O comandante da Guarda Civil Municipal (GCM) de São Sebastião do Paraíso, Antônio de Paula Frazão, é um servidor dedicado ao trabalho e muito àquilo a que se propõe fazer. Servidor efetivo desde 2006, é formado em Educação Física e tem um irmão gêmeo, que também é GCM, o José de Paula Frazão. Frazão é filho de Maria de Paula Filho e é natural de Campos Altos, mas ele e o irmão vieram para Paraíso com apenas quinze dias, tendo sido acolhido pelos tios Regina Célia Silveira Frazão e Francisco de Oliveira Frazão, que se tornaram seus pais adotivos. Casado com Juliana Xavier Ferreira e pai dos pequenos Matheus, de oito anos, e Henrique, de cinco, é com olhos marejados que ele fala um pouco da família, dos pais adotivos e da sua trajetória de pouco mais de 13 anos na Guarda Municipal.
Jornal do Sudoeste: Como foi sua infância e início de vida aqui em Paraíso?
A.P.F.: Eu nasci em Campos Altos, mas com quinze dias de vida, meus tios ficaram sabendo das dificuldades da minha mãe, que tem problemas auditivos, nos adotaram (eu tenho um irmão gêmeo). Então viemos todos morar em Paraíso. Esses tios se tornaram meus pais, e tive a felicidade de ter tido duas mães. A infância foi maravilhosa, e tive algo que meus filhos não podem ter hoje, que é liberdade. Pude brincar na rua, subir em árvores, brincar de pique-rela, pique-esconde à noite, brincadeiras que infelizmente hoje nossos filhos não sabem o que é. Tive um apoio muito grande do meu avô, já falecido, o senhor Francisco Frazão, que ajudou a nos criar também. Todos os princípios pelos quais prezo: honestidade e bom caráter, são reflexos de meu pai, que é pedreiro. Um homem trabalhador e muito honesto, ele é meu alicerce.
Jornal do Sudoeste: Como foi crescer com um irmão gêmeo?
A.P.F.: A parte ruim de ter um irmão gêmeo é a comparação, mas apesar disto e das brigas casuais, posso dizer que mesmo naquela época ele era meu grande companheiro e é meu melhor amigo. Estamos sempre juntos e tudo o que precisamos, um sempre conta com o outro pra tudo. Nossos gênios são muito diferentes, ao passo que ele é mais calmo e tranquilo, eu já era mais explosivo – mas com o amadurecimento, a gente aprende que nem sempre a vida precisa ser “na bruta”, mas no diálogo – que resolve qualquer conflito.
Jornal do Sudoeste: E esse período escolar?
A.P.F.: Fiz o ensino fundamental no Ana Cândida de Figueiredo e o colegial no Clóvis Salgado. Na última terça-feira (15/10), foi o Dia do Professor, e posso dizer com toda a certeza que nossa base é o professor. Se soubéssemos a importância que tem um professor, o nosso Brasil estaria muito diferente. Posso dizer, com toda sinceridade (eu inicie na GCM realizando a travessia de alunos na porta de escola) que falta a esses jovens entender a importância da escola. Infelizmente, vemos que o aluno, hoje, vai obrigado, e não pelo interesse no conhecimento. Falta ao jovem entender que a educação é necessária, que ela é para o futuro dele, além da formação de caráter, que não é formado pela escola, mas que pode auxiliar.
Jornal do Sudoeste: Você acredita que a família tem um papel importante nesse processo?
A.P.F.: Sim. Os professores estão ali na escola para ensinar, mas quem disciplina e tem que ensinar os limites, são os pais, muitas das vezes ficamos tristes, porque somos chamados em uma ocorrência e vemos o adolescente fazer coisas erradas e os pais a favor desse filho. Isso demonstra que a sociedade precisa dar um grito de socorro: ou se muda esse comportamento ou estaremos muito perdidos. Digo muito para esses pais, eles precisam estar atentos aos seus filhos. Tudo bem em querer defender o filho de algumas situações, mas a partir do momento que esse jovem, que não está trabalhando e está chegando em casa com algum bem, alguma coisa está errada e esse pai precisa intervir. Não é porque o menino já fez 14 anos, que ele irá se virar e não precisa mais dos pais. É nesse momento que entra a atuação da GCM, que é a questão do conflito. O nosso trabalho hoje é fruto de uma luta de grandes nomes que insistiram e acreditaram na GCM. Entre eles a Norma, que já foi comandante da GCM e hoje já está aposentada, a Luíza, que também acabou de se aposentar, da Mar-ciléia, a Maristela, a Carminha, a Luciana, o Celso, a Elisân-gela, que estão nesta luta pela Guarda desde o início. Graças a eles que tivemos um concurso em 2006. Foi a insistência e persistência desses agentes em permanecer na Guarda, que hoje chegamos até aqui. Tudo isso veio através do sofrimento.
