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Maria Luzia: dedicação e fé como instrumentos para a construção de um mundo melhor

“Nós precisamos acreditar em nossos sonhos e naquilo que desejamos, e priorizamos para nossa vida”
Por: João Oliveira | Categoria: Entretenimento | 27-01-2020 15:22 | 2262
A psicóloga Maria Luzia é pioneira na campanha Janeiro Branco em Paraíso
A psicóloga Maria Luzia é pioneira na campanha Janeiro Branco em Paraíso Foto: Arquivo Pessoal

A psicóloga Maria Luzia de Oliveira Pedroso é uma mulher dedicada à profissão que, assim como tudo em sua vida, exerce com muito amor e alegria. Iniciou sua carreira como professora e por mais de 30 anos atuou na Educação Básica em São Sebastião do Paraíso, até se aposentar e resolver começar uma nova carreira. Durante todos esses processos, ela enfrentou inúmeras barreiras que não a impediram de seguir em frente, sempre muito temente à sua fé e focada em seus sonhos. Filha do casal Geraldo de Oliveira Costa e Vicentina Oliveira de Jesus, ela é casada com Paulo César Pedroso e mãe da Franciele e da Fernanda, e avó no pequeno Pedro Henrique. Dedicada à família, é emocionada que recorda suas vivências e processos que a tornaram a pessoa que é hoje, e que nunca deixou de sorrir diante das adversidades da vida.

Jornal do Sudoeste: de onde são suas raízes?
M.L.O.P.: Eu sou daqui, nasci na região de Itaguaba, e fui criada na zona rural. A minha vida foi de idas e vindas, recordo-me que meus pais tinham uma casa aqui na cidade e uma na roça. No período que comecei a estudar, nos idos de 1974, nós viemos para a cidade, eu fiz os anos iniciais na Escola Estadual Ana Cândida de Figueiredo, depois voltamos para a zona rural. Quando eu fui começar a 5ª série, meu pai e outros vizinhos contrataram um transporte que nos trazia, era particular e não havia a comodidade que se tem hoje com o transporte oferecido pela Prefeitura. Era um sacrifício, acordávamos muito cedo, mas eu amava aquela vida e amava estudar.

Jornal do Sudoeste: seus pais vieram de onde?
M.L.O.P.: Meus pais vieram de Capitólio, saíram de lá por causa da represa de Furnas. As terras que eles tinham foram todas cobertas pelas águas, e meus pais têm lembranças muito saudosas daquela época. Eles são pessoas muito boas, são exemplos de vida. Honestos, muito responsáveis e de muita fé. Sempre nos deram um bom exemplo de honestidade, respeito e valores. Meu pai é um homem muito trabalhador e hoje, aos 89 anos, ele vai para roça trabalhar e esta é a paixão dele, minha mãe também, sempre foi muito trabalhadora. Sou muito grata a Deus por tê-los como pais e ter uma família maravilhosa e muito unida, que está sempre junta na alegria e na tristeza.

Jornal do Sudoeste: como foi crescer em meio a tantos irmãos?
M.L.O.P.: Foi uma infância muito rica. Brincávamos de tudo, contávamos histórias. Eu tinha uma afinidade maior com a minha irmã mais velha, mesmo porque tínhamos idade próxima, e as primas. Naquela época morávamos na zona rural, então a gente se reunia e brincávamos muito. Recordo-me que um de meus irmãos mais velhos, quando ia nos visitar, levava uma mala de livros, e eu me deliciava, era apaixonada por aquelas leituras. Eu me sentava debaixo de um abacateiro que tinha e viajava nos livros. Cresci apaixonada pela leitura e por ensinar, desde muito pequena eu queria ser professora, tinha esse desejo de ensina e também por aprender. É algo que sempre esteve em mim, eu gosto de compartilhar o que eu tenho comigo e também de aprender com os outros.

Jornal do Sudoeste: como foi sua formação acadêmica?
M.L.O.P.: Naquela época era muito difícil o acesso aos estudos e não tínhamos a liberdade de ir para fora estudar como é hoje, e muito menos condições de ir e voltar como se tem atualmente. Era meu desejo, mas não tive essa oportunidade. Assim que terminei o Colegial, surgiu o Magistério no Paraisense, que era inclusive onde eu estudava. Meu pai foi um pouco contra na época quando eu disse que queria fazer o magistério e ser professora, e nessa mesma época os meus primos também tinham ido embora da roça e ficou mais difícil continuar bancando o transporte. Felizmente, graças a Deus e a minha avó, que me acolheu, eu pude morar com ela e fazer o curso de magistério. Completei e iniciei minha carreira profissional como professora.

