possibilidade de se tornar um dos imortais, a solução encontrada foi dar posse ao marido da autora.
Júlia Lopes de Almeida foi "ressuscitada" pela Fuvest ao indicar "A Falência" como leitura obrigatória para seu vestibular de 2019. Dona Júlia, como era conhecida, teve uma carreira prodigiosa enquanto jornalista. Trabalhou na Gazeta de Campinas, quando ainda era raro a participação de mulheres no meio intelectual, e por mais de 30 anos colaborou com o jornal carioca O País, além de grande apoiadora do abolicionismo e da República.
REALISMO
Evocando um dos temas mais debatidos pelos escritores realistas, "A Falência" narra a história de uma mulher adúltera em busca de realização, em meio a um cenário que aborda o crescente desenvolvimento do comércio cafeeiro.
Camila, de origem pobre e casada com Francisco Theodoro, em virtude da comodidade que a riqueza do marido lhe traz, descobre-se apaixonada pelo médico Gervásio. Francisco não faz ideia que a traição acontece debaixo do seu nariz, mas terá seu ideal de família perfeito abalado após um mau negócio que o leva à falência. Publicado em 1901, A Falência hoje é considerada a obra-prima de uma das maiores escritoras da literatura brasileira.
JÚLIA LOPES DE ALMEIDA: A ESCRITORA ESQUECIDA
Júlia Lopes de Almeida nasceu no Rio de Janeiro em 1862. Ela era filha de imigrantes portugueses ricos e teve a oportunidade de receber uma boa educação. Durante boa parte da sua vida - dos sete aos 23 anos - morou numa fazenda com a família em Campinas, onde publicou suas primeiras crônicas no jornal local.
Em 1886 a escritora mudou-se para Lisboa, onde publicou com recursos próprios seu primeiro livro, em 1887. Júlia voltou ao Brasil em 1888, já casada com o poeta português Filinto de Almeida. Seu primeiro romance, Memórias de Marta, foi lançado em 1889, em São Paulo, onde morou por quatro anos. Depois, mudaram-se para o Rio de Janeiro, onde, durante parte das décadas de 1900 e 1910, foram os proprietários de um casarão no bairro de Santa Teresa conhecido como Salão Verde - espaço frequentado por intelectuais e comandado por Júlia.
O nome da autora foi cogitado para figurar na lista de membros fundadores da Academia Brasileira de Letras em 1897, mas, com o intuito de manter a Academia exclusivamente masculina, seu nome foi preterido em favor do marido, Filinto. Em 1925, a família fixou residência em Paris e lá permaneceu por seis anos. Em 1934, aos 72 anos, Júlia morreu, em sua cidade natal, vítima de malária.