O juiz de direito aposentado, Dr. José Antônio de Faria, faleceu no início da tarde de quinta-feira (16/4) em São Sebastião do Paraíso, onde depois de exercer a magistratura por alguns anos, aposentou-se. Seu corpo foi trasladado para sua cidade natal, Monte Santo de Minas, onde ocorreu o sepultamento.
Em setembro de 2006 ele foi entrevistado pelo Jornal do Sudoeste, onde falou sobre sua trajetória, matéria que aqui reproduzimos, em homenagem ao ser humano que angariou amizade e respeito dos paraisenses, e escreveu com letras maiúsculas seu nome, na Magistratura mineira.
José Antônio de Faria: um juiz humanista
Aos 69 anos, o juiz aposentado José Antônio de Faria, conta que nos seus 30 anos de magistratura, os casos mais difíceis que julgou foram os políticos – “A política é muito difícil, principalmente a municipal”, diz. A paixão pelo Direito foi crescendo através de seus dez anos de trabalho em cartório, na sua cidade natal, Monte Santo de Minas. Impulsionado por tanto conhecimento que possuía na prática resolveu cursar a Faculdade de Direito de Franca. Em 1970 se inscreveu no concurso e foi aprovado para juiz. Sua primeira nomeação foi para Cabo Verde. Atuou também em Guaranésia, Cássia e foi transferido para São Sebastião do Paraíso, em 1981, trabalhando sempre em varas únicas naquela época. “O volume de trabalho era imenso, pois não existiam outras varas e outros juizes para dividir o trabalho”.
José Antônio diz que a aposentadoria chegou na hora certa. “Minha vida sempre foi só o trabalho, eu estava muito cansado na época em que me aposentei, há seis anos. Havia me dedicado integralmente à magistratura. Pela manhã e à tarde eu ficava no Fórum, à noite eu estudava os casos em minha residência”.
Jornal do Sudoeste – Mesmo aposentado, o senhor ainda se interessa pelo Direito?
José Antônio de Faria – Faço isso constantemente, troco idéias com os colegas, acompanho publicações, principalmente na área criminal. Na área penal principalmente, as leis precisam ser revistas, modificadas e melhoradas.
JS – Em quais pontos o senhor acredita que as leis penais podem ser melhoradas?
José Antônio de Faria – Na verdade, a de crimes hediondos, por exemplo, deveria ficar como está e não ser modificada. Aquele que cometeu esse tipo de crime deveria permanecer na cadeia por mais tempo. Agora, cumprindo determinado prazo, eles acabam por ter direito à liberdade provisória e outros sistemas semelhantes, isso não deveria acontecer, nem prescrição de pena. O autor deveria cumprir penas bem mais longas que as aplicadas para outros tipos de crime.
JS – A lei referente ao crime de tráfico de entorpecentes também foi modificada no último dia 23 de agosto. Como o senhor considera essas mudanças?
José Antônio de Faria – Eu acho importante essa modificação, pois como estava o usuário ia para a cadeia, enquanto o traficante ficava solto, continuando a vender drogas. O usuário merece tratamento de saúde e não ficar preso em uma cela. Seria preciso implantar diversas instituições especializadas para o tratamento do usuário de entorpecentes. Atualmente, as que existem são pagas e caras e nem todos têm acesso.
JS – Os índices da criminalidade envolvendo menores de idade estão cada vez mais altos. O senhor acredita que a lei também poderia ser modificada para coibir o crime cometido pelo menor infrator?
José Antônio de Faria – Essa é uma questão muito delicada. O que deveria acontecer é a imputabilidade baixar para 16 anos. Nos Estados Unidos, onde o sistema Judiciário é muito adiantado, até crianças são julgadas e condenadas. A lei brasileira também deveria ser mais rigorosa com menores infratores ou então, que houvesse uma assistência maior a esses jovens, o que é difícil de encontrar em cidades do interior.
JS – O senhor acredita que casas de recuperação possam ser uma solução?
José Antônio de Faria – Acredito que sim. Mas essas instituições têm que ter profissionais competentes e bem preparados para dar a orientação necessária a esses jovens. São lugares que precisam ter estrutura com qualidade. É preciso cuidar da família primeiro, pois geralmente são desestruturadas. São soluções a longo prazo e complicadas.
JS – Outro grande problema que estamos vivendo é a falência do sistema carcerário. O senhor acredita que as Associações de Proteção e Assistência Carcerária (Apacs) seriam a solução?
José Antônio de Faria – Há muitas Apacs que funcionam bem em alguns lugares e em outros não. É preciso, como no caso dos menores, de profissionais que tenham interesse real em cuidar dessa população carcerária, com carinho, dispensando todo o tempo que for necessário. É preciso lembrar que muito criminosos têm recuperação. A Apac de Itaúna é um exemplo de que esse modelo de instituição pode dar certo. A de Passos apresentou alguns problemas, mas agora está caminhando bem. É preciso ter boa vontade em ajudar na recuperação dessas pessoas e acho que para Paraíso pode ser uma saída benéfica.
JS – O senhor parece ter sido um juiz de linha mais humanista.
José Antônio de Faria – Acredito que eu tenha sido mais preocupado com as questões sociais, em considerar sempre o outro ser humano como somos todos nós, tratar com respeito a cada um, mesmo aquele que estive julgando. É preciso pensar no meio termo, na conciliação. Eu sempre fui de tratar bem o preso, por exemplo. Educação e respeito são formas de tratamento que devem ser dispensadas a qualquer um.
JS – O senhor acredita que o Judiciário deva ser um braço à parte dos poderes Legislativo e Executivo, ou deve atuar de forma conjunta e com rigor?
José Antônio de Faria – Acredito que o Judiciário vem cumprindo o seu papel. As questões eleitorais, por exemplo, tem sido analisadas com muita firmeza e tenho visto um Judiciário melhor surgir a cada dia.
JS – O município está assistindo uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar possíveis sonegações de tributos no município, porém a quem diga que a CEI foi instituída para averiguar possíveis sonegações fiscais cometidas por um promotor. O senhor acredita que um promotor possa ser objeto de investigação por parte do Legislativo?
José Antônio de Faria – A Procuradoria de Justiça entende que não. Eu acho que averiguar sonegação é de competência do Executivo. É o poder Executivo que deve tomar providências a esse respeito.