Jornal do Sudoeste: Quando terminou o Colegial, o que decidiu fazer da sua vida?
A.P.F.: Nesta época, meu irmão foi fazer o Tiro de Guerra (quando se são gêmeos, apenas um serve o TG), e meu pai sempre foi muito firme em relação a nossa educação (ele mesmo não foi alfabetizado), e o que ele não teve, queria que tivéssemos. Dizia-nos que se fôssemos bem na escola, não precisaríamos trabalhar, mas se estivéssemos “relaxados” teríamos que ir para a obra trabalhar com ele, de serventes. Claro que eu estudava, porque via o sofrimento dele e o quanto era cansativo aquele trabalho. Nós o observávamos, não queríamos passar pelo mesmo sofrimento e ele não queria isso para nós. Depois que terminei o colegial, comecei a trabalhar numa empresa que produzia e vendia produtos de limpeza, mas que fechou depois de um tempo. De lá fui trabalhar no curtume Cacique.
Jornal do Sudoeste: Como foi essa fase?
A.P.F.: Foi na época que eles estavam abrindo a parte de estofamentos. Era uma área nova, fomos os primeiros a entrar e aprender a trabalhar com aquilo. Fazíamos sofás luxuosos, era muito bonito aquele trabalho. Inicie sem saber praticamente nada. Foram dois anos, até que surgiu a oportunidade de fazer o concurso da Guarda Municipal, em 2006. Muita gente que trabalhava no curtume prestou, chegava a hora de almoço e todos usavam esse tempo para estudar, era até bonito ver reunidos daquela forma. Porém, eu fui o único que conseguiu passar e então deixei o curtume e comecei na GCM. Não tinha essa pretensão de ir para área de segurança pública, tinha outros sonhos, de ser designer, trabalhar com desenho industrial... Mas entrei para a GCM e me apaixonei, faz parte da minha vida. Vi muitos colegas saírem, mas eu quis permanecer.
Jornal do Sudoeste: Como foi o início dessa carreira?
A.P.F.: Eu comecei trabalhando em postos patrimoniais, adquiri muita experiência com isso. E o bom de trabalhar na GCM é que você faz muitos amigos ao servir o povo. De 100% das pessoas que você conhece, 2% são pessoas ruins. Recordo-me de ouvir muitas histórias, e como uma de nossas atribuições é dar atenção ao cidadão, então ouvíamos muita coisa. Depois, passei a motorista da GCM, até que recebi o convite do então secretário, coronel Pedro Ivo, para ser inspetor da GCM. Como inspetor, gerenciando turnos, fiquei cerca de oito anos na função. No final de 2016 recebi o convite para assumir o cargo de subcomandante ao lado da comandante Silvia, que foi um divisor de água na minha vida. Ela me ajudou muito – com muitos conselhos e orientações. Assim que ela ficou grávida e teve seu filho, eu assumi o comando da GCM, em março.
Jornal do Sudoeste: Foi uma longa trajetória até aqui?
A.P.F.: Sim. E tenho muito orgulho por tudo o que passei. Não vou mentir, posso ter cometido minhas falhas, mas nunca prejudiquei ninguém e nunca tive a intenção. Sempre busquei atender a todos da melhor forma possível e ser o mais prestativo possível. Sei que cometi erros, mas sempre busquei me corrigir, pedir desculpas, nós somos seres humanos – não é porque usamos fardas, que somos robôs, a gente também tem sentimento.
Jornal do Sudoeste: Como tem sido trabalhar no comando da GCM?
A.P.F.: Tem sido uma faculdade, tenho aprendido muito. É um cargo que gerencia muita coisa, primeiro as ordens ao subcomandante, depois despachar todos os protocolos que chegam para a gente, na maioria de pedidos de Guarda. Quanto há os protocolos de pedidos de Guarda, costumo dizer que é porque nosso serviço está sendo reconhecido. Chegam protocolos assim todos os dias, mas temos algumas prioridades, como os postos de patrimônio público e portas de escola em ruas e avenidas mais movimentadas.
Jornal do Sudoeste: Teve muita mudança na GCM ao longo desses anos, não?
A.P.F.: Sim. E temos que destacar o trabalho da atual administração. Para se ter uma ideia, com cinco anos de serviços prestados eu tenho direito a promoção, e só viemos conquistar isso agora. Tem Guarda que estava esperando a promoção há 30 anos, e se aposentou agora graças a essa promoção. Foi-nos passado também a municipalização, confiado à gente este trabalho, que para mim foi de muita coragem, e vejo que a cidade precisa, não apenas do trabalho orientativo, mas também de fiscalização.