Jornal do Sudoeste: como foi essa experiência de trabalhar com crianças?
M.L.O.P.: Foi uma experiência maravilhosa, eu era apaixonada por ensinar e amei tudo o que fiz. Evidentemente, tive falhas. Era sozinha naquela escola de zona rural e tinha cinco turmas da minha sala, de pré ao quarto ano, e nós, enquanto profissionais, tínhamos pouco respaldo, não era a assistência que se tem hoje na Educação.  Eu tinha que me virar e correr atrás. Para alguém que estava começando, e tinha apenas 17 anos, foi um começo árduo, porém gratificante. Recordo-me de uma situação muito engraçada: uma vizinha próxima a escola chegou, e estava na hora do recreio (estávamos todos sentados, e eu também brincava com as crianças porque era praticamente uma criança, tinha 17 anos), e perguntou onde estava a professora – eu era a professora. Foi uma época muito gostosa, era apaixonada pelo o que eu fazia. Fazia tudo com amor, responsabilidade.

Jornal do Sudoeste: foram muitos os desafios?
M.L.O.P.: Sim, na época eu não sabia dirigir, e depois de certo tempo me mudei para perto da escola em que eu lecionava. Eu havia me casado e nesse intervalo de tempo, até me mudar para lá, não tinha quem me levasse. Até que eu aprendi a dirigir, meu sogro ou me cunhado, e devo muito a eles por isso, ficavam preocupados comigo e costumavam me acompanhar porque eu tinha que pegar asfalto. Logo depois tirei carteira de habilitação, e hoje rodo o Brasil se precisar. Fiquei nessa escola por 19 anos, até que em 2000 eu me mudei para Paraíso. Eu tinha um anseio muito grande por continuar a estudar, e conversava muito com meu marido que eu não podia ficar parada. Durante esses 19 anos, que fiquei afastada dos estudos, eu adquiria materiais para estudar sozinha e poder aplicar aqueles conhecimentos com meus alunos. Foi um período em que eu li bastante e procurava por novos conhecimentos o tempo todo. Tanto que quando me mudei para Paraíso, todo o material pedagógico que eu tinha, eu compartilhava com as outras professoras. Eu tenho uma facilidade muito grande em me relacionar com o outro e compartilhar. Acredito que essa troca nos enriquece muito.

Jornal do Sudoeste: a mudança se deu por sua vontade de voltar a estudar?
M.L.O.P.: Sim. Minhas filhas já estudavam na cidade, e a mudança se deu tanto para facilitar para elas quanto para eu poder voltar a estudar. Comecei a minha faculdade de Letras. Então, viemos, mas foi um momento de muita dificuldade até que a gente se estabelecesse. Pagávamos aluguel, a renda era pequena, e ainda estava fazendo faculdade. Não cheguei a passar fome, mas havia momentos que a gente passava vontade às vezes de comer algo, eu ia para a faculdade e havia dias que eu não tinha dinheiro para comprar um salgado. Foi um momento difícil.

Jornal do Sudoeste: foi nesse momento que surgiu a vontade de estudar psicologia?
M.L.O.P.: Foi nesse momento em que eu fiz a Faculdade de Letras que surgiu meu amor pela História e Psicologia. Fui tendo contato com esse desenvolvimento humano e despertou esse amor, mas até então eu jamais imaginava que eu fosse fazer outra faculdade. Guardei esse sonho e, após me formar em 2002, em maio de 2003 eu pedi transferência da Escola Ibrantina Amaral para a Noraldino Lima, foi um momento de muita aprendizagem. Em maio de 2003, a secretária de Educação da época, Maria Luíza Coelho, que é uma pessoa a quem sou muito grata, tenho muito carinho e amo muito, me convidou para ser coordenadora do Centro de Educação Infantil Inês Ferreira Marcolini, onde permaneci por 10 anos. Eu aceitei, mas na época conversei com ela sobre as minhas inseguranças, e ela disse para eu não me preocupar, porque eu iria aprender. Ela me passou muitos livros e eu estudei muito. Eu tenho a Maria Luiza como uma referência. Era um cargo que eu não poderia assumir sem a faculdade, e assim que me formei fui convidada para assumi-lo. Durante esse tempo aprendi muito, fiz muitas amizades que se mantêm até hoje.

