POLEPOSITION

Aviso prévio de luxo

Por: Sérgio Magalhães | Categoria: Esporte | 30-03-2024 21:18 | 2078
Carlos Sainz: Da mesa cirúrgica para o degrau mais alto do pódio em 16 dias
Carlos Sainz: Da mesa cirúrgica para o degrau mais alto do pódio em 16 dias Foto: Ferrari

Do centro cirúrgico à vitória no GP da Austrália em apenas 16 dias! A vida de Carlos Sainz Júnior tem sido uma “montanha russa de emoções”, como ele mesmo definiu ao receber a bandeirada em Melbourne num dia histórico, diga-se.

Essa montanha russa começou no início de fevereiro ao ser avisado que não será piloto da Ferrari no ano que vem. A vaga do espanhol será ocupada por Lewis Hamilton. No Bahrein, Sainz se classificou à frente do companheiro Charles Leclerc, fez excelente corrida e terminou em 2º, atrás de Verstappen. Na Arábia Saudita precisou desistir após os treinos livres por conta de uma cirurgia de emergência para retirada de apêndice. E duas semanas depois triunfou no Circuito Albert Park.

Ao embarcar para Melbourne, viagem de 24 horas de duração, Sainz não sabia se teria condições de correr. Houve toda uma preparação especial. O espanhol fez duas sessões por dia em câmaras hiperbáricas em uma máquina Indiba, algo que ele definiu como “uma coisa eletromagnética para as feridas”, para acelerar a cicatrização. Sono, alimentação, e os movimentos foram todos cuidadosamente programados. Um alento, foi a conversa com Alex Albon. Em 2022 o tailandês, da Williams, passou pelo mesmo procedimento cirúrgico durante o final de semana do GP da Itália, e 15 dias depois disputou o GP de Cingapura. O alerta do colega para Sainz foi a sensação estranha de sentir os órgãos se movendo por dentro devido à força G. A evolução da medicina e o preparo físico dos atletas faz diferença nessas horas.

Os treinos livres de sexta-feira em Melbourne foram fundamentais para Sainz sentir que estava tudo ok, ainda sentisse as mesmas sensações descritas por Albon, de tudo se mexer por dentro. Mas ele acelerou forte desde o início e ao liderar os dois primeiros blocos da classificação, os Q1 e Q2, derrotou Leclerc psicologicamente que na ansiedade por não ser superado pelo espanhol, mudou o acerto de sua Ferrari e conseguiu piorar o carro. Assim, Sainz largou da primeira fila ao lado do pole position Max Verstappen.

Há um ano que vencer na F1 passou a ser questão de honra para qualquer um dos outros 19 pilotos do grid. A supremacia de Verstappen e seu Red Bull parece ter neutralizado a capacidade dos outros pilotos. Fernando Alonso disse algo que mereceu atenção após os testes de pré-temporada: “Dezenove pilotos sabem que não vão ser campeões, e alguns podem sonhar em ganhar uma ou outra corrida”, referindo-se ao favoritismo do holandês. Diante do quadro desta F1 (quase) de um só piloto e uma equipe, havia a certeza de que a qualquer hora eles provariam o outro lado da moeda. E esse dia chegou justamente em Melbourne, exatos 43 Grandes Prêmios após o último abandono de Verstappen lá mesmo em 2022. 

Verstappen estava há uma vitória de igualar seu próprio recorde de 10 vitórias seguidas, mas foi traído por um grave problema de freios que o fez abandonar o GP da Austrália na 4ª volta. Antes, Sainz já havia ultrapassado o líder do campeonato e conduziu com muita determinação para quem convalescia de uma cirurgia rumo à vitória.

O mesmo Sainz que no ano passado encerrou a sequência de dez vitórias consecutivas de Verstappen quando venceu o GP de Cingapura - o único piloto não Red Bull a ganhar uma corrida em 2023 - venceu novamente. O que significa que nos últimos 11 meses, apenas Verstappen e Sainz venceram corridas na F1.

A verdade é que Carlos Sainz Jr. cumpre aviso prévio de luxo. Ele está em uma posição privilegiada, livre, leve e solto para o ano que vem. Opções não vão faltar. Se alguém gritar no paddock da F1 “quem quiser Sainz dê um passo à frente”, todos os chefes de equipes darão. Talvez até o próprio Fred Vasseur, que lhe deu o aviso prévio. Há quem questione se a Ferrari não estaria demitindo o piloto errado? Leclerc é o queridinho da equipe italiana e teve seu contrato renovado plurianualmente poucos dias antes do anúncio da contratação de Hamilton. Mas não vem tendo a mesma determinação de Sainz neste começo de campeonato. Desde que se tornaram companheiros de Ferrari, cada um venceu três corridas. E nesta temporada Leclerc soma 47 pontos contra 40 de Sainz que tem uma corrida a menos.

O 2024 tem sido de fortes emoções para a família Sainz. O pai, Carlos Sainz, lenda do automobilismo, venceu em janeiro o Rali Dakar aos 61 anos. E o filho chegou à sua terceira vitória na F1.