Jornal do Sudoeste: A Guarda Municipal passou por momentos difíceis. Qual momento você destaca?
A.P.F.: A greve, na gestão do Reminho, acredito que tenha sido o momento mais complicado, os guardas chegaram a ser suspensos. O que foi mais complicado foi o não-pagamento aos funcionários, que chegou a ficar meses sem receber. Foi muito sofrido, aqueles que podiam ajudavam aos que estavam mais necessitados, mas muita gente ficou desamparada porque ficaram sofrendo em silêncio. Mas acredito que o que não nos mata, nos fortalece. E acredito que se a guarda não acabou naquele momento, ela ficou fortalecida. Foi um momento difícil. É uma fase superada que, se voltasse a acontecer, acho que eu tomaria decisões diferentes e em conjunto com o grupo. Porém, graças a Deus temos uma administração séria, e é por isso que temos que pensar bem antes de votar, porque tudo isso reflete, principalmente, nos funcionários.
Jornal do Sudoeste: Hoje, o que falta para a GCM dar um passo a mais nessa caminhada?
A.P.F.: O que eu vejo hoje de projeção para o futuro é a estruturação da Guarda. Além de formado em Educação, eu tenho alguns cursos de capacitação sobre a Lei Maria da Penha, Crimes Cibernéticos, Direitos Humanos. Sou instrutor de armas não letais – eu e o secretário de Segurança Pública, Miguel Félix, fomos ao Rio de Janeiro fazer esse curso. Estamos com esse planejamento de incluir armas não letais para a guarda, que ainda está em estudo. Vejo que tem progredido essa estruturação, a aquisição de mais viaturas, mais aparelhagem, monitora-mento, entre outras tecnologias em prol da população.
Jornal do Sudoeste: A Guarda também abarcou a fiscalização do trânsito, você tem sentido alguma diferença com esse trabalho?
A.P.F.: Com certeza. Na primeira semana, quando começamos com as autuações educativas, eu cheguei ao Centro e pensei que estávamos perdidos, e como iríamos resolver todos aqueles problemas encontrados: era moto parada em vaga de carro; carro parado em vaga de moto; condutores parados em vagas especiais e não esquentando muito a cabeça; motorista andando de qualquer jeito, olhando as pessoas passarem na faixa e não se importando. A partir do momento que se falou que a GCM iria atuar na fiscalização do trânsito, o comportamento da população já começou a mudar perante a gente. Na ronda escolar, por exemplo, quando o condutor fazia sinal de parada o motorista simplesmente não respeitava, isso já mudou muito. Começamos um trabalho de formiguinha e chegamos a fazer mais de duas mil multas educativas, em dois meses – isto para que as pessoas percebam que há a municipalização do trânsito – mas as autuações caíram bastante, e os condutores estão respeitando mais as leis de trânsito. A nossa intenção não é arrecadação, mas o respeito no trânsito.
Jornal do Sudoeste: Esse respeito vem com o tempo e essa geração vai mudando, não é mesmo?
A.P.F.: Com certeza. E a educação no trânsito pelo GCM começou com a finada Andrea, lá nos idos de 2006, quando ela criou o “jogotran” e iniciou o Educando para o Trânsito, que é um projeto que tem até hoje e que atualmente é coordenado pela Gisele e a Eliana. O que elas fazem nas escolas têm muito efeito – é um trabalho que começou lá em 2006 e que hoje tem seus reflexos. Além desse projeto, também tem a Guarda Mirim, que trabalha com alunos de tempo integral e que ficam na escola aprendendo alguma coisa, ao invés de ficarem na rua.
Jornal do Sudoeste: Qual é o balanço que você dessa trajetória?
A.P.F.: Posso dizer que é de reconhecimento e muito gratidão, principalmente aos meus pais, que foram tudo para mim e para meu irmão. Tudo o que passei até hoje, foi por meio de muita dificuldade e sofrimento, mas hoje o sentimento é só de gratidão, pela vida, pelo emprego, pelas pessoas que convivo, pela minha esposa Juliana (que me ajuda muito). Minha esposa é quem aguenta toda essa carga pesada que eu acabo levando do trabalho para casa, mas ao contrário de mim, ela não é uma pessoa brava, é calma, tranquila, ela me complementa, porque os dias são pesados e não é fácil gerir uma tropa. Porém, graças a Deus, eu tenho pessoas muito boas próximas a mim: o secretário Miguel que nos apoia muito, a Silvia, que se tornou minha amiga, meu subcomandante que me auxilia muito na parte jurídica, é uma equipe muito boa. Em resumo, o sentimento que tenho de toda essa caminhada é de gratidão por tudo o que tenho, por tudo o que passei e por tudo o que vou passar ainda.