Jornal do Sudoeste: nesse período você iniciou um processo de terapia, como foi isso?
M.L.O.P.: Iniciei esse processo de terapia com a psicóloga Ana Paula Caetano, uma pessoa muito doce e que me ajudou bastante nesse processo de autoconhecimento. Isso em 2009. Foi um momento em que eu tive a possibilidade de ter uma compreensão mais profunda de mim mesma. Dessa maneira, eu pude ver as minhas qualidades, potencialidades e aquilo que eu poderia melhorar para ser quem eu sou hoje. E muito disso eu devo a esse processo de terapia e à Ana Paula, que me ajudou bastante. Foi um processo de autoconhecimento que mudou a minha vida radicalmente. Aquela pessoa que eu era, uma menina tímida e introvertida, hoje nem acredito que dou entrevistas, participo de programas de TV, de rádio, vou às empresas conversar com as pessoas, sempre com muita humildade e simplicidade, compartilhando o que eu sei. Hoje e tenho muito orgulho de mim e de ter superado tudo isso. Acredito que esse processo de autoconhecimento é muito importante às pessoas, porque isso nos dá condições de mudar e ter um bem-estar maior com a gente mesmo e expandir para outros.

Jornal do Sudoeste: a partir daí você começou a pensar em estudar Psicologia?
M.L.O.P.: Foi nesse processo de terapia que eu comecei a pensar o que eu faria quando me aposentasse, comecei a planejar a minha vida futura. Foi então que decidi estudar Psicologia. Iniciei em 2011, naquela época eu ainda estava trabalhando e estava tudo muito corrido. Trabalhava o dia todo, ia para a faculdade, chegava meia-noite para levantar às 5h, mas era algo que eu fazia com muito amor e carinho. No final do ano, decidi parar por um tempo, já que estava próximo de me aposentar. Em 2013 eu retornei para terminar o curso. Em 2016 me formei e, naquela época, eu e umas amigas decidimos abrir um consultório, foram quatro meses procurando até que encontramos um local. Já faz dois anos que estou em atendimento e, mais uma vez, muito feliz em estar trabalhando.

Jornal do Sudoeste: como é olhar para esse passado?
M.L.O.P.: Sou muito grata a Deus e a todos que passaram, e passam, pela minha vida, a todos os amigos que conquistei na Educação – o carinho e gratidão que tenho por eles são imensas. Tenho muita alegria por tudo o que vivenciei e não foi fácil. Às vezes as pessoas nos veem, mas não têm noção do que a gente passou. A vida não é fácil para ninguém, cada um tem o seu caminho, suas dificuldades, mas com fé e perseverança a gente vence. Nós precisamos acreditar em nossos sonhos e naquilo que desejamos e priorizamos para nossa vida. Nesse caminho, muitas pessoas me influenciaram, e uma delas foi o Padre Geraldo Rezende, que um dia me deu alguns livros do Rubens Alves – e uma história me marcou muito, e que dizia que eu deveria ser uma águia e alçar voos mais longes, ir além daquilo que eu tinha. É uma metáfora que tem muito significado para mim.

Jornal do Sudoeste: o resumo é gratidão...
M.L.O.P.: Sim. Eu agradeço muito ao meu esposo e às minhas filhas pelo apoio, a todos os amigos que eu conquistei e que ainda conquisto por meio da minha profissão. Tenho parceiras maravilhosas que trabalham comigo e que acreditam nessa proposta do Janeiro Branco que eu conheci e comecei a dar os primeiros passos para essa campanha em Paraíso, que tem o objetivo de levar essa mensagem da importância de se cuidar da saúde mental por conta da sociedade que vivemos hoje. O meu desejo é ser esse instrumento de paz na vida das pessoas. É importante a gente acreditar, primeiramente em Deus, esse Ser Supremo e Misericordioso, acreditar nos sonhos e na luz que temos dentro da gente, e que a gente possa semear paz por onde nós passarmos. É preciso ter coragem, ter fé, persistência, esperança e, acima de tudo amor pela nossa vida. Assim, estaremos contribuindo para o mundo, tal como a fábula do passarinho que pegava a água no bico para tentar apagar o incêndio: mesmo que ele não conseguisse, ele estava fazendo a parte dele, o que estava ao alcance. Inspiro-me muito nisto, e de grão em grão, vou fazendo a minha parte, plantando sementes para um mundo melhor.