O escritor e membro efetivo da Academia Paraisense de Cultura, Laércio Felício da Silva, é um homem que pode se considerar um vencedor em todos os sentidos da vida. De origem humilde, pouco a pouco foi construindo sua vida sem deixar de plantar boas coisas por todos os lugares que passa. Natural de São Tomás de Aquino, passou boa parte de sua vida entre Paraíso, onde foi presidente da Liga Desportiva, e em Fortaleza de Minas, onde foi vereador, eleito por três mandatos. Filho de Cândido Felício da Silva e Laura Moura da Silva, casado com Maria Helena Duarte Silva, com quem teve dois filhos, a Priscila e o Thiago. Aos 73 anos, Laércio recebe a reportagem do Jornal do Sudoeste para contar um pouco da sua trajetória, e com carinho ele diz que esta entrevista “era a flor que faltava em seu jardim”.
Jornal do Sudoeste: Você passou por vários lugares ao longo da sua trajetória, conte um pouco isso...
L.F.S.: Eu nasci em São Tomás de Aquino, onde vivi até meus cinco anos de idade. Depois nos mudamos para São Sebastião do Paraíso, Ribeirão Preto, voltamos para cá e logo em seguida meu pai foi para Fortaleza de Minas, trabalhar em uma pedreira. Lá ele adquiriu um sítio. Essas mudanças, até chegar em Fortaleza, onde ele viveu por muitos anos, se deram pela profissão do meu pai. Tive a sorte de nascer em uma família afortunada espiritualmente, passei por experiências importantes para meu desenvolvimento pessoal. Gostava de jogar bola em um campo que tinha na Vila Mariana, onde eu residia quando morei aqui. Tenho saudade dos amigos.
Jornal do Sudoeste: Que significado tiveram seus pais para você?
L.F.S.: Meus pais carregavam algo com eles: era razão e ação. Tudo partia desse princípio. Não era totalmente uma religião, mas uma crença que eles seguiam e não desviavam desse caminho, faziam ao próximo aquilo que gostariam de receber. Essa foi a vida deles e teve um significado muito importante para a minha própria vida. Eles passaram isso para mim, para minha irmã e meu irmão. A família foi meu ponto de partida, Deus me deu bem mais do que eu merecia. Tive uma boa criação e meus pais acompanharam de perto, atentos, o meu desenvolvimento. Isso refletiu positivamente em minha vida adulta.
Jornal do Sudoeste: E como vocês vieram para Paraíso?
L.F.S.: Depois que mudamos para Ribeirão Preto, e terminou o trabalho que meu pai fazia lá, ele decidiu voltar para Paraíso, onde comprou um bar que funcionava onde hoje é a loja do Martoni, isso há muito anos. Mas depois ele fechou esse bar, nos mudamos para a Vila Mariana e de lá fomos para roça. Em Fortaleza de Minas ele viveu cerca de 50 anos, onde eu também vivi muitos anos até voltar a Paraíso.
Jornal do Sudoeste: Aqui, nesta primeira fase, você exerceu algumas atividades relacionadas ao esporte. Como foi isso?
L.F.S.: Fui presidente da Liga Desportiva de São Sebastião do Paraíso durante nove anos, entre 1984 a 1992. Realizamos alguns campeonatos amadores promovidos pela Prefeitura, com 53 clubes que começava nos Pedrosos e terminava nos Marques. Participei da realização de campeonatos da Associação Atlética Paraisense da segunda até chegar a primeira divisão e, também, da terceira divisão do América de Monte Santo de Minas, que era de responsabilidade da Liga.
Jornal do Sudoeste: Como foi sua trajetória profissional?
L.F.S.: Eu trabalhei em farmácias, entre outras, com o senhor Carlos Grau, em uma farmácia que ficava próxima a agência dos Correios. Trabalhei em fábrica de calçados e sapatarias e, quando trabalhava em fábrica de calçado aprendi várias etapas da profissão, cheguei até modelista, mas quando fui para a roça passei a ser agricultor. Trabalhei desde pequeno, nossa batalha foi muito difícil.
Jornal do Sudoeste: Em Fortaleza de Minas, o senhor foi vereador. Como foi isso?
