Natural da cidade paulista de Araras, Dr. Mateus Perches vem de uma numerosa família composta por seis irmãos. De sua família também vem a vocação para a área da Saúde. Em sua formação passou pelas cidades de Piracicaba, lugar em que concluiu o segundo grau, e Ribeirão Preto, onde graduou-se em Medicina e também cursou a especialização em Otorrinolaringologia. Desde 2004 escolheu São Sebastião do Paraíso para viver, tendo se adaptado muito bem junto à comunidade médica e pacientes. Aos 44 anos Dr. Mateus rememora sua trajetória pessoal e profissional, os desafios impostos pela pandemia e sua visão acerca da profissão de Hipócrates.
Dr. Mateus, qual a origem do sobrenome Perches?
O sobrenome provavelmente vem de um erro de cartório, com a adição de um “s” ao sobrenome Perche, mais antigo e com provável origem na região central da França - Comuna de Perche.
Como foram seus primeiros anos e a vida estudantil?
Sou filho de Max Martins Perches e Inide Natalina Franzini Perches. Nasci em Araras em 1977, cidade onde vivem meus pais até hoje. Quinto filho de uma grande família, aos 14 anos me mudei para Piracicaba para fazer o colegial. A escola estadual em que estudei em minha cidade natal, não tinha um bom colegial. Aos 17 anos, após aprovação no vestibular, me mudei para Ribeirão Preto e logo após a conclusão da residência médica na mesma cidade, me mudei para São Sebastião do Paraíso, no início de 2004. Assim, São Sebastião do Paraíso é a cidade onde residi mais tempo, ao longo de minha vida.
Qual sua maior motivação ao escolher a Medicina? Onde se formou e quais as suas especializações?
A escolha pela medicina aconteceu muito cedo. Meu pai e meus irmãos mais velhos (Max, Daniel e Carmen) estavam todos na área da saúde. Meu pai e Daniel são dentistas, Max é médico e a Carminha, farmacêutica e bioquímica. O convívio nesse meio acabou influenciando minha decisão, pois sempre foram profissionais atuando com extrema ética, dedicação exemplar e profissionalismo. Minha outra irmã, Erika, saiu da área da saúde, mas manteve a raiz familiar em biológicas, cursando agronomia. Ciro, o caçula, também seguiu na área médica. Aos 11 anos, ainda no grupo escoteiro, já tinha o distintivo de primeiros socorros e ficava responsável pelos acidentados durante as reuniões e acampamentos. Ou seja, a medicina sempre foi uma paixão! Cursei Medicina na Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto, no período de 1995 a 2000, e a residência médica em Otorrinolaringologia no HC de Ribeirão, de 2001 a 2003.
Quais as principais demandas em seu consultório?
A otorrinolaringologia é uma área bastante extensa, mas existe um predomínio dos problemas respiratórios e auditivos, englobando todas as faixas etárias. Também não são raros os casos de tontura, rouquidão, roncos e problemas salivares.
Respiramos errado? Dá para aprender a respirar melhor? Que dicas poderia compartilhar?
Respirar errado não é uma escolha e sim um sinal de que algo não está normal. É preciso identificar o ponto crítico do problema, que pode estar desde a narina até o alvéolo pulmonar. Uma vez identificado o problema inicia-se o tratamento. Em pacientes que sempre respiraram mal, após o tratamento acaba sendo importante ensiná-los a respirar novamente pelo nariz, trabalho esse executado em conjunto com uma boa equipe de dentistas e fonoaudiólogos. A dica é: se você não consegue respirar usando apenas o nariz, ou tem dificuldades respiratórias durante a atividade física ou o sono, procure ajuda.
Nesta época seca e ainda com muitas ocorrências de queimadas, como podemos amenizar sintomas como falta de ar, rinite, entre outros?
Realmente, uma boa parte dos problemas respiratórios se agravam nesta época. Nem sempre é possível lutar contra o clima, mas todo recurso que aumente a umidade do ambiente ou das vias respiratórias acaba ajudando muito. Infelizmente os recursos mais disponíveis, como toalhas molhadas ou bacias com água, alteram muito pouco a umidade local. Lavagens nasais com soro e umidificadores de ambiente são bem mais eficientes.
Como a pandemia alterou sua atuação profissional? Há queixas específicas de pacientes recuperados da covid-19?
Alterou bastante, pois precisamos instalar todos os protocolos possíveis de segurança. Em minha especialidade examinar boca e nariz é rotina. Essa rotina acabou alterando também o lado pessoal, pois sabia que estava exposto e ao assistir alguns colegas e amigos médicos morrendo, alguns em idade bem nova, sabia que seria de extrema importância proteger meus pacientes, meus colaboradores, minha família e também me proteger. Por outro lado, nunca o olfato foi tão estudado, pois por se tratar de sintoma comum na covid-19, precisávamos conhecer os mecanismos da doença e intervir rapidamente. Novos tratamentos para problemas do olfato foram descobertos e podem ser usados não só nos casos de covid. Em menor proporção, sequelas auditivas, quadros de tontura e cefaleia fazem parte do quadro pós covid.
Quando veio para São Sebastião do Paraíso e em quais circunstâncias?
Em 2003, no último ano de residência, soube através de um amigo de faculdade, Dr. Matheus Colombaroli, que havia um ambulatório de otor-rinolaringologia do SUS, que estava sem especialista. Comecei a atender os pacientes, vinha aos sábados, nas minhas folgas do HC. A demanda local e regional para casos de mais alta complexidade era enorme. Em 2004, ao final da residência, decidi que aqui seria o meu lugar e me mudei.
Seus pacientes frequentemente elogiam sua dedicação e profissionalis-mo. Esta receptividade ajudou na adaptação?
A dedicação acontece quando fazemos aquilo que gostamos, o profissionalismo depende de estudo contínuo e eterno aprendizado, aprendizado esse que inclui o convívio diário com os pacientes e suas vidas. Nesse contexto, a receptividade local, que foi maravilhosa, também contribuiu muito para facilitar minha vinda para Paraíso e consequente adaptação. Hoje tenho uma grande família de amigos aqui, e essa família inclui algumas pessoas que inicialmente eram somente meus pacientes.
Muito se fala sobre a necessidade da implantação de um banco de sangue ou ao menos um posto de coleta em nossa cidade. Acha que isso seria um bom presente para o bi-centenário de São Sebastião do Paraíso?
Um banco de sangue local, dependendo da viabilidade física e econômica, seria sim, em minha opinião, um presentão para a cidade, pois aumentaria muito a quantidade de doadores, que muitas vezes querem doar, mas não têm como se deslocar.
Toda profissão exige vocação e dedicação, mas a Medicina, por zelar pela saúde e bem-estar, parece ir além, mediante a relação que se estabelece entre médico e paciente. Ser médico pode ser comparado ao sacerdócio?
O cuidado com o “outro” exige sempre disponibilidade de bastante tempo. Não existe dia nem hora para o chamado, o que se assemelha ao sacerdócio. Importante não romantizar a medicina em detrimento de outras profissões.
Qual o maior desafio que você vivenciou enquanto médico? Algum caso específico o impactou?
O maior desafio foi montar um serviço próprio de otorrinolaringologia em que eu pudesse fazer aqui, tudo aquilo que era feito dentro do HC, ou de outros hospitais de referência em minha especialidade, e assim, conseguir realizar na localidade, casos que antes iam para fora. Muitos casos marcaram minha vida, mas conseguir tratar uma criança com deficiência auditiva, mudando seu destino, ainda me emociona muito.
Qual a importância da família para você?
Ter uma esposa também médica, a Dra. Ana Claudia (oftalmologista), facilita a compreensão dos momentos de ausência familiar e me ajuda a melhorar a empatia com meus pacientes, pois o carinho com que ela desempenha sua profissão é admirável. A união e amor que temos foi essencial para conseguirmos superar a distância de nossos pais e irmãos. Uma vez edificada a árvore familiar, vieram os frutos Penélope e Eleonora, para trazer ainda mais leveza e alegria para dentro de casa. Sou bastante caseiro, gosto de cozinhar, mexer com minhas plantas e aprender alguma coisa nova. Sempre que possível, adoro um bom bate papo entre novos e velhos amigos.
Em “Médico de Homens e de Almas” a autora Taylor Caldwell narra a história de São Lucas (Lucano), médico que tratava dos homens e de suas almas. Na sua visão, por trás de um bom médico deve haver um bom psicólogo?
Sem dúvida, muitos problemas se resolvem com uma boa conversa, apoio e orientação.
O que você seria se não fosse médico?
Pergunta difícil, pois por incrível que pareça nunca havia refletido sobre isso. Como gosto de trabalhos manuais acho que seria um bom marceneiro.
Dr. Mateus, que conselho daria para quem pretende seguir na Medicina?
Estudar, estudar, estudar... Aprenda a ouvir e examinar muito bem, para não depender de exames complementares excessivos e não essenciais em sua prática. E mantenha sempre o medo, médicos destemidos cometem mais erros.