L.F.S.: Sim. Eu saí de Paraíso em 1992, quando deixei a Liga Desportiva, e tomei posse em janeiro de 1993 como vereador em Fortaleza. Exerci três mandatos, dois deles ficando como candidato mais votado, em 2003, fui qualificado pelo Instituto de Pesquisa Online da revista “Leia Hoje”, como um dos melhores vereadores do Brasil. Acredito que tenha plantado sementes muito boas e, durante os meus mandatos, apresentei, e foram aprovados, diversos projetos. Entre eles, um em benefício da construção da APAC, que teve verba da Prefeitura de Fortaleza que era comarca de Jacuí na época. A APAC, como todos sabem, é um “presídio” humanitário de ressocialização, tendo o primeiro sido construído em São José dos Campos e o segundo em Itaúna, aqui em Minas, e é um projeto que diversos países pelo mundo já copiaram. Aqui em Paraíso o juiz criminal da época, Rogério Abreu Araújo e o promotor Rômulo Generoso, trabalharam para construir a APAC de São Sebastião do Paraíso, cheguei a participar de várias reuniões, mas tive que me afastar por problemas de saúde. É um projeto que seria fundamental para os tempos que estamos vivendo, principalmente com esta questão do desemprego. Bom, no meu terceiro mandato quase não fui reeleito, porque fizeram um complô contra mim, nem sabia o que estava acontecendo, porque quando você age de coração você não se preocupa com o que o outro está pensando. Depois, em 2001, passei por uma cirurgia, operei de um tumor na cabeça, maior que uma laranja, e quando chegou em 2004 resolvi afastar-me. Ainda quando morava lá, fui presidente da Comissão do Asilo de Fortaleza de Minas, que promovia reuniões mensais em diversos lugares, onde trocávamos informações do que havia disponível nesses Lares de Idosos e o que estavam necessitando. Lá deixei saudades, tenho certeza disso.
Jornal do Sudoeste: A APAC seria fundamental para retornar esse preso para a sociedade, que hoje não tem oportunidades...
L.F.S.: Principalmente porque o trabalho dignifica o homem. Com o trabalho e ganhando seu próprio dinheiro, esse cidadão se realiza e, com a APAC, ele aprenderia uma profissão para se manter. Cheguei a conhecer o idealizado desse projeto, o doutor Mario Ottoboni. Uma pessoa boníssima e muito inteligente, mantivemos contato por alguns anos.
Jornal do Sudoeste: E o senhor também formou a sua família...
L.F.S.: Sim, casei-me aos 30 anos com a Maria Helena, já se vão 43 anos. Tem sido uma vida muito boa. Duas coisas mantêm a harmonia entre o casal: consideração e respeito. Quem ama, considera, quem considera, respeita. Sempre tivemos isso, que acredito ser herança dos princípios que aprendi lá atrás, com meus pais. Tivemos dois filhos, a Priscila e o Thiago, que tem uma diferença de sete anos um com o outro. Ela trabalha na Educação em Paraíso, e ele em São José dos Campos. Tenho dois netos, um de cada filho. No sentido família, Deus me deu bem mais que eu merecia, são pessoas que fazem tudo para mim.
Jornal do Sudoeste: O senhor também é escritor. Como começou isso?
L.F.S.: Um dia, quando cheguei à prefeitura de Fortaleza de Minas, vi um cartaz que fazia um convite, intitulado “escrevendo mulheres”. Logo, pensei em escrever uma poesia sobre minha mãe, que era uma mulher muito boa. Depois desta vieram diversas outras, participei das bienais do Rio de Janeiro e São Paulo. Tive uma poesia publicada no livro Escritores Brasileiros: série ouro, lançado em 2005. Sou um dos 11 escritores de Minas Gerais neste livro. Também participo, há 20 anos, do projeto Livro Diário dos Escritores. Já mandei meu texto este ano; são textos que passam por uma seleção, e são escolhidos os melhores. Também escrevo crônicas e poesias para o nosso já consagrado Jornal do Sudoeste.
Jornal do Sudoeste: Como surgiu o convite para a Academia Paraisense se Cultura?
L.F.S.: Eu tomei posse como membro efetivo, cadeira número 30, que foi do nosso saudoso irmão de alma Antônio Carlos Pinheiro de Alcântara. Faz bastante tempo que integro a Academia como membro honorário e efetivo, e me sinto honrado de fazer parte desse seleto grupo, de pessoas muito bondosas e cultas. Nós aprendemos muito. Ali é um local que se a pessoa tiver vontade, ela aprende muito porque estamos cercados de pessoas inteligentíssimas, que divulgam nossa cultura no Brasil e no mundo. São irmãos e irmãs de alma, pessoas valiosas, que deixaram para mim um rastro de amizade profunda. Ali, na APC, já se apresentaram diversos artistas, inclusive um sobrinho meu, o Allan Duarte Manhas, que é pianista e professor na Alemanha.
Jornal do Sudoeste: Qual mensagem o senhor deixa para nossos leitores?
L.F.S.: Em tudo o que fizermos na vida, sem Deus não há motivação. Faça tudo o que tiver ao seu alcance, um pouco mais por você e pelo outros. Plante amor, dê amor, viva com amor, só o amor constrói. Dias melhores virão.
Jornal do Sudoeste: Qual o balanço o senhor faz dessa caminhada?
L.F.S.: Tudo, as coisas boas na vida, valem a pena. A participação para mim nesta Coluna é algo glorioso, porque pude contar um pouco de quem sou: uma pessoa muito simples, humilde e de bom coração. A participação na coluna Ele por Ele era a flor que faltava no meu jardim, e espero que aqueles que lerem, vejam o quão importante é cuidar de si, e também do próximo nesse momento tão difícil que estamos vivendo. O momento é de solidariedade, e precisamos ser solidários uns aos outros, porque sozinho não somos capazes de nada, mas com o outro podemos vencer